Descrição de chapéu Livros

Veja como fotógrafos fizeram para transformar escritores em imagens icônicas

De Laerte a Gay Talese, livros reúnem fotos de gerações que marcaram literatura e quadrinhos

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Matheus Lopes Quirino
São Paulo

Paulo Vitale e Renato Parada estão bem na foto. Retratistas ligados na efervescente cena cultural brasileira, eles reúnem em seus novos livros nomes de peso.

Escritores como Victor Heringer, Daniel Galera e Amara Moira posaram para Parada. Nas artes gráficas, os cartunistas deste jornal João Montanaro e Estela May são jovens talentos que dividem o panteão com veteranos, como Jaguar, Mauricio de Sousa e Laerte, que também publica suas tirinhas na Folha, para o livro de Vitale.

Parada parece não acreditar na própria sorte. Ele ri quando é questionado sobre o processo criativo do livro, como se a impressão fosse um alívio. “Enfim, ficou pronto! Foi um trabalho que começou despretensiosamente e ganhou corpo”, diz o fotógrafo, que traz de nomes consagrados aos contemporâneos.

“Imagens da Literatura” atravessa uma década próspera na cena literária, com a popularização de autores experientes, como João Silvério Trevisan, que expandiu seu público com as redes sociais.

“Meu processo tem como pano de fundo uma admiração pela criação literária de cada autor, da capacidade de cada autor de ver o mundo de uma maneira diferente da nossa experiência do dia a dia, por isso busco algo parecido no meu trabalho, de ter uma voz, uma visão que sai um pouco do padrão, do comum”, afirma Parada, que traz em seus retratos o íntimo de cada um dos autores.

Ele realça uma careta de José Ramos Tinhorão, marcado pela casmurrice, e a descontração de um Antonio Candido bem acomodado em seu sofá.

“Cada um tem uma individualidade muito própria também, e essa é uma inspiração automática. Eles têm grandes conteúdos e esse conteúdo de certa forma fica marcado na superfície de seus rostos e de suas expressões”, completa Parada.

Tudo começou com a panelinha de escritores que orbitavam a Mercearia São Pedro, no coração da Vila Madalena, parada da boemia literária paulista. No livro, um Daniel Galera novinho, de casaco esportivo, pensativo, divide espaço com uma ousada Ivana Arruda Leite, que gargalha sentada de pernas cruzadas, de blusinha e All Star.

Figurinhas carimbadas no metiê também passam pelas páginas do livro —de gente que ganhou visibilidade recentemente, como Natalia Timerman, autora do recém-lançado “Copo Vazio”, a lendas vivas, como o jornalista Gay Talese, que faz pose ao lado de um ponto de táxi. Nada mais Gay Talese do que uma foto em um ponto de táxi, no calor brasileiro, com ele trajando os característicos terno da Brooks Brothers e chapéu.

Em diferentes momentos da carreira, tanto Parada quanto Vitale precisaram rever suas oportunidades.
Vitale, que vinha do mundo editorial, sentiu o impacto do declínio das grandes editoras e resolveu investir em projetos autorais.

Em 2018, com o lançamento de “Feito no Brasil”, ele contou a história de 50 personalidades marcantes do país, lista eclética que vai de Pelé a Hermeto Pascoal e a chef Helena Rizzo.

Fotografando na Cidade do Panamá, Vitale deu entrevista por telefone e contou sobre o projeto do livro dos cartunistas, que está em sua fase final de desenvolvimento.

“Eu selecionei cem nomes a partir de uma curadoria. São personalidades nem sempre conhecidas, mas que fazem parte da cultura de quem lê jornal”, explica. “Cartunistas”, nome provisório do livro, é um trabalho essencialmente divertido, que solidifica sua trajetória recente na fotografia autoral.

“Meus registros fotográficos são amadores e não deixam de ser uma ‘ego trip’. Ser fotografado por um profissional é outra história. É alguém de fora vendo algo em você”, afirma o cartunista Adão Iturrusgarai, que publica neste jornal e que foi fotografado de forma remota, direto de sua casa no interior da Argentina.

“Paulo dirigiu minha filha Olivia, que foi fazendo os cliques conforme suas orientações, usando um aplicativo”, explica. A técnica foi usada com outros personagens que não poderiam ir ao estúdio em São Paulo, um trunfo em época de barreiras sanitárias.

“Muitos não sabiam que era possível tirar foto assim. O resultado surpreendeu”, diz Vitale. “Eu usei o fundo branco para pôr os cartunistas em papel de vítimas. Logo eles, que são tão críticos da sociedade.”

Observadores sagazes do cotidiano, Jaguar e Fausto trazem consigo elementos que aludem à visão. Do traço arredondado de Fausto, Vitale usa um olho desenhado para representar uma espécie de lupa, enquanto Jaguar manipula uma delas, devidamente envelhecida e com a lente trincada.

“Eu costumo fazer uma pré-entrevista com todos, justamente para chegar em um conceito que dê para pinçar a cereja do bolo de cada um”, diz Vitale.

Enquanto Natalia Forcat posa com um vestido de papel com traços de remendo, com um dos seios cobertos pela imagem de um alvo, Luli Penna rói as unhas de um manequim. Mauricio de Sousa, primeiro fotografado de Vitale, não perde tempo e começa a esboçar o dinossauro Horácio em frente à câmera. Cau Gomez faz malabarismo e Laerte, intersecção nos dois livros de fotografia, aparece em uma penteadeira.

“Eu procurei realçar a personalidade dos cartunistas, apelar para traços muito característicos, fazer trocadilhos e inflar marcas que os tornaram quem são”, diz Vitale sobre o processo de concepção das fotografias.

A fim de compreender um determinado recorte da massa cultural do país, os fotógrafos precisaram se adaptar a novos tempos. Parada já colocou o livro na praça em seu site. “A fotografia foi a bala de prata na minha vida”, conclui.

Imagens da Literatura

  • Preço R$ 200 (160 págs.)
  • Autor Renato Parada
  • Editora IpsisPub
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