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Thales de Menezes

CCXP sobreviveu à pandemia, mas nada supera trombar com Chewbacca numa fila

Acesso mais fácil a famosos foi positivo em versão virtual de evento que mobiliza milhares de fãs, alguns fantasiados

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São Paulo

No ano passado, este repórter estava a caminho da CCXP ( Comic Con Experience) e encontrou um casal que chamava a atenção dentro do vagão do metrô paulistano.

Na casa dos 30 anos, ele estava vestido de Thor, com martelo e tudo. Ela, de Mulher-Maravilha. Completava a família um constrangido garoto de uns oito anos, com sua paixão por HQ resumida em uma discreta camiseta com a imagem de Wolverine estampada.

Deixar de encontrar tipos assim talvez seja uma decepção para quem frequentou pelo computador os três dias do evento de 2020, encerrados neste domingo (6).

A oferta digital foi generosa, com mais de 150 horas de programação. É louvável o trabalho da organização, que combateu da melhor maneira possível as restrições impostas pela pandemia para colocar de pé a versão brasileira do maior encontro geek do planeta.

Difícil dizer se a virtual CCXP Worlds foi melhor ou pior do que a consagrada versão presencial. E põe presencial nisso. Em 2019, mais de 280 mil pessoas visitaram o centro de exposições que abrigava o evento.

Neste ano, a transmissão pela internet chegou a picos de 350 mil acessos simultâneos. Como esperado, o público aumentou, facilitando a vida de quem não tinha tempo ou dinheiro para percorrer os abarrotados corredores da feira.

Para um nerd com excesso da timidez típica dessa tribo urbana, ficar no quarto conectado com as atividades pode ter sido conveniente. Para um geek com espírito gregário, 2020 não ofereceu a chance para que ele ficasse frente a frente com seus pares. Amizades, namoros e até casamentos foram resultado de cruzamentos de afinidades pop no decorrer das edições da CCXP.

Para compensar esse distanciamento social obrigatório, muita coisa foi pensada para turbinar a experiência dos fãs. A começar pelo ambiente virtual, inspirado no game "League of Legends". Uma boa novidade foi a possibilidade de ver depois alguma atividade que coincidiu com o horário de outra atração desejada.

Entre as áreas de interesse que dividem a CCXP, alguns “mundos” se mostraram bem mais palatáveis. O contato com os autores de HQ, espécie de coração do evento, ficou mais democrático. Sem a limitação do número de mesas dispostas na chamada Artists’ Alley (beco dos artistas), onde os fãs pegavam autógrafos, compravam gibis e prints ou simplesmente conheciam de perto seus desenhistas favoritos, a área virtual batizada de Artists’ Valley (vale dos artistas) permitiu o número recorde de 536 convidados.

A programação mais forte da edição 2020 estava reservada aos fãs de quadrinhos, em entrevistas ao vivo e masterclasses. Num caso raro em que uma limitação acaba trazendo benefício, a CCXP conseguiu fazer o contato dos visitantes com a lenda viva Neil Gaiman, autor britânico de obras veneradas religiosamente como “Deuses Americanos” e “Sandman".

Foi mais fácil que Gaiman aceitasse um link para responder perguntas remotamente do que providenciar a logística para trazer o artista ao Brasil. Sem a necessidade de todo esse trabalho, o cast de HQ da CCXP acabou recheado de autores como Mark Waid, Art Spielgman, Todd McFarlane e Dave Gibbons.

De certa forma, ficou revigorado o núcleo duro desse tipo de evento, que começou realmente como encontro de fãs de quadrinhos. Nos últimos anos, a transformação maciça de Hollywood em uma banca de gibis, com o ranking de bilheteria liderado pelas aventuras de super-heróis, levou todos os eventos desse tipo a se tornarem uma vitrine de atrações futuras do cinema.

Em 2019, São Paulo teve seus convidados mais relevantes nessa área. Entre outros, atores e diretores de “Mulher-Maravilha 84” e da trilogia final de “Star Wars”.

Nesta edição, a Covid-19 bateu pesado contra a turma do cinema, com muitos lançamentos adiados. A feira ainda conseguiu participação de grandes nomes, como os irmãos Anthony e Joe Russo, de “Vingadores: Guerra Infinita” e “Vingadores: Ultimato”, as divas Jessica Chastain e Penélope Cruz, e até Andy Garcia falando da nova versão de “O Poderoso Chefão 3”, que não é nem um pouco geek, mas um filmão de qualquer maneira.

Outro braço afetado foi o desfile de cosplayers pelos corredores. Houve competição virtual entre os melhores candidatos a recriar fantasias de seus heróis favoritos, mas conferir apenas essa elite é pouco. Na CCXP presencial, a ordem é encher o celular de selfies com os fantasiados, alguns quase perfeitos e outros constrangedores de tão ruins.

O prazer de comprar bugigangas também sofreu um tanto. Passeando pelos estandes, a compra por impulso é comum. Em casa, pela internet, talvez o consumidor seja mais criterioso. E no ambiente virtual você também deixa de recolher algumas sacolas de brindes dos expositores, outra atração forte para quem encarava a turba.

No fim das contas, a CCXP Worlds sobreviveu à pandemia. Quem passou mal sem seu passeio anual ao planeta geek segue na torcida por vacinas que permitam aglomerações. Mas, mesmo se voltar a seu cenário físico, a CCXP 2021 poderia pensar em aproveitar alguns recursos apresentados agora, reunindo o melhor de dois mundos, porque o acesso pela internet é mais democrático.

Mas nada supera a emoção de encontrar um Chewbacca na fila do pão de queijo.

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