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Fãs da Mostra sentiram falta de calor humano trancados em casa em ano virtual

Recordistas de filmes e outros cinéfilos contam como foi a edição online do festival de cinema paulistano

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São Paulo

Todo mês de outubro, centenas de cinéfilos paulistanos se aglomeram no saguão do Conjunto Nacional, passando vários minutos em filas para comprar pacotes e disputando cada um dos ingressos para os filmes mais concorridos da Mostra de Cinema de São Paulo.

Neste ano as coisas foram diferentes. As sessões das cerca de 200 obras escaladas para a 44ª edição do evento migraram para a internet —no máximo, encontraram um espacinho na limitada programação dos drive-ins.

Mas festivais de cinema não são só sobre as sessões dos filmes. Eles também promovem convivência, debate, milagres na agenda e boca a boca —capaz de alçar desconhecidos a queridinhos da seleção. Sem a fisicalidade da Mostra em 2020, como ficaram os cinéfilos?

Abertura da Mostra de Cinema de São Paulo, com sessão drive-in do filme "Nova Ordem", no Memorial da América Latina
Abertura da Mostra de Cinema de São Paulo, com sessão drive-in do filme "Nova Ordem", no Memorial da América Latina - Danilo Verpa/Folhapress

“Nós perdemos três elementos, o potencial de encontro que o evento representa, o impacto que uma tela imensa proporciona e o caráter coletivo que caracteriza a ida ao cinema —você também frui com a reação da plateia”, diz Flávio Ponchi, revisor de texto que frequenta a Mostra há 24 anos.

Ele diz que é possível atenuar algumas desvantagens, turbinando, por exemplo, os equipamentos eletrônicos —para o evento, Ponchi comprou um computador novo. Também ressalta que o formato virtual democratizou a Mostra para o resto do país. Segundo a sua organização, porém, não é possível levantar dados de localização dos espectadores.

A edição deste ano ofereceu alguns filmes gratuitos, mas a grande massa teve ingressos vendidos a R$ 6. No ano passado, as entradas avulsas variaram de R$ 20 a R$ 24, com opção de meia-entrada, indisponível neste ano. Também não foram vendidos, desta vez, os populares pacotes de ingressos.

Ponchi e outros cinéfilos destacaram que a programação online os ajudou a ter maior liberdade e facilidade de acesso aos filmes. Foi em parte por isso que João Batista Viana de Siqueira se tornou um dos recordistas de filmes vistos nesta versão online da Mostra.

Ele, que é aposentado, assistiu a pelo menos 80 longas. É um aumento em relação aos anos mais recentes, mas Siqueira ressalta que em 2007 chegou a ver 133 produções —ele escreve os números num caderno, que guarda com os ingressos e catálogos dos anos passados.

“Por estar na minha casa, consegui ver os títulos na hora que queria”, diz ele, que sente falta do convívio com os amigos de Mostra e dos cafés entre sessões. “Mas, por mais que eu esteja no conforto de casa, eu acho que este ano me cansei mais. Na Mostra presencial tem adrenalina, aquilo de sair correndo de uma sessão para outra, mas agora parece que cansei mais, porque fico sentado o dia todo e não vejo ninguém.”

Atrás de Siqueira, Sílvia Regina Tachinardi também aparece no ranking dos frequentadores mais assíduos desta Mostra, com 60 filmes até o último fim de semana.

“Eu estou há menos de um ano aposentada, então esta é a primeira Mostra em que eu estou totalmente disponível”, diz ela, que integrou o público do evento pela primeira vez nos anos 1980. “Era o meu grande sonho ter tempo para assistir a tantos filmes e na hora que quisesse.”

Ela destaca como ponto positivo a disponibilização, pela organização da Mostra, de listas temáticas, como LGBTs e adaptações literárias, e com longas exibidos em festivais estrangeiros.

Mas nem todos notaram a aba com essa categorização na plataforma Mostra Play. Aliás, a falta de comunicação e de informação foi um ponto negativo destacado por Cristiane Magalhães, também aposentada e com cerca de 20 filmes vistos.

Segundo ela, faltou divulgação quanto ao funcionamento desta edição —crítica que aparece com frequência nas redes sociais e que pode ajudar a explicar o porquê de medalhões como Tsai Ming-Liang não terem esgotado.

Muitos cinéfilos esperaram ansiosos pelo início das vendas, achando que os destaques da seleção esgotariam rapidamente. Até a conclusão desta edição, no entanto, eram só 12 os longas que chegaram a lotar suas sessões.

No total, 65.519 entradas foram vendidas até a tarde desta terça pela plataforma Mostra Play. Nas parceiras Spcine Play, Sesc Digital e Belas Artes à la Carte, foram 30.610 até o domingo. Sessões em drive-ins e no Ibirapuera somaram pelo menos 3.700 espectadores.

Os números não destoam tanto da Mostra do ano passado, quando cerca de 150 mil pessoas compareceram às sessões. Estão um pouco abaixo, mas vale ressaltar que muitos espectadores, no formato online, veem os longas acompanhados.

Cristiane Magalhães, que reclamou da falta de informação, também diz ter enfrentado problemas com o streaming do evento, como travamentos e falta de sincronia em legendas. “Grande parte do público, acredito, é como eu, não tão mocinho. Eu peguei o início dos computadores, consigo mexer em muita coisa, mas tive dificuldade para resolver os meus problemas”, afirma.

Mesmo com as críticas da cinéfila, a plataforma criada para o evento recebeu, no geral, avaliações positivas. Problemas surgiram às vezes, e em especial nas horas iniciais do evento, mas a experiência parece ter sido positiva para a maioria.

“Foi ótimo e eu não esperava. Achei que ia ter muito problema, instabilidade, mas tive coisas mínimas. E as orientações que recebi também foram ótimas”, diz Antonio Carlos Egypto, que todos os anos vê entre 50 e 60 títulos e que mantém um blog com críticas de cinema.

A Mostra encerra sua 44ª edição nesta quarta, no parque Ibirapuera, com sessão de “Another Round”. Antes, acontece a cerimônia de premiação, com transmissão online. Até o dia 8 de novembro, cerca de cem filmes ganham novas exibições na já tradicional repescagem.

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