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Cinema

'Mulan' live-action vem recheado de uma trilha sonora óbvia e clichês

Disney se permite toda licença poética do mundo para falar de coisas atuais, como o novo lugar da mulher na sociedade

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Mulan

  • Quando Sem data de estreia no Brasil
  • Elenco Liu Yifei, Donnie Yen e Jet Li
  • Produção EUA, 2020
  • Direção Niki Caro

Não faz mal que o novo “Mulan” se valha dos mesmos clichês que se usava quando eu era criança. Afinal, as crianças de agora não os devem conhecer, nem, portanto, os reconhecer como clichês. Talvez mesmo elas tenham alguma dificuldade para atravessar a barreira de ditados chineses que se erguerá à sua frente. Essa é a China tradicional.

Já as incompreensões da família de Mulan, diante dos dotes excepcionais que manifesta desde a infância, dizem respeito bem ao nosso mundo. Ao feminismo, ao papel da mulher neste novo mundo. Por mais horror que Mulan cause à casamenteira nos cafundós da China, é daqui mesmo que a Disney fala.

Mulan é uma jovem especial, eis a questão. Mais do que isso –uma guerreira. Atributo não concedido às mulheres na sociedade chinesa. E nem para os nossos lados. Em todo caso, quando remete a ação para os confins da China, a Disney se permite toda licença poética do mundo para falar de coisas atuais.

A mais óbvia delas é, claro, o novo lugar da mulher na sociedade. E “Mulan” nos lembra que a nova feminilidade é assim –guerreira, sim, mas nem por isso menos feminina. Mulan, papel de Liu Yifei, pode desprezar as maquiagens exageradas, a obsessão pelo casamento e tudo mais.

Continuará, porém, a atrair os mais belos e valentes dos rapazes e a ser atraída por eles (mesmo que essa atração se mostre, primeiro, como rivalidade –a neozelandesa Niki Caro, diretora do filme, sabe bem usar as artes do cinema hawksiano).

Mas isso importa pouco. O império chinês está dividido entre o imperador e aqueles que pretendem usurpar o seu trono. Vilões, naturalmente. É em torno disso que se desenvolve a trama, com Mulan se alistando nas tropas imperiais

A segunda e menos explícita postulação do filme diz respeito à guerra. A América, os Estados Unidos, são por excelência o povo guerreiro do presente. Alinhavam Segunda Guerra, Coreia, Vietnã, Camboja, intervenções na América Latina, depois Líbia, Iraque, de novo Iraque.

Em poucas palavras, Mulan está aí para nos lembrar que as garotas, até aqui protegidas do horror dos combates, agora devem estar prontas para assumir seu papel de igual do homem na sociedade, ou seja –estar prontas para a guerra.

Para que não haja muita dúvida a esse respeito, “Mulan” veste os guerreiros usurpadores com trajes que lembram bem os dos muçulmanos.

“Mulan” é uma empreitada ideológica na tradição Disney. Não deve haver maior problema nisso (a pedagogia sempre falha nesse setor). Exceto que, para tornar mais épico o todo, levado a poder sobretudo de artes marciais, a produção houve por bem rechear o filme inteiro de uma música tão óbvia que podemos adivinhar, de olhos fechados, o que acontece na imagem.

Não é o caso de dizer aos pais algo como “não leve seu filho a ver isso”. Mas, para passar um dia sossegado, mande a criançada com os amiguinhos para ver o quebra-pau (que tem, de resto, alguns bons momentos). Aproveite o tempo para um churrasco, uma soneca, uma transmissão do futebol pela TV. Estará melhor servido.

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