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Livro mostra como o maior fotojornalista do Brasil interpretava a vida

Com inspiração humanista e sem flash, cearense Luciano Carneiro construiu um legado apesar da carreira breve

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Multidão ouve o comício de Fidel castro durante a tomada de Havana pelos revolucionários em janeiro de 1959

No início de 1959, Carneiro acompanhou os momentos finais da Revolução Cubana e documentou a entrada de Fidel Castro em Havana, entrevistando o líder revolucionário e outros dirigentes para O Cruzeiro Acervo Estado de Minas/O Cruzeiro

São Paulo

Luciano Carneiro - Fotojornalismo e Reportagem (1942-1959)

  • Onde https://lojadoims.com.br/
  • Preço R$ 129,50 (256 págs.)
  • Autor Org. Sergio Burgi
  • Editora IMS/FDR

"Meu Deus, a vida é tão rica de sugestões, há tanta poesia perdida até mesmo no meio da rua, que basta a gente manter os olhos abertos, e a máquina pronta, para selecionar as imagens que tenham significação, e assim interpretar a vida. Eis a fórmula.”

Era dessa maneira, simples e objetiva, que o cearense Luciano Carneiro enxergava o fotojornalismo.

Seu trabalho, inspirado no fotojornalismo humanista, corrente que tomou conta da linguagem fotográfica no pós-Guerra, encontrou amplo espaço na revista O Cruzeiro, publicação brasileira de vanguarda e de maior circulação na década de 1950, na qual ele atuou entre 1949 e 1959.

Fã declarado de nomes como Henri Cartier-Bresson, Eugene Smith, Robert Doisneau e Robert Capa, Carneiro procurava capturar a vida cotidiana de mulheres e homens comuns sempre através de uma narrativa crítica.

O flagelo da seca no nordeste brasileiro e a vida nas favelas cariocas estão entre as primeiras grandes coberturas pela revista. Já nestes trabalhos inaugurais se evidenciava na fotografia de Carneiro uma pegada autoral típica dos fotógrafos humanistas do período, com os quais conviveu em suas viagens.

Uma mãe segura seu filho numa habitação feita de madeira, numa favela carioca , em 1950
Na reportagem 'Uma História de Sobreviventes', publicada em 14 de outubro de 1950, Luciano Carneiro faz uma forte denúncia sobre os índices de mortalidade infantil, de mais de 80% em crianças até 3 anos de idade, nas favela carioca da praia do Pinto, no bairro do Leblon, confrontando na reportagem esta situação com uma creche para crianças filhas de moradores da classe média do bairro - Acervo Estado de Minas/O Cruzeiro

Fixar as emoções humanas sem artifícios e nem poses era uma obsessão para o fotógrafo, que abandonou a desajeitada Rolleiflex ao ter acesso às leves e compactas câmeras de filme 35 milímetros. "Trabalho de preferência com máquinas de 35 mm, a Nikon, japonesa, e a Leica, alemã. Elas me permitem dispensar o flash, do qual me tornei inimigo", disse.

As reportagens com grande engajamento social tomaram conta não só da pauta de Carneiro, mas das lentes de jovens fotógrafos de O Cruzeiro, uma talentosa geração que tinha nomes como Flávio Damm, Henri Ballot e José Medeiros.

Carneiro não só fotografava em suas reportagens, como também produzia os textos. Infelizmente, a prolífica carreira do jornalista foi abreviada aos 33 anos de idade, num trágico acidente aéreo.

Intensidade é a palavra que pode definir os pouco mais de dez anos da breve carreira do fotógrafo. Ele esteve presente na entrada de Fidel Castro em Havana, durante a Revolução Cubana.

Foi um dos únicos latino-americanos a cobrir a Guerra da Coreia, de 1950 a 1953, desvelou o dia a dia dos soviéticos, viajou ao Egito de Nasser. Fez grandes reportagens na África, no Japão e na Iugoslávia de Tito.

O tempo oxidou a marcante trajetória de Luciano Carneiro, que se viu relegada aos arquivos e à memória de alguns.

Nas últimas décadas pouco se falou de sua obra, e muito menos do legado deixado ao fotojornalismo brasileiro.

Lançado pelo Instituto Moreira Salles em parceria com a Fundação Demócrito Rocha, o livro "Luciano Carneiro - Fotojornalismo e Reportagem (1942-1959)" cumpre um importante papel de resgate daquele que pode ser nomeado como o maior repórter-fotográfico nacional.

A publicação traz uma generosa seleção de imagens, com mais de 170 fotografias.

Se o francês Jean Manzon, responsável por reformular a revista O Cruzeiro na década de 1940, é considerado o pioneiro da fotojornalismo moderno no Brasil, foi Luciano Carneiro quem conduziu a nova geração a um passo adiante.

O viés cosmético e interpretativo de Manzon foi cedendo espaço para as reportagens diretas e objetivas produzidas pela nova geração.

Um ponto alto do livro são as mais de 35 reproduções de reportagens originais da revista O Cruzeiro. Os fac-símiles nos dão a noção exata de como o material era editado. Permite ao leitor ver não só as fotografias, mas entender o contexto de sua época.

A produção do cearense foi vasta. Em 1956 estreou uma coluna semanal de duas páginas intitulada Do Arquivo de um Correspondente Estrangeiro, na qual publicava vigorosas fotografias, parte do material excedente de suas viagens.

Rodou pela Europa, fotografou as grandes estrelas do cinema e celebridades, cobriu algumas Copas do Mundo. Viajou o Brasil para registrar com urgência a transformação e modernização do país sob seu olhar humanista.

Os pesquisadores analisaram mais de 20 mil imagens produzidas pelo fotógrafo.

A sensação é de que podem vir muito mais volumes, pois Luciano Carneiro sabia como ninguém contar uma boa história. "O resultado, este depende da sensibilidade e da experiência do homem, que fica trás das lentes."

Fotografia mostra o fotógrafo Luciano Carneiro, um homem com cerca de 35 anos, andando com suas câmeras penduradas junto ao corpo, durante a produção de uma reportagem
Luciano Carneiro em ação durante uma reportagem em fotografia sem data e nem local - Acervo Estado de Minas/O Cruzeiro
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