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'Dodgeball Academia' traz queimada junto a salada de referências

Espirituoso, jogo de estúdio paulista usa elementos da cultura pop japonesa em escola dedicada à brincadeira

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Dodgeball Academia

  • Onde PC, Xbox (Game Pass), PlayStation e Switch
  • Preço R$ 69,99 a R$ 104,90
  • Classificação Livre
  • Estúdio Pocket Trap
  • Publicadora Humble Games

O game brasileiro "Dodgeball Academia" se vale da falta de formalidade do jogo de queimada para destilar antropofagia. Aproveita a brincadeira para compor uma narrativa com livre trânsito por culturas estrangeiras sem deixar de lado elementos locais.

A queimada —chamada de "dodgeball" em inglês, e conhecida como "caçador" em algumas cidades da região Sul— é um gerador de hematomas nos recreios escolares do Brasil. As regras variam, mas o objetivo é sempre eliminar os integrantes da equipe adversária com boladas.

A Electronic Arts, dona de robusto catálogo de títulos esportivos, fez sua incursão na queimada no ano passado com "Knockout City". O game manda às favas o realismo para colocar jogadores competindo em locações retrofuturistas.

Assim como o jogo da EA, "Dodgeball Academia" tem clima distendido e fantasioso, mas as comparações param por aí. O foco do jogo do estúdio paulista Pocket Trap é na história, com cara de animação americana e coração japonês. "Só me interessa o que não é meu", diz o "Manifesto Antropófago".

O protagonista é Otto, uma criança que à revelia dos pais se matricula na melhor escola de queimada. Otto é jovial feito os personagens dos animes mais populares. É como se o Luffy de "One Piece" fosse para uma Hogwarts da bola em um universo com clima de "Pokémon".

Se nos jogos de Pikachu tudo gira em torno dos monstros de bolso, na produção brasileira a obsessão é a queimada. Uma discussão banal sobre ketchup ou abacaxi na pizza é resolvida (claro) na quadra.

Ao longo de seus oito episódios de pouco mais de uma hora cada, "Dodgeball Academia" apresenta um corolário de absurdos envolvendo um elenco fixo de personagens. É curioso acompanhar o desenvolvimento dos colegas de Otto.

As piadas de "Dodgeball" estão nos diálogos espertos. Vão do tom ameno de paródia à Turma da Mônica (console Bolastation 7 da Bolatendo) às ironias de rede social (o neoliberalismo da Tia da Cantina seria digno de um cancelamento). Por mais que não acerte em cheio na maior parte dos casos, sedimenta uma ambientação com alegria, que "é a prova dos nove", conforme Oswald de Andrade.

O enredo é consciente das patetices, ri de si e dos clichês das fontes de inspiração. Uma personagem, por exemplo, gosta de manter uma adversária por perto para constituir uma rivalidade digna de "mangá de esporte", um subgênero dos quadrinhos japoneses.

O game fica na prateleira dos RPGs leves, ao estilo de "Paper Mario". Propõe um sistema de compreensível e engajante, sem firulas, algo que a Nintendo não entrega desde 2004. Se em "Paper Mario: The Origami King", lançado no ano passado, as lutas enjoam, o jogo brasileiro se mantém ventilado do começo ao fim. A exigência de um tempo exato para defender, a variedade de personagens, habilidades especiais e arremessos renova cada partida de queimada.

Uma vantagem de "Paper Mario" são os cenários, carregados de surpresas, um deslumbramento ininterrupto. Com menos recursos, "Dodgeball" repisa suas ambientações sem explorar por completo as movimentações de Otto. O protagonista pula, dá cambalhota, arremessa bolas, mas há raras possibilidades significativas de uso disso.

Sozinho, o cenário é entediante, com modelagem tridimensional rudimentar. Porém, ao ser somado aos personagens de cores vivas forma um feliz casamento de fundo e figura, o que confere ao jogo um estilo marcante.

Um recurso digno de virar padrão internacional é o chamado modo de aprendizado.

Essa ferramenta coloca legendas de diversas línguas com o simples apertar de um botão. Dá para ler que "coxinha" virou "mini chicken pie" em inglês e "kleine hühnerpastete" em alemão. Os brasileiros nostálgicos da época em que o ensino de idiomas era imposto goela abaixo nas locadoras não tem mais do que reclamar.

Distribuído pela americana Humble Games, "Dodgeball Academia" compõe uma onda de jogos nacionais independentes com fôlego para disputar os holofotes mundiais. Títulos como "Tetragon", "Unsighted" e "Spacelines from the Far Out" celebram o multiculturalismo, uma execução do "Manifesto Antropófago" na cultura digital. Está aí o que você queria, Oswald.

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