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Jocy de Oliveira nos suga para dentro de sua ópera que parece um filme

'Liquid Voices' tem cantores e instrumentistas em ruínas cariocas ao som eletroacústico da compositora

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Liquid Voices - A Históra de Mathilda Segalescu

Muitos fãs de ópera estão inaugurando, na quarentena, o hábito de assistir a óperas gravadas. Elas já existiam, em DVD e em plataformas de streaming, mas não pareciam muito atraentes. Para os moradores de São Paulo, sobretudo, com um calendário movimentado de óperas pela cidade a preços muitas vezes menores que os do cinema.

Porém, com os teatros fechados, nos resta ver as óperas filmadas. Feitas para o público presente e gravadas para nós, os futuros espectadores da pandemia.

Mas eis que chega a ópera de Jocy de Oliveira, "Liquid Voices", que nos transporta para dentro de si, para dentro das ruínas do Cassino da Urca, no Rio de Janeiro, onde foi gravada.

Oliveira faz o que muitos consideram música estranha. Pioneira no Brasil em obras multimídia, ela trabalha com música eletroacústica, que usa meios eletrônicos para manipular os sons de instrumentos musicais acústicos. Ela também foi a primeira mulher a ter uma ópera encenada no Theatro Municipal de São Paulo, em 1994 —o teatro foi inaugurado em 1911.

Há de se fazer justiça com as gravações. "Liquid Voices - A História de Mathilda Segalescu", de Oliveira, não é ópera filmada, mas sim, como ela mesma descreve, uma ópera cinemática, pensada para ser um filme. Prevista para estrear nos cinemas do país após turnê por festivais, chega ao streaming por força do coronavírus.

Ela foi encenada, contudo, em 2017, no diminuto palco do Sesc 24 de Maio, em São Paulo. Transposto a sua versão originalmente concebida por Oliveira, compositora de 84 anos sempre disposta a inovar, o espetáculo ganhou muito, ainda que as caixas de som em casa não sejam tão potentes quanto as de um cinema e o prazer da música ao vivo jamais possa ser substituído.

A obra narra a história de um piano, que um dia pertenceu à Mathilda do título, e que é o único a sobreviver a um naufrágio em meio à Segunda Guerra. Um navio que levava judeus da Romênia para a Palestina. Anos depois, é encontrado por um pescador árabe, que passa a ser perseguido pelo espectro da pianista.

É o movimento dos cantores, a soprano Gabriela Geluda e o tenor Luciano Botelho, em cenário escuro e de destruição das ruínas que fez a ópera ganhar mais vida que no palco e, assim, a música também saiu ganhando. Porém, na tela, as cenas faladas perdem vigor, tornando esses trechos um tanto enfadonhos, como se gerassem uma expectativa para a volta do canto, tão potente na voz de Botelho.

Uma das cenas finais, em que o fantasma de Mathilda se despe e é coberto por um tecido branco pelo pescador, tem música envolvente, com tambura, um instrumento de cordas de origem indiana, e um tambor árabe. O ponto alto do espetáculo em nossas casas.

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