Quem é Zé Henrique de Paula, que tem várias peças em cartaz no pós-pandemia

Diretor, figurinista e cenógrafo agora mergulha na dramaturgia para resgatar o valor do seu ofício

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Enquanto entra no escritório do teatro do Núcleo Experimental, o diretor Zé Henrique de Paula fala a esta repórter para não reparar na bagunça. "Aqui é igual ao teatro." Pelo cômodo, elementos como cadeiras penduradas na parede e figurinos de peças encenadas marcam o caráter multifacetado de seu teatro —além de dirigir, é também cenógrafo e figurinista.

Os espetáculos estão enfim voltando aos palcos com público presencial, e um dos nomes responsáveis por lotar a programação cultural da cidade é o de Zé Henrique de Paula. Com três peças em cartaz e várias outras que estavam online ou em curta temporada, ele retoma projetos represados pela pandemia, momento que o fez questionar o seu ofício e se jogar de cabeça na dramaturgia com "Cartografia dos Humores Paulistanos (Parte 1 - Centro)", em cartaz no teatro do Núcleo Experimental, sua companhia.

Um homem sentado de lado em uma cadeira, com os braços apoiados no encosto
O diretor, cenógrafo, figurinista e dramaturgo Zé Henrique de Paula - Divulgação

Foi na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo que ele se encantou por essa arte milenar. Na época, ele era estagiário de J.C Serroni, um dos principais cenógrafos e figurinistas do país, que colaborou durante anos no Centro de Pesquisas Teatrais, ou CPT, de Antunes Filho. Ele foi absorvendo todo o conhecimento que aquele espaço exalava, enquanto montava maquetes e escutava os ensaios comandados por Antunes Filho.

Ao longo do tempo foi se especializando, com pós-graduação em artes cênicas e mestrado em direção teatral. Mas, num ofício gregário como o do teatro, De Paula levou um tempo para achar a sua turma —até que, ao lado de Inês Aranha, que cuida da atuação, e de Fernanda Maia, o pilar musical do grupo, ele montou sua companhia de teatro, o Núcleo Experimental, há mais de 16 anos.

"Você vai trabalhando com algumas pessoas e percebe que as linguagens se casam, não necessariamente que elas são harmônicas, porque um pouco de faísca, de risco na relação artística, é sempre bom", diz o diretor.

Segundo ele, se tudo estiver muito encaixado, então isso é sinal de que algo não está funcionando da maneira como deveria. É uma das frases que sempre usa. "Você sempre precisa ter um pouco de medo do que está fazendo", diz, lembrando algo que aprendeu com a atriz Denise Weinberg.

Essa comodidade talvez tenha sido o motor para ele buscar novos desafios na carreira e resgatar o valor daquilo que escolheu como profissão, e que achava que tinha acabado.

"Todo mundo na pandemia passou por um momento em que estava se questionando. Tenho muitos colegas da área de teatro que acharam que a atividade ficou sem sentido quando migrou para o online", afirma. Assim, com tempo e disposição, ele resolveu se lançar na dramaturgia autoral.

Mesmo tendo adaptado o romance "Revolução dos Bichos", de George Orwell, para o teatro, com "Cabaret dos Bichos", De Paula queria fazer a dramaturgia, e essa muito autoral, da sua voz, "como pessoa que está vivendo aquilo e que está sendo colocada em xeque em muitos dos seus valores, a partir da sua profissão".

"Cartografia dos Humores Paulistanos (Parte 1 - Centro)" nasce a partir do choque que uma reportagem de 2015 causou nele, trazendo uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde sobre a saúde mental nas 20 principais metrópoles do mundo. São Paulo teve os piores índices. Numa espécie de materialização desses dados, ele criou um personagem que odeia morar na cidade e que encara a solidão e uma possível loucura.

"A cidade é um pouco hostil com seus habitantes, e essa hostilidade urbana agudiza certos problemas de saúde mental", diz. Foram selecionados três personagens escritos por De Paula nessa primeira parte.

São monólogos que mergulham nas características dos personagens em uma quase tragicomédia. Essa característica também pode ser vista na outra peça que ele dirigiu no Núcleo Experimental, "É Sempre Mais Difícil Ancorar um Navio no Espaço", escrita por Davi Novaes. Outros espetáculos que ele dirige e estão em cena são "Assassinato para Dois", de Kellen Blair e Joe Kinosian, e "Sede", no Tucarena.

De Paula também dirigiu "Medea", no Sesc Pompeia, a convite da Cia. do Sopro. O espetáculo foi filmado em outubro deste ano e recebeu o público presencialmente no final de novembro, contemplando uma versão final do clássico de Eurípedes, escrito pelo britânico Mike Bartlett. O clássico do teatro grego é adaptado para discutir as condições da mulher nos dias de hoje a partir de Medea, que está em depressão, do marido, Jasão, que a deixou por outra mulher mais jovem e de seu filho, Tom, que perdeu a fala.

Ele também dirige o musical "Brenda Lee e o Palácio das Princesas", que conta conta a história da travesti que se tornou um marco na luta por direitos LGBTQIA+ no Brasil e que ficou em cartaz no canal de YouTube da companhia. No próximo ano ela ganha adaptação para o presencial e marca um dos espetáculos na agenda do encenador no primeiro semestre de 2022, que também conta com uma ópera e outros musicais internacionais.

Quando aceitou fazer e direção de "Benda Lee", ao lado de Fernanda Maia na direção musical, pensou na transfobia, algo que o deixa com raiva, e que esse é um dos sentimentos que dá combustível a ele no teatro.

"Eu gosto de fazer teatro a respeito de coisas que me deixam com raiva. A gente ainda tem essa possibilidade e ela é importante", diz. Ele se alimenta desse pensamento, que tirou do dramaturgo David Hare. "Tem muita coisa errada acontecendo, tem muita coisa que deixa a gente com raiva da porta do teatro para fora e são dessas coisas que a gente tem vontade de falar."

Mesmo no aperto, sem dormir e pensando em como vai pagar o aluguel do galpão em que sua companhia trabalha, De Paula fala com convicção de que o teatro "é uma atividade essencial e não supérflua".

Sede

  • Quando Sáb. (11), às 20h; dom. (12), às 18h
  • Onde Tucarena - r. Monte Alegre, 1024, Perdizes
  • Preço R$ 35 a R$ 70

Assassinato Para Dois

  • Quando terças e quartas - até 08/12
  • Onde Teatro das Artes - av. Rebouças, 3.970, Pinheiros, zona oeste
  • Preço entre R$ 35 e R$70
  • Autor Kellen Blair e Joe Kinosian
  • Elenco Thiago Perticarrari e Marcel Octavio
  • Direção Zé Henrique de Paula
  • Link: https://bileto.sympla.com.br/event/69673/d/113729/s/668236

Sede

  • Quando Sáb. (11), às 20h; dom. (12), às 18h
  • Onde Tucarena - r. Monte Alegre, 1024, Perdizes
  • Preço R$ 35 a R$ 70
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.