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Morre John Le Carré, maior escritor de suspenses de espionagem, aos 89 anos

Escritor britânico trabalhou no serviço de inteligência e ficou conhecido pelos livros de espionagem

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São Paulo

O escritor britânico John Le Carré morreu aos 89 anos, neste sábado (12). Autor de “O Espião que Sabia Demais” e de outros livros de espionagem, ele teve uma pneumonia. Sua morte foi confirmada por seu agente neste domingo (13).

“Com grande tristeza devo anunciar que David Cornwell, conhecido mundialmente como John Le Carré, morreu depois de uma curta doença, não relacionada com a Covid-19, na noite de sábado, 12 de dezembro. Ele tinha 89 anos. Nosso pensamento está com seus quatro filhos, sua família e sua mulher, Jane”, publicou Jonny Geller, diretor do grupo Curtis Brown, agência com sede em Londres.

Le Carré ficou conhecido por livros com um texto elegante, fluido e sagaz que o consagrou. Sua carreira foi impulsionada pelo conhecimento real do mundo da espionagem. Seu primeiro romance, “O Morto ao Telefone”, foi lançado em 1961, quando ele ainda trabalhava no MI6, o serviço de inteligência britânico.

Antes de Le Carré publicar o livro "O Espião que Saiu do Frio”, best-seller de 1963 —chamado pelo escritor britânico Graham Greene de “a melhor história de espião já escrita”—, o modelo do espião britânico moderno na ficção era o James Bond de Ian Fleming.

Bond era tranquilo, urbano, devoto da rainha e do país. Com talento impecável para se livrar de problemas e levar mulheres para a cama, Bond alimentou o mito da espionagem como uma brincadeira glamurosa e excitante.

Le Carré derrubou essa noção com livros que mostram as operações de inteligência britânicas como fossas de ambiguidade, nas quais o certo e o errado estão próximos demais para serem distinguidos —e onde raramente fica óbvio se os fins, mesmo quando são bem claros, justificam os meios.

A prosa de Le Carré sempre foi encaminhada para outro lado do cotidiano dos agentes secretos. Seus personagens podem ser covardes com breves momentos de coragem, profissionais atrapalhados ajudados pela sorte ou pessoas de caráter questionável. Esses retratos despertaram a ira de muitos de seus ex-colegas espiões, prontos a criticá-lo.

Le Carré se recusava a permitir que seus livros fossem considerados em prêmios literários. Mas muitos críticos consideravam sua literatura de primeiro nível.

“Acho que ele tranquilamente deixou de ser um escritor de gênero e será lembrado como talvez o mais representativo romancista da segunda metade do século 20 na Inglaterra”, o autor Ian McEwan disse ao The Telegraph em 2013. Segundo ele, Le Carré “mapeou nosso declínio e registrou a natureza de nossas burocracias como nenhum outro conseguiu”.

A própria experiência de Le Carré como um jovem agente britânico, junto às pesquisas de campo como escritor, deram aos seus livros um selo de autoridade. Mas ele usava a realidade como ponto de partida para criar um universo ficcional único.

Em seus livros, ele criou —ou, pelo menos, foi responsável por popularizar— termos para se referir ao serviço de inteligência britânico, aos agentes e tipos específicos de operações. Essas expressões foram tomadas por espiões britânicos reais para descrever o próprio trabalho, assim como a máfia absorveu a linguagem de “O Poderoso Chefão”.

Em uma carreira de mais de meio século, Le Carré escreveu mais de 25 romances, que se passam em lugares como Ruanda, Tchechênia, Turquia, o Caribe e o sudeste da Ásia. Ele abordou temas tão diversos quanto o poder de empresas farmacêuticas, o conflito árabe-israelense e —depois que o Muro de Berlim caiu e seus romances ficaram mais polêmicos, e ele se tornou mais politizado— os excessos dos Estados Unidos e da Inglaterra contra os direitos humanos na guerra contra o terrorismo.

Se ele tinha argumentos políticos —e, com o passar do tempo, ele de fato tinha—, Le Carré os inseriu com elegância, em enredos complexos e descrições precisas. Ele podia descrever um personagem inteiro em uma única frase.

O escritor teve diversos best-sellers, e pelo menos seis de seus romances —incluindo “Um Espião Perfeito”, de 1986, descrito por Philip Roth como “o melhor romance inglês desde a guerra”— podem ser considerados clássicos. Mas ele sempre vai ser mais conhecido pelos livros da época da Guerra Fria, era que marcou a união perfeita entre o autor e o assunto.

Le Carré também escreveu um livro de memórias, “O Túnel de Pombos: Histórias da Minha Vida” (Record). Foram mais de 60 milhões de cópias de seus livros vendidas em todo o mundo.

“A morte de John Le Carré é uma perda imensa para todos que o amavam e admiravam na Penguim Random House e para todo o panorama cultural e político deste país”, disse Mary Mount, o editor de Le Carré na Penguin Random House nos últimos dez anos de vida do escritor. “Ele era um escritor que se importava quase tão profundamente com seu país quanto com seu trabalho. Era uma emoção e um privilégio trabalhar com ele. Ele também me fez rir —bastante.”

Tom Weldon, CEO da Penguim Random House UK disse que o trabalho de Carré “será lido e amado por muitas gerações”.

Jonny Geller, empresário de Le Carré, disse que o escritor é um “gigante indiscutível da literatura inglesa”. “Ele definiu a era da Guerra Fria e falou a verdade sem medo sobre o poder nas décadas seguintes. Sua obra foi lida e amada ao redor do mundo por seis décadas. Seu terceiro romance, “O Espião que Saiu do Frio”, em 1963, fez dele o mais famoso escritor de espionagem no mundo. Representei David por quase 15 anos. Perdi um mentor, uma inspiração, e mais importante, um amigo. Não veremos alguém como ele.”

Com The New York Times

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