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Cinema

'First Cow - A Primeira Vaca da América' é um faroeste pelo avesso

Filme traz marca de Kelly Reichardt ao mostrar Estados Unidos numa versão inesperada, selvagem e banal

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First Cow – A Primeira Vaca da América

  • Quando Estreia nesta sexta (10)
  • Onde Nos cinemas e aluguel no Claro Now, Vivo Play, Oi Play, Apple TV, Google Play e YouTube Filmes
  • Classificação 12 anos
  • Elenco John Magaro, Orion Lee, Alia Shawkat
  • Produção EUA, 2019
  • Direção Kelly Reichardt

Kelly Reichardt é uma cineasta da persistência. É voltando a câmera a objetos insignificantes —ao menos na aparência— que ela espera pacientemente que eles se mostrem plenamente. E plenamente, no caso, não quer dizer que esses personagens ou suas vidas explodam numa riqueza inesperada. Não, as situações é que os enquadram, tanto quanto a paisagem.

Assim, em “First Cow” tudo começa com Cookie, cozinheiro que acompanha um grupo de candidatos numa corrida do ouro. Os conflitos são simples. Não há comida e Cookie é pago não só para cozinhar como para conseguir comida. Não é tarefa fácil. Buscando alimentos ele encontra King-Lu, chinês que veio fazer a América, mas se encontra agora foragido. Juntos, eles chegam ao forte onde se concentram garimpeiros e negociantes.

Tudo isso é importante, porque é o começo da história, mas nada disso é muito importante. Relevante mesmo é que estamos no estado americano de Oregon, segunda metade do século 19, pleno Velho Oeste, mas nada parece com o Oeste que conhecemos.

A vegetação é mesquinha, pouco graciosa, as pessoas não vivem em casas, mas em cabanas que poderiam ter inveja de nossas favelas. Ah, sim, existe o rio. Esse lembra as águas puras dos velhos faroestes.

Em suma, isso é um faroeste, mas não é. É um faroeste pelo avesso. Será preciso acompanhar Reichardt, pois ela busca captar com precisão o impreciso. E sem nenhuma pressa —bem menos do que seu anterior “Certas Mulheres”, de 2016, por exemplo.

A chegada da primeira vaca à região não é um acontecimento. Ela chega a distância, na balsa, pelas águas tranquilas do rio. Mas essa vaca mudará o rumo da história.

Por partes –King-Lu sabe que para alcançar a riqueza há duas formas, um milagre ou o crime. O crime parece uma boa solução. Se roubarem leite da vaca do principal negociante, poderiam fazer biscoitos doces. Cookie sabe fazer.

Então mãos à obra. Nada é excepcional. Nem mesmo o sucesso de vendas da dupla chega a constituir uma surpresa ou um evento (para o espectador). Com isso eles amealham uma pequena fortuna. Que fazer com ela? Ir para San Francisco e abrir um hotel?

Pode ser. Mas em breve. O pequeno empreendedor não é menos ambicioso, no fundo, do que o garimpeiro. E aí está o ponto principal da trama –o comerciante, o ferreiro, o vendedor de biscoitos.

Todos esses, enfim, que vão fazer o velho oeste —mesmo num lugar de raras vacas, portanto sem caubóis—, tanto quanto os garimpeiros, na visão de Reichardt, são menos aventureiros do que ambiciosos. Isto é, podem passar da busca desesperada pela sobrevivência à busca da riqueza. O crime é o menor dos problemas. Faz parte do negócio.

É assim, com enorme persistência, que a diretora busca encontrar, no vago, o preciso. É um filme para espectadores também persistentes, que possam conviver com roupas estropiadas, cabanas sórdidas e nem ao menos sombra de heroísmo. É um Velho Oeste pelo avesso.

Demoramos um pouco a nos acostumar com ele, assim como não é fácil, a princípio, se acostumar aos filmes dessa diretora. Os Estados Unidos que nos mostra, no presente ou no passado, é tão inesperado e selvagem quanto banal. Mas a banalidade é algo que cabe ao cinema mostrar, embora o faça menos do que seria desejável —nos Estados Unidos da Marvel em particular.

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