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Livros Rússia

Em 'Os Últimos Czares', intimidade dos Románov ofusca fatos históricos

Para autor do livro, fracasso do comunismo na Rússia pode ser a chave para entender o saudosismo do czarismo

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Os Últimos Czares – Uma Breve História Não Contada dos Románovs

  • Preço R$ 40 (280 págs.)
  • Autor Paulo Rezzutti
  • Editora LeYa

"Os Últimos Czares" é o título tanto de um recém-lançado livro de Paulo Rezzutti quanto de uma série de 2019 da Netflix. Muito mais interessados nas vidas privadas do que nas personalidades históricas, ambos focam o último monarca russo, Nicolau 2º, e sua família, desde sua ascensão ao trono até a bárbara execução sumária pelos bolcheviques.

Em um e outro, fontes anglo-saxônicas predominam largamente sobre as russas. Na telinha, o astro é o britânico Simon Sebag Montefiore, que veio à Flip em 2018 e teve vários livros publicados no Brasil, nos quais trata a realeza russa com o mesmo misto de gosto pelo escândalo e sensacionalismo que fez a fama internacional dos tabloides de seu país. Montefiore também consta da bibliografia da obra de Rezzutti, que, contudo, se revela bem mais sóbrio do que seu colega inglês.

Se a série da Netflix esbalda-se em cenas de sexo entre Nicolau e sua mulher, Alexandra, e também se delicia com as orgias da eminência parda da corte, o místico Grigóri Rasputin, o livro do escritor brasileiro prefere não adentrar a alcova dos Románov. Rezzutti, contudo, não resiste a redigir um longo parágrafo especulando sobre o paradeiro do órgão sexual de Raspútin após seu assassinato.

Em ambos, ainda, é dedicado bastante espaço ao fuzilamento dos Románovs pelos bolcheviques, bem como à ocultação de seus corpos e aos vários impostores que, ao longo de décadas, se apresentaram como membros sobreviventes da família real. Se a série da Netflix claramente responsabiliza Lênin pelo massacre, Rezzutti, mais cuidadoso, afirma que o Soviete dos Urais (que efetivamente levou a cabo a chacina) "enviou uma mensagem para Moscou pedindo autorização para a execução, mas não existe registro de se houve ou não uma resposta".

De qualquer maneira, a prioridade do livro, muito mais do que os fatos históricos, é a intimidade dos Románov: sua árvore genealógica, os parentescos com as demais casas reais europeias, seus apelidos, os afetos e intrigas familiares, a descrição minuciosa de suas rotinas. Um capítulo inteiro é dedicado, por exemplo, aos ovos de Fabergé, joias que se tornaram símbolo e fetiche daquele período. Há ainda um longo parágrafo dedicado ao "mais maravilhoso" dos eventos grandiosos promovidos pelo casal real: um baile à fantasia em 1903, no qual "os 390 convidados compareceram em trajes da corte russa do século 17".

E assim por diante. Aprendemos, por exemplo, que todas as princesas Románov "usavam perfumes Coty, embora cada uma preferisse uma fragrância". Ou que o príncipe herdeiro "possuía um gato cinzento cujas unhas brancas haviam sido removidas para não correr o risco de machucá-lo, e um burro de estimação chamado Vanka, que puxava a carroça para o menino e sabia vários truques", embora seu companheiro constante fosse "um cão cocker spaniel branco e castanho chamado Joy".

No final do livro, Rezzutti concede que o glamour das fotos de Nicolau "não mostra o czar inseguro e vacilante com dificuldade para tomar decisões". Para o autor, "o fracasso da experiência social de um regime que acabou por se revelar tão corrupto, sangrento e despreparado como o czarismo pode ser a chave para se entender por que o saudosismo de uma era repleta de pompas, luxos, joias e riquezas incalculáveis povoa, até hoje, o sonho das pessoas".

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