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Produções via Zoom inovam na TV, mas não devem sobreviver no pós-pandemia

Netflix anunciou a produção 'Social Distance', dos mesmos criadores da série 'Orange is the New Black'

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Washington

Faltava filmar só o último episódio quando estourou a pandemia.

Equipe e elenco de "All Rise", série da emissora de TV americana CBS, precisaram decidir rápido como seria o desfecho da temporada que estreou nos Estados Unidos em setembro do ano passado.

A solução inédita fez do drama roteirizado o primeiro a voltar à produção em meio às ordens de isolamento e distanciamento social no país.

Comandado pelo produtor-executivo Greg Spottiswood, o episódio da trama ambientada no mundo jurídico foi ao ar no início de maio, desenrolado todo via Zoom, Facetime e WebEx.

Cena da série americana "All Rise", feita a partir de aplicativos de videoconferência como o Zoom
Cena da série americana 'All Rise', feita a partir de aplicativos de videoconferência como o Zoom - Divulgação

De suas casas, os atores interagiram por teleconferência, encenando as dificuldades que seus personagens —juízes, promotores e advogados de Los Angeles— tinham para trabalhar em meio à rotina doméstica, culminando nos obstáculos de um julgamento histórico, sustentado 100% online.

"Uma chance única para nossa família 'All Rise' se unir —em nossas diferentes casas, até cidades— para contar uma história sobre resiliência, justiça e poder da comunidade", disse Spottiswood, em nota.

A inovação de filmar um episódio de quase uma hora com tecnologias como Zoom e Facetime, porém, aponta para soluções temporárias que não devem perdurar na dramaturgia americana pós-pandemia.

Essa é a avaliação de Tom Nunan, produtor e professor da Escola de Teatro, Cinema e Televisão da Universidade da Califórnia em Los Angeles.

Com trabalhos que vão de "Crash" a "O Ilusionista", Nunan afirma que não é possível produzir cinema e TV de maneira satisfatória sob a quarentena e que a saída usada em "All Rise" servirá para casos específicos, como episódios pontuais e especiais de séries no curto prazo.

Segundo o produtor de Hollywood, haverá um "ajuste de calendário" nas produções americanas, com maior prejuízo na indústria das séries, que deve durar pelo menos até setembro.

"Se elas não puderem voltar à produção até o meio do ano, teremos temporadas prejudicadas até agosto ou setembro. No caso dos filmes é diferente porque os cinemas estão fechados em sua maioria, ou seja, as pessoas estão em casa vendo TV e streaming."

Nunan diz que ainda não está claro quais serão os novos protocolos de higiene e segurança adotados pelas produções depois da crise, mas eles devem envolver um pacto de confiança nos sets de filmagens.

Nesta semana, o estado da Califórnia anunciou um plano para a reabertura de sua indústria de entretenimento, fechada desde março, mas ainda com muitas dúvidas sobre a retomada das atividades na prática.

Isso porque a cidade de Los Angeles, onde se concentra a maior parte das produções e estúdios de Hollywood, tem mais de 40 mil casos confirmados e quase 2.000 mortes por Covid-19 —mais da metade dos diagnósticos e óbitos em todo o estado, o que deve dificultar o relaxamento das regras.

"Não acho que podemos produzir filmes de maneira satisfatória sob distanciamento social. Virão protocolos novos, que darão às equipes e elencos a sensação de segurança, como um pacto de fé, em que todos fazem o melhor que podem para voltar ao trabalho", afirma Nunan.

Cumprimentar alguém com um aperto de mão, ele afirma, provavelmente virou história, mas veremos implementações de inovações para além de ficar trancado em casa em pleno século 21.

A filmagem virtual de um episódio de uma hora para a TV, por exemplo, exige trabalho hercúleo de equipe e elenco.

Diretores e roteiristas não conseguem agir pessoalmente em cena e os atores precisam cuidar de maquiagem, figurino, iluminação, captação de som, filmagem, entre outras funções, além da própria atuação.

O enorme empenho exigido não deve ser compensado com grande interesse da audiência a longo prazo.

As primeiras experiências, como em "All Rise", chamam atenção, mas as pessoas logo devem se saturar da temática e do formato.

Nunan lembra que, depois da gripe espanhola, em 1918, artistas não tratavam do assunto em suas obras porque a população não queria reviver os traumas nas telas.

"A cultura pop não lidou com a gripe espanhola de nenhuma maneira depois da crise. Os artistas só queriam esquecer aquilo. O que emergiu depois, na década de 1920, foi crescimento econômico, e as pessoas voltaram a se divertir."

"All Rise", no entanto, não foi a única produção a tentar explorar ferramentas e assuntos da pandemia como saída na dramaturgia americana.

Ainda no terreno das soluções extraordinárias, a série "Parks and Recreation" foi a primeira comédia com roteiro a fazer isso, com um especial de reencontro da trama que terminou há cinco anos. ​

O humorístico "Saturday Night Live" também teve seu episódio remoto apresentado por Tom Hanks, recém-recuperado de Covid-19.

Nos canais jornalísticos americanos, como CNN e Fox News, repórteres e especialistas entram no ar direto de suas casas para participar dos programas ao vivo.

Numa frente que parece ser mais perene, a Netflix anunciou a produção chamada "Social Distance". Dos mesmos criadores de "Orange is the New Black", a série, ainda sem data de estreia, será baseada na vida durante a pandemia e está sendo criada, segundo a plataforma, sob as regras de distanciamento social.

O desafio será prender a atenção de um público cansado de ficar em casa e projetar uma realidade ainda pouco clara sobre qual será o novo normal quando a crise acabar.

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