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Bob Dylan busca a imortalidade e empilha referências em novo álbum

'Rough and Rowdy Ways', que sai na sexta, mostra que Nobel de Literatura ainda pode criar letras surpreendentes

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O cantor Bob Dylan com o cineasta D. A. Pennebaker ao fundo em cena do documentário ‘Don’t Look Back’, de 1967 

O cantor Bob Dylan com o cineasta D. A. Pennebaker ao fundo em cena do documentário "Don't Look Back", de 1967  Reprodução

Rio de Janeiro

“Rough and Rowdy Ways”, que pode ser traduzido como modos ásperos e turbulentos, é o 39º álbum de estúdio de Bob Dylan e sai nesta sexta. É o primeiro disco desde que o artista venceu o prêmio Nobel de Literatura, há quatro anos.

Pode ser encomendado em versões de CD ou LP —ambos duplos— numa série de lojas americanas, como indica o site oficial do artista. No Brasil, estará disponível só nas plataformas digitais.

Tem só dez canções, que variam entre pouco mais de quatro minutos até os quase 17 de “Murder Most Foul”, que pôs Dylan, pela primeira vez em sua carreira, no topo de uma lista da Billboard, a de vendas digitais de canções de rock, com 10 mil downloads pagos na primeira semana.

O álbum traz ainda ao menos duas pérolas, “My Own Version of You” e “Key West (Philosopher’s Pirate)”, algumas baladas um tanto chatas, “I’ve Made Up My Mind to Give Myself to You” e “Black Rider”, e um possível plágio em “False Prophet”. No geral, é muito bom.

Começa com “I Contain Multitudes”, lançada em abril. É uma canção lenta, com guitarra dedilhada e sem refrão. O título (contenho multidões) vem de um poema de Walt Whitman e está aqui na frase “I’m just like Anne Frank, like Indiana Jones/ and them British bad boys, the Rolling Stones”, algo como “sou como Anne Frank, como Indiana Jones/ e os rapazes britânicos malvados, os Rolling Stones”.

A obra segue com “False Prophet”, lançada em single no início de maio. Tem um riff forte de guitarras, solos marcantes e um andamento forte por seus seis minutos.

Especialistas em música americana, no entanto, cavucaram um lado B de um compacto de 1954, de Billy “The Kid” Emerson, um cantor e compositor gravado por Elvis Presley, entre outros. E eis que “False Prophet” é completamente xerocada de “If Lovin’ Is Believing”. Sim, parece plágio, basta comparar as duas canções nas plataformas de streaming.

“My Own Version of You” tem um lindo andamento descendente, baseado em guitarras, que ecoa uma elegância que recorda as melhores trilhas dos filmes de James Bond da época de Sean Connery.

Com seis minutos e 41 segundos, também traz menções a personalidades, como o pianista Liberace, e assume o ponto de vista de um sinistro Frankenstein recriando uma mulher. “Uma faísca de luz é tudo o que eu preciso, e uma explosão de eletricidade que corre em alta velocidade/ me mostre suas costelas, eu enfio a faca/ Começo a trazer minha criação à vida.”

A força cai um pouco em “I’ve Made Up My Mind to Give Myself to You”, uma balada arrastada. Falando de estrelas e flores, Dylan conta como se convenceu a se entregar a seu amor. A voz sofrida e cansada deste homem, que fez 79 anos em maio, certamente adiciona um elemento de respeito a esse lamento de amor. Mas seis minutos e meio desse lenga-lenga parece excessivo.

A quinta música se chama “Black Rider”, viajante ou cavaleiro negro, e se apoia no vocal de Dylan, de um lado, e em acordes quase dedilhados, do outro. Minimalista, é a menor do álbum, com quatro minutos e 13 segundos.

“Goodbye Jimmy Reed” retoma a força de “Rough and Rowdy Ways”. Jimmy Reed foi um blueseiro do Mississippi regravado por diversos artistas nos anos 1960, como os Rolling Stones, Yardbirds e notadamente o Them, de Van Morrison, com sua bela versão de “Bright Lights, Big City”. A canção de Dylan vem no melhor estilo de banda de bar, com guitarras solando no começo e o andamento do velho rock n’roll dos anos 1950.

Outra balada chega com “Mother of Muses”. Com uma levada que lembra antigos hinos folk americanos, Dylan aparece aqui acompanhado só com um violão, lembrando seu início de carreira e, talvez, Neil Young, em seus momentos mais melódicos dos anos 1970. É de uma delicadeza tocante em seus quatro minutos e meio.

Já “Crossing the Rubicon”, de mais de sete minutos, é aquele velho blues lento que parece que já ouvimos mil vezes.

Com “Key West (Philosopher’s Pirate)”, Dylan sobe de tom outra vez, entregando uma linda canção enquanto viaja para as ilhas ao sul da Flórida ouvindo uma rádio pirata. “Key West is the place to be/ if you are looking for immortality/ Stay on the road, follow the highway sign/ Key West is fine and fair/ if you lost your mind, you will find it there”, ou “Key West é o lugar para estar/ se você está procurando a imortalidade/ Fique na estrada, siga a placa da rodovia/ Key West é legal e justa/ se você perdeu a cabeça, vai encontrá-la lá”.

Exatamente como em “Mozambique”, do disco “Desire”, de 1976, Dylan nos leva a um lugar de sonhos, mas que realmente existe. Depois de escutar essas canções, nos dá vontade de conhecer os lugares.

O disco enfim termina com o épico de 17 minutos “Murder Most Foul”, do qual muito já se falou neste jornal e na imprensa mundial. Lançada no final de março, depois de um hiato de oito anos —seu último disco de inéditas havia sido “Tempest”, de 2012—, traz referências ao assassinato do presidente americano John Kennedy.

Prestes a se tornar octogenário, Dylan mostra em “Rough and Rowdy Ways” que ainda cria canções importantes, melodias bonitas e letras surpreendentes. Se ele está procurando a imortalidade, parece que já a conquistou.

Rough and Rowdy Ways

  • Quando Lançamento na sexta-feira (19) nas plataformas de streaming
  • Gravadora Sony
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