Museu da música baiana vai do samba ao hip-hop atual, passando por Gil, Gal e axé

Instituição, que abre as portas no fim do mês, propõe uma viagem sonora pelo liquidificador de referências de Salvador

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Salvador

Os versos de Gregório de Matos se transformam em hip-hop na voz de Vandal, um dos mais respeitados rappers da cena musical da Bahia. A batida afro do Ilê Aiyê se une ao groove arrastado de Igor Kannário para representar a música do bairro da Liberdade, símbolo da resistência negra em Salvador.

Os ijexás que são trilha sonora da lavagem do Bonfim encontram a guitarra baiana de Dodô e Osmar em um passeio virtual pela Cidade Baixa. O Campo Grande dos trios elétricos entra em simbiose com a Orquestra Sinfônica da Bahia, que tem sua base no Teatro Castro Alves.

O novo museu Cidade da Música de Salvador é um liquidificador de referências. Com inauguração prevista para 29 de julho, ele propõe uma viagem visual e sonora para contar a história da música da Bahia, de seus principais ícones a artistas da cena contemporânea, do rap ao arrocha.

“A nossa ideia é fazer do museu um espaço inclusivo. Temos aqui a história clássica, a história a ancestralidade, dos grandes nomes, mas também incluímos a turma que está fazendo música hoje e que vem das periferias”, afirma o arquiteto e cenógrafo Gringo Cardia, curador do museu.

Museu Cidade da Música da Bahia será inaugurado em 29 de julho ( Foto: Igor Santos / Prefeitura de Salvador )

A reportagem visitou nesta segunda-feira o museu, que funcionará na Casa dos Azulejos Azuis, prédio histórico tombado em 1969 pelo Iphan e recuperado pela prefeitura com investimento de R$ 24 milhões. Outros R$ 8 milhões foram aplicados na concepção do museu.

Sua localização é estratégica. Fica na Cidade Baixa, ao lado de outros dois pontos turísticos da cidade, o Mercado Modelo e o Elevador Lacerda.

O acervo do museu é 100% audiovisual e mescla vídeos históricos, imagens contemporâneas e depoimentos que formam um mosaico perpassando os principais nomes e movimentos musicais de destaque na Bahia.

Com restrições relacionadas à pandemia, o museu foi pensado em um formato no qual o visitante escolherá o conteúdo a que assistirá a partir do próprio celular, evitando toques nas telas do museu e o uso de fones de ouvido compartilhados.

Responsável pela pesquisa e concepção do conceito do museu, o antropólogo Antonio Risério define a Cidade da Música como uma espécie de viagem pela capital baiana através da música.

“O museu é uma aula sobre Salvador tendo a música como trilha sonora. Para a população local, ele reforça um sentimento de pertencimento. Para quem é de fora, é uma forma de conhecer o que é a cidade”, diz Risério, que também atuou na concepção do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo.

No primeiro pavimento do museu Cidade da Música, o visitante faz uma espécie de passeio visual pelos principais bairros de Salvador, com vídeos com cerca de 20 minutos sobre 27 regiões da cidade e a suas relações com a música.

Ali, é possível saber mais sobre o samba junino do Tororó, o samba de caboclo da Lapinha, o pagode da Capelinha de São Caetano, os trios elétricos que desfilam pelo Campo Grande ou dos Filhos de Gandhy, afoxé que inicia o seu desfile no Pelourinho. “Mais do que contar apenas a história de Dorival Caymmi, queremos contar a história da Itapuã de Caymmi”, diz Antonio Risério.

O segundo pavimento é destinado a contar a história da música de Salvador em vídeos veiculados em cabines para até três pessoas. Os vídeos que resgatam a trajetória de nomes desde Xisto Bahia, baiano que compôs “Isto É Bom”, primeira música gravada no Brasil, até movimentos musicais contemporâneos, passando por ícones baianos como João Gilberto, Gilberto Gil e Gal Costa.

Um dos vídeos conta história de Raul Seixas na Bahia, desde a infância, quando ele imitava Little Richard, até os shows com Os Panteras no Cine Roma. Também há videos sobre os Novos Baianos, Tom Zé e sobre os Tincoãs, passando por movimentos musicais como o forró e a sofrência.

No mesmo andar, ainda há duas salas imersivas. A primeira, desenvolvida em parceria com a Orquestra Sinfônica da Bahia, é dedicada a apresentar de forma didática o funcionamento da orquestra regida pelo maestro Carlos Prazeres. Cada instrumento e as suas especificidades são explicados pelos músicos, que se unem ao final para tocar a peça "Maracatu de Chico Rei", do compositor brasileiro Francisco Mignone.

A sala ao lado, com luzes néon e clima de casa noturna, veicula videoclipes de 150 artistas contemporâneos da periferia de Salvador. A curadoria foi feita pelo rapper Vandal, que atua como uma espécie de artista-residente do museu Cidade da Música.

O terceiro pavimento do museu é dedicado a experiências. São três cabines de som, uma delas dedicada especificamente ao hip-hop, onde os visitantes terão o seu karaokê particular em um cardápio de músicas de artistas baianos. A performance poderá ser gravada e disponibilizada em formato videoclipe para quem arriscar soltar a voz e quiser levar uma lembrança para casa.

Outras duas cabines são dedicadas à mixagem, uma delas específica de percussão. Ali, o visitante poderá desconstruir as bases das músicas e fazer suas próximas experiências musicais.

O museu ainda abriga um estúdio de gravação que será usado por músicos em ascensão na cena local. Seis artistas da periferia de Salvador já foram selecionados e fizeram no local as primeiras gravações.

“A música sempre foi o principal cartão de visita da nossa cidade. Por isso, queremos que o museu sirva não só para resgatar nossa música, mas também seja um centro de formação para toda a cadeia do entretenimento”, disse a este repórter o prefeito de Salvador, Bruno Reis, do DEM.

A ideia, diz, é que o museu seja o primeiro passo para um complexo destinado à música e ao audiovisual na região da Cidade Baixa. A prefeitura tem planos de usar um casarão e um terreno no fundo do museu para erguer um uma sala de espetáculo e um prédio de estúdios, um centro de pesquisa sobre música e uma escola de formação de técnicos para música e espetáculos.

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