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'Porco de Raça', de Bruno Ribeiro, é melhor do que muitas séries da Netflix

Livro vencedor do Prêmio Machado, da editora Darkside, mistura entretenimento com denúncia social

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Porco de Raça

  • Preço R$ 49,90
  • Autoria Bruno Ribeiro
  • Editora Darkside (192 págs.)

A influência da linguagem cinematográfica na literatura é tão poderosa que, para certos romancistas, constitui ofensa grave afirmar que seus livros dariam filmes excelentes. É como se dissessem que eles fizeram tudo errado.

Há aqueles que não se importam com a sugestão e, se pudessem, eliminavam uma etapa criativa, escrevendo direto para o cinema. Desde que recebessem um bom dinheiro não só pelo roteiro como também pelo argumento. Os dois lados devem ter razão.

Vencedor do prêmio Machado, da editora Darkside, "Porco de Raça" é um romance que mistura entretenimento e denúncia social, bem esquematizado e desenvolvido, na linha da literatura brutalista de Rubem Fonseca. Seu autor, Bruno Ribeiro, publica desde 2014, se dedicando à ficção especulativa e aos gêneros fantasia e terror. É também roteirista.

capa de livro
Capa de 'Porco de Raça', romance de Bruno Ribeiro publicado pela editora Darkside - Marcinha Lima/Divulgação

"Porco de Raça" é melhor do que muitas séries exibidas na Netflix. No entanto, o leitor tem a impressão de que não está lendo, e sim acompanhando os episódios de uma produção do streaming. A semelhança direta está no enredo, que lembra o recente fenômeno "Round 6", a série coreana que, dizem, se transformou na mais vista da história.

O protagonista, um professor negro e desempregado, é capturado para lutar até a morte num ringue com piso de areia e fechado com grades nas quais estão penduradas facas e porretes. Máscaras de animais resguardam a identidade dos lutadores. Do outro lado da gaiola, homens de terno berram e exibem notas de dinheiro das apostas. Você já não viu isso antes?

O grande conflito da história, entretanto, se dá fora dos ringues. Reúne dois irmãos "quase gêmeos". Um deles é o nosso sobrevivente na selva, para quem "o Brasil acabou em 2012". O outro é o filho que deu certo, que cortou e alisou o cabelo, "e assim foi seguindo uma carreira de sucesso, rumo ao Senado, rumo à presidência de estatais, rumo à riqueza". "Abaixando a cabeça e levantando na hora certa. Um chacal preto."

"Os fracos do mundo não costumam bater, mas aprendem desde cedo a apanhar." As primeiras linhas do romance descrevem uma fuga paranoica pela zona sul do Rio de Janeiro –belo cenário de hordas de miseráveis ocupando as ruas, ideal para o impacto de uma abertura de série.

Tudo é visual. Com bruta ressaca de álcool e drogas, o narrador em primeira pessoa não sabe do quê ou de quem está fugindo. Da prostituta e do cafetão para os quais deve dinheiro? Da vizinha que aparece na hora agá e lhe dá carona num Eco Sport vermelho até o Leblon? Do homem que se esconde de seitas evangélicas e encomenda a ele o exorcismo da filha morta? Ou dos dois policiais, o Cruz e o Souza, a quem ele ajuda a desenterrar o cadáver de um gafanhoto gigante que começa a se mover? Não deixe de assistir ao próximo capítulo.

Detalhe –na fuga, o personagem usa um sobretudo. Estaria fazendo todo esse frio no Rio ou seria apenas uma dica para compor o figurino?

O autor escolhe ótimas epígrafes. Esta com os versos simbolistas de Cruz e Souza –"Porco lúgubre, lúbrico, trevoso/ Do tábido pecado/ Fuçando colossal, formidoloso/ Nos lodos do passado". E a melhor de todas, de autoria de Maguila, o pugilista peso-pesado –"a única coisa que me incomoda é falta de respeito; se me desrespeitam, eu sento a mão na orelha mesmo".

Erramos: o texto foi alterado

O autor do livro é Bruno Ribeiro, e não Pedro Ribeiro, como identificado incorretamente em versão anterior deste texto.

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