Descrição de chapéu The New York Times

Eddie Van Halen reinventou as regras dos 'guitar heroes' e depois voltou a quebrar tudo

Herdeiro de Hendrix e Page, ele se transformou no debulhador supremo, com precisão, velocidade e viradas abruptas

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Jon Pareles
The New York Times

Eddie Van Halen não tocava rápido, tocava hiper-rápido. Tocava alto. Tocava de um modo vistoso, assertivo e explosivo e frequentemente deixava uma exibição de virtuosismo pela metade para a concluir com um glissando, um guincho ou uma escala ainda mais vistosa.

Como guitarrista solo do grupo Van Halen, ele fazia tudo isso sempre exibindo um sorriso nada forçado —em lugar das contorções faciais altamente melodramáticas de muitos solistas de seu instrumento, ele exibia um sorriso de encanto quase infantil pela combinação de propulsão, filigranas e caos sonoro e pela ruidosa diversão que ele produzia.

Sua guitarra mais característica, uma Frankenstrat vermelha decorada com listras pretas e brancas, não era uma arma fálica mas um brinquedo infinitamente maleável.

O Van Halen lançou seu disco de estreia, que levava o nome da banda, em fevereiro de 1978, o que fez de Eddie Van Halen um dos últimos assim ditos “heróis da guitarra” a se conectar com uma audiência de massa. (Coincidentemente, Prince, que entre seus muitos outros papéis também era capaz de exercer o de herói da guitarra, lançou seu primeiro disco em abril daquele mesmo ano.)

Os sucessos pop do Van Halen ajudaram. Ainda que a banda creditasse as composições a todos os seus integrantes, Eddie Van Halen desempenhava o papel principal nas composições, dos sintetizadores pulsantes que introduzem “Jump” aos acordes sincopados esmerilhados e o riff puladinho de “Unchained”. E em seguida ele muitas vezes tratava suas estruturas sólidas como parques de diversão. Eddie Van Halen era arquiteto e vândalo ao mesmo tempo.

Ele conseguiu manter seu papel como herói da guitarra mesmo quando essa posição começou a se tonar obsoleta. No auge da banda, durante os anos 1980, a eletrônica e o hip-hop estavam reformulando o cenário do pop, enquanto o hard rock se tornava uma música underground e facciosa.

O punk já tinha despertado ceticismo em relação à técnica instrumental exibicionista e o conceito de herói da guitarra, e, quando o grunge reconduziu o hard rock às paradas pop pela última vez, na década de 1990, os guitarristas aprenderam a subordinar seu papel à banda e às necessidades de cada composição.

O domínio técnico inegável de guitarristas como Steve Vai, Joe Satriani, Yngwe Malmsteen ou Buckethead só os tornou heróis para uma base de fãs muito mais limitada.

Eddie Van Halen foi o herdeiro de guitarristas e compositores como Jimi Hendrix, Pete Townshend e Jimmy Page, cujo domínio de seus instrumentos misturava técnicas tradicionais de digitação a um domínio cada vez mais avançado da amplificação e efeitos especiais. Mas, enquanto esses heróis da guitarra dos anos 1960 provinham da tradição narrativa e do domínio vocal do blues, Van Halen —tanto Eddie quanto a banda— estavam um passo mais distantes do blues, e suas bases eram, em lugar disso, o Led Zeppelin e o Who, o uso de “power chords” e de solos velozes.

Outra influência que não vinha do blues era o rock progressivo, especialmente as técnicas semelhantes às dos tecladistas adotadas pelo guitarrista britânico Allan Holdsworth, que Eddie Van Halen usou para alguns de seus solos mais rápidos e mais ferozes.

Van Halen, que influenciaria incontáveis guitarristas nas décadas seguintes, se transformou no debulhador supremo e exibia precisão, velocidade e viradas abruptas únicas.

“Eruption”, a faixa instrumental de dois minutos de duração que ele usava para aquecimento mas terminou transformada em parte de seu primeiro álbum, serviu como cartão de visitas do guitarrista em “Van Halen” e combinava o impacto do hard rock —o “power chord” inicial e a dramática escala descendente final— com os dedilhados metódicos e os trinados de um “étude” clássico, tudo isso muito distante do blues.

Ao longo do catálogo de Van Halen —e não podemos nos esquecer de mencionar seu solo veloz, ousado e pulsante em “Beat It”, de Michael Jackson—, não se ouve um som plangente de guitarra com muita frequência. Ele às vezes é melódico —como na ponte que surge subitamente em meio a “Panama”, uma canção dançável—, mas fica bem claro que ele preferia músculo e ruptura. ​

No entanto, suas rupturas não soavam destrutivas. Elas eram como que uma sobrecarga de entusiasmo bruto —pela agilidade de seus dedos, pela distorção hipnótica que ele conseguia convocar e alterar ao seu gosto, pelas surpresas que não resistia a espalhar ao longo de uma canção. O cerne de sua música era um sorriso alegre, e esse sorriso tinha motivo.

Tradução de Paulo Migliacci

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