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Lockdown é um erro político, diz autora de 'Precisamos Falar sobre o Kevin'

Lionel Shriver lança 'A Família Mandible: 2029 - 2047', sobre clã que vive o colapso do sonho americano

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Washington

Lionel Shriver se preparava para jogar fora o rascunho de um novo livro quando o Reino Unido declarou seu primeiro lockdown para conter o coronavírus. Era março de 2020, e a escritora best-seller americana, que hoje vive em Londres, viu na obrigação de ficar em casa a maneira mais eficaz de escrever "Should We Stay or Should We Go", deveríamos ficar ou ir, em português, com lançamento previsto para junho.

"Medo e ansiedade têm alguma energia dentro deles e, muitas vezes, canalizo essas emoções no meu trabalho. Raiva e desgosto também", afirma Shriver.

mulher loira de olhos azuis encara fixamente a câmera
A escritora americana Lionel Shriver, autora de 'Precisamos Falar sobre o Kevin' - Divulgação

A longa duração do confinamento e a piora nos números de casos e mortes ao redor do mundo, porém, mudaram seu humor e sua percepção. A escritora passou a considerar o lockdown um “erro político”, na sua avaliação, uma prática insustentável em sociedades complexas. Pesquisas e autoridades de saúde, no entanto, mostram que a medida é fundamental para frear o avanço do coronavírus e contribui efetivamente para a queda nas taxas de transmissão onde é aplicada.

"Mas a desesperança é mortal. Desespero, temor, essa falta de fé no futuro. Nesse último período, essas emoções mais inertes e sem vida dominaram meu comportamento, e eu me tornei muito menos produtiva."

Em março, Shriver lançou no Brasil "A Família Mandible: 2029 - 2047", pela Intrínseca, escrito justamente com essa motivação do medo, ainda sob o temor da crise do sistema financeiro internacional de 2008. O romance foi publicado pela primeira vez há cinco anos, mas a escritora avalia que sua chegada neste ano ao Brasil é "muito oportuna."

A história conta a luta de um clã americano para sobreviver em meio ao colapso de uma nova ordem global, em que os tempos áureos dos Estados Unidos acabaram, o dólar não vale mais nada, os jornais pararam de circular e há guerra por comida e água limpa.

Segundo Shriver, a pandemia aumentou —e muito— as chances dessas calamidades se tornarem reais.
"Escrevi esse romance depois do susto que tive com a crise de 2008", diz. "Em 2021, o enredo tem maior probabilidade de se tornar vida real."

"Estou apavorada com o tipo de colapso fiscal mundial que poderemos ver nos próximos anos. Posicionei meu colapso ficcional em 2029, mas ele pode acabar virando só um atraso por engano."

Formada e pós-graduada pela Universidade Columbia, uma das mais prestigiosas instituições americanas, Shriver diz que pesquisou muito sobre economia antes de escrever "A Família Mandible” e se assustou com o que aprendeu. "Percebi o quão facilmente minha vida e as das pessoas com quem me importo poderiam virar o inferno se esses abstratos sistemas que a maioria de nós nem entende entrassem em colapso."

Agora, porém, a escritora diz que está muito mais ansiosa do que em 2008, e não vê o fim da crise tão perto. "Quero enfatizar os perigos de tantos países confeccionando grandes quantidades de moeda de uma vez, como resultado do sufocamento de suas economias, e levando potencialmente ao tipo de instabilidade econômica e colapso que descrevo em 'A Família Mandible'."

Aos 64 anos, Shriver é também autora dos best-sellers "Precisamos Falar sobre o Kevin", de 2007 –vencedor do Prêmio Orange– e "O Mundo Pós-Aniversário", de 2009, e já trabalhou como jornalista, com contribuições para veículos como os jornais The Guardian e The Wall Street Journal e a revista The Economist.

O hábito de ser uma consumidora voraz de notícias não mudou com a pandemia. "Faço flexões e abdominais em frente à TV, geralmente depois das 23h, quando paro de trabalhar.” Mas a temática que a dragou nos últimos meses foi uma só –o lockdown.

​"Minha posição sobre lockdown não é política", diz. "Mas o considero o maior erro político que já vi na minha vida." A escritora afirma defender a vacinação —e já tomou a primeira dose do imunizante da AstraZeneca— mas teme que os países, vez ou outra, lancem mão do lockdown para aplacar o avanço de novas crises. "Eu me preocupo de termos criado uma semipermanente neurose em torno da doença."

Com lockdown desde o início do ano, somado ao avanço da vacinação, o número de casos, mortes e hospitalizações por Covid-19 no Reino Unido despencaram, e Londres —a cidade onde vive Shriver— teve dias sem registrar uma única morte pela doença.

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