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Livrarias cariocas se juntam para enfrentar queda de vendas causada pela Covid

Oito espaços da cidade formam coletivo que busca fazer frente à Amazon e luta contra a taxação de livros pelo governo

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Rio de Janeiro

Elas já foram declaradas em vias de morrer, ensaiaram um recomeço e se depararam com a maior pandemia em um século. Agora, diante do agravamento dos casos de Covid-19 e da deterioração da economia do país, livrarias de rua do Rio de Janeiro –cidade que vem sofrendo com a crise econômica desde 2017– resolveram se unir.

Por enquanto, oito delas, entre lojas tradicionais, como a Argumento e a Leonardo Da Vinci, e outras inauguradas há pouco mais de um ano, como a Janela Livraria e a Lima Barreto, compõem o coletivo chamado Livrarias Cariocas.

livraria
Entrada da livraria Leonardo da Vinci, no centro do Rio de Janeiro, a mais antiga da cidade - Divulgação

O objetivo dos livreiros que encabeçam a iniciativa é propor medidas emergenciais e estruturais para o setor das livrarias de rua, buscando valorizar esses espaços de cultura e de incentivo à leitura.

“Sempre converso muito com a Elisa [Ventura], [dona] da Blooks. A partir da última conversa que tivemos, chegamos à conclusão que a gente precisava tentar criar um movimento das livrarias do Rio que têm as mesmas características, desenhar uma pauta bastante concreta para fortalecer as livrarias, o nosso modelo de negócios”, afirma Daniel Louzada, da Leonardo Da Vinci.

A livraria é a mais antiga em atividade no Rio desde o fechamento recente da São José, também fundada em 1952. Há cinco anos, prestes a encerrar as atividades, foi comprada por Louzada, que deu a ela nova vida.

Entre as medidas defendidas pelo grupo Livrarias Cariocas, estão a oposição à taxação do livro em 12%, conforme defendido pelo governo, e a aprovação de um preço fixo para os exemplares, questão que vem sendo discutida há anos e está parada no Executivo e no Legislativo.

“Embora seja um grupo, ele tem uma pauta bastante abrangente, que vale para todas as livrarias independentes e para todo o comércio de maneira mais ampla", diz Louzada.

O coletivo pretende ainda fortalecer as livrarias por meio da criação de uma cadeia de estímulo à leitura, com gestão do calendário de eventos –de modo a desconcentrar, por exemplo, os lançamentos– e doações de exemplares a 50 bibliotecas comunitárias localizadas na cidade.

Neste último programa, o cliente compra um ou mais livros numa das livrarias ligadas ao movimento. Estes serão entregues pelos próprios livreiros às bibliotecas comunitárias. Ao contrário da maioria das doações do tipo, quem elege os títulos são as próprias bibliotecas, de acordo com a gestão de seu acervo. “A livraria é uma causa de interesse do cidadão, da cidade. É muito importante entender esse papel e, por isso, começamos com esse projeto das bibliotecas comunitárias”, afirma Louzada.

Outro assunto que deve entrar em debate é a relação das livrarias com as editoras num momento em que, ao mesmo tempo em que há ameaças para ambos os lados, como a taxação, também se vê um aumento na venda de exemplares que não tem encontrado correspondência na saúde financeira das livrarias.

Segundo dados do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, o Snel, e da Nielsen, na comparação entre os terceiros períodos de 2020 (24 de fevereiro a 22 de março) e 2021 (1º a 28 de março), houve crescimento de 38,38% na quantidade de livros comercializados, totalizando 3,91 milhões de exemplares vendidos. O faturamento, por sua vez, cresceu 28,46%, passando de R$ 128,63 milhões para R$ 165,24 milhões.

Para o sócio da livraria Argumento, Marcus Gasparian, editoras e livreiros precisam estabelecer um novo tipo de relação, uma vez que o mercado está ainda baseado em regras “de 50 anos atrás, quando não havia site de vendas, Amazon”.

“Eu sou usado como um showroom não remunerado da Amazon”, diz o livreiro. Segundo ele, é comum que os clientes visitem as livrarias, mas façam suas compras pelo site da varejista americana –algumas vezes, segundo ele, no próprio café da loja.

“Tem que haver um equilíbrio entre o [comércio] físico e o virtual. Uma questão que a gente vai conversar é preço de livro.” Um dos desafios do setor é, precisamente, lidar com os descontos oferecidos pelo varejo virtual e, mesmo, as feiras de livros. “O preço do livro é feito em cima do cliente que pede mais desconto. O maior cliente é a Amazon e a Amazon pede 62%, 65% de desconto às vezes. Com isso, o livro fica mais caro [para compensar os descontos]. A culpa é nossa? Não é.”

Em 2019, a empresa americana se tornou a líder de vendas de livros no Brasil, na esteira da quebra das líderes nacionais do setor, a Saraiva e a Livraria Cultura. Ela, assim como outros varejistas que atuam na internet, compra os livros diretamente das editoras. As livrarias físicas —não só as independentes—, por sua vez, os pegam em consignação, como é regra em quase todo o mundo.

Diante das dificuldades enfrentadas pelo setor editorial em anos recentes, consequência, entre outros, da quebra da Saraiva e da Cultura, da crise econômica, do fim de políticas voltadas à aquisição de livros e dos próprios problemas de caixa de livrarias menores, a empresa americana ajudou a reduzir os danos das editoras por meio de suas compras e da antecipação de pagamentos.

No entanto, é consenso entre livreiros e editores que o setor não sobrevive só com a vitrine virtual. “Acho fundamental que a gente tenha uma rede de livrarias físicas fortalecida. Nunca foi tão claro para o mercado a importância da vitrine e do livreiro para que as novidades possam ser apresentadas para o público”, afirma Marcos Veiga Pereira, presidente do Snel e da editora Sextante.

“As editoras venderam muito seus catálogos [em 2020], mas o número de novidades que apareceu é muito pequeno. A gente perdeu vitrine, perdeu exposição.”

O editor acredita que este é o momento de livrarias e editoras atuarem juntas para atraírem os leitores. “Acredito que uma maneira de a gente ajudar as livrarias é criar um ambiente permanente de ações que tragam o público a elas, fazendo promoções conjuntas, eventos com autores no momento em que eles voltarem a acontecer e clubes de leitura. A livraria precisa ser um centro agregador, um polo de encontros.”

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