BaianaSystem revisa ritmo acelerado da Tanzânia e Carnaval baiano em disco

Banda conecta América Latina e África Oriental em 'Navio Pirata', primeiro dos três atos que compõem o álbum 'OxeAxeExu'

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São Paulo

Há cerca de um ano, o navio do BaianaSystem atracou em Salvador. "A gente fez um Carnaval muito explosivo né? Foi o Carnaval da tampa da panela. A gente estava ‘pela boca’ em Salvador, no furdunço, questionando se dava ou não para a gente sair certos dias por causa da quantidade de gente”, diz o vocalista Russo Passapusso. “Depois que acabou o Carnaval, tudo lá em cima, a gente foi enclausurado dentro de casa.”

Nos últimos cinco anos, a banda lançou dois discos elogiados —“Duas Cidades”, de 2016, e “O Futuro Não Demora”, de 2019—, com uma sonoridade que vai do dub e do hip-hop ao frevo, tudo a partir da música de Carnaval de Salvador. O grupo ficou conhecido pelos shows eufóricos e pelo trio elétrico Navio Pirata, que se tornou um dos mais concorridos da festa baiana, e também passa por São Paulo.

Na última sexta (12), o BaianaSystem lançou a primeira das três partes de seu novo disco, “OxeAxeExu”. O primeiro terço —os outros saem março—, chamado de “Navio Pirata”, foi feito já no período de isolamento social, mas a banda ainda estava “com o corpo aquecido”.

“Shows com Gilberto Gil, Carnaval, festivais, tudo estava muito quente. A gente estava tocando e ensaiando”, diz Roberto Barreto, ícone da guitarra baiana, fundamental para a sonoridade do BaianaSystem. “Na composição, quando você toca junto, alguém tem uma grande ideia e começa a tocar, e você vê onde aquilo vai levando. Isso foi tolhido totalmente. Então, foi uma redescoberta arrumar um jeito de se contagiar e contagiar o outro.”

Em comparação com os shows do BaianaSystem e Gil, “Navio Pirata” tem um som mais sintetizado e calcado na pesquisa musical. A faixa “Catraca” usa um sample de um clássico do Carnaval baiano, “Buzu”, de Tonho Matéria, cantor e compositor dos blocos afro de Salvador, conhecida na versão da Banda Fuzuê.

Já “Nauliza” aproxima Bahia e Tanzânia, com a guitarra baiana dialogando com um estilo musical chamado singeli, que existe há cerca de 15 anos no país africano. A música tem trechos em suaíli e traz participações do MC Makaveli e do DJ e produtor Jay Mita, que a banda conheceu na internet junto ao agitador cultural Abbas Jazza.

Acelerada e energética, a música singeli pode bater 300 BPM e tem um estilo de dança chamado chura, em que as pessoas mexem as nádegas no ritmo, apoiadas no chão ou em outras pessoas. “É uma rima muito diferente, e tem uma referência diferente da costa leste, influência árabe, outras coisas”, diz Barreto. “E é super acelerado, tem uma relação forte com o público.”

Passapusso diz que estava buscando expressões da África que não passassem por Estados Unidos ou Europa. “Vi que os movimentos estavam fazendo um desenho muito colocado da indústria da música. Aí vi os vídeos desses caras, aquele poeirão enorme com um bocado de gente. É um jeito de dançar que eles tremem, vibram, abrem e fecham rodas. É diferente da estrutura da roda do rock and roll, do frevo ou dos índios.”

Além do jeito de rimar dos artistas de singeli, Passapusso diz que a trilha da palavra falada, o ritmo e poesia, também guiou o grupo para o grime, rap britânico feito por imigrantes jamaicanos que já tem desdobramentos no Brasil. A base da faixa “Monopólio” é um jungle, tipo de música eletrônica também usada no grime.

“A gente tem uma referência muito grande do grime. Esses flows não são propriamente do rap, nem dos jamaicanos, são desses jamaicanos em Londres. E eu vi que estava caindo solto nesse perfil de flow. Só que eu vinha com uma ladainha muito fincada [no canto das] lavadeiras.”

O vocalista destaca o jeito de cantar em “Reza Forte”, primeira faixa de “Navio Pirata”, com participação do rapper BNegão. No refrão, ele canta “folha de arruda, pé de coelho e sal grosso”, evocando uma espiritualidade que desemboca numa prece da rezadeira Dona Ritinha, da Paraíba —retirada do documentário “O Ramo”— na faixa “Raminho”.

“Navio Pirata” ainda traz “O Que me Destrói Não me Fortalece”, com participação de Céu e dois pés no dub. “Chapéu Panamá”, que encerra o primeiro ato, anuncia a partida do navio da África com direção à América. Os próximos atos são “Recital Instrumental”, em 5 de março, e “América do Sol”, no dia 26.

“Os nomes dão a pista, né?”, diz Barreto. “Cada ato tem uma cara. ‘Navio’ tem essa coisa do verbo, urbana. O 'Recital' passa pela música brasileira, entendendo o instrumental como uma coisa ampla que inclui o canto. E o ‘América’ adentra na América Latina, algo que já tínhamos começado em ‘O Futuro Não Demora’.”

OxeAxeExu

  • Quando 12 de fevereiro ('Navio Pirata'), 5 ('Recital Instrumental') e 26 ('América do Sol') de março
  • Onde Nas plataformas digitais
  • Autoria BaianaSystem
  • Produção Daniel Ganjaman
  • Gravadora Máquina de Louco
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