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Série 'Cursed' dá impressão de roteiro escrito por algoritmo

Protagonismo feminino na nova produção da Netflix não é novidade nas releituras da lenda do rei Arthur

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CURSED - A LENDA DO LAGO

  • Quando Estreia nesta sexta-feira (17)
  • Onde Netflix

Se existe uma lição a se tirar da narrativa pasteurizada da série de fantasia “Cursed”, que estreia nesta semana na Netflix, é que talvez esteja na hora de deixar as histórias do rei Arthur descansando num cantinho antes de tentar dar a elas “uma roupagem atual” pela enésima vez.

Mexer nesse vespeiro de séculos de imaginação não é para qualquer um —e certamente não parece ser a praia de Tom Wheeler e Frank Miller, os criadores do seriado.

Nos cinco episódios (de um total de dez da primeira temporada) disponibilizados de antemão para a imprensa, há praticamente de tudo, um povo “das fadas” com poderes mágicos derivados da natureza, monges-guerreiros trajados de escarlate que adoram assar os membros desse povo em cruzes, cavaleiros vis e nobres, ataques de vikings, o papa (não sabemos exatamente qual) no ofurô e um Merlin pinguço e privado de sua magia (aliás, por falar em vikings, o célebre mago é interpretado por um velho conhecido da série “Vikings”, Gustaf Skarsgard, ou Flóki). Ufa.

O problema nem é exatamente a mistureba de referências e períodos históricos, que vão do imperador cristão Carlos Magno (748-814 d.C.) à guerreira bretã Boudicca (que viveu uns 800 anos antes de Carlos Magno), com pitadas da Idade do Bronze e do Renascimento. Ninguém parece saber exatamente em qual lugar ou época a história se passa, e ninguém parece se importar com a imprecisão.

Nesse ponto, até que o trabalho da série lembra o que aconteceu com o ciclo arturiano ao longo da Idade Média. Com o passar dos séculos, a saga foi adquirindo aspecto de bola de neve, incorporando os mais diferentes elementos, das fontes mais disparatadas, até transformar o reinado de Arthur numa espécie de Terra do Nunca, para a qual convergiam todos os aspectos do imaginário medieval.

De novo, porém, é preciso engenho e arte para que esse ato de alquimia não acabe chamuscando o nariz de quem está criando a história. Wheeler e Miller (o segundo mais conhecido pelo seu trabalho nos quadrinhos, com personagens como Batman e as séries “300” e “Sin City”) tentam fazer isso ao transformar em protagonista a donzela Nimue, papel de Katherine Langford, originalmente uma personagem secundária das histórias arturianas.

Na nova versão da série, ela se torna a guardiã da Espada do Poder (decerto uma referência à lendária Excalibur) e, ao que tudo indica, será o bastião contra o fanatismo dos Paladinos Vermelhos, os monges que querem exterminar o “povo das fadas”.

Os temas do protagonismo feminino e do confronto entre a antiga fé pagã e um cristianismo supostamente fanático tampouco são novidade nas releituras da saga arturiana —a escritora americana Marion Zimmer Bradley, morta em 1999, já havia adotado essa perspectiva em “As Brumas de Avalon”, com considerável competência.

Na nova produção, porém, quando colocados no caldeirão junto com os demais elementos, fica difícil evitar a impressão de roteiro escrito por algoritmo (“detectamos aqui que o pessoal entre 20 e 30 anos de idade adora vikings, vamos pôr uns vikings na história também?”).

Nimue e seu possível par, Arthur, papel de Devon Terrell, são carismáticos, e em alguns pontos a narrativa é capaz de arrastar adiante quem está assistindo, mas raramente é o suficiente.

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