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Cinema

'Ambulância: Um Dia de Crime' traz Michael Bay atrás de herói perdido

Diretor retorna à falência do sonho americano para apontar futuro de esperança com sequência de ação

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Matheus Fiore

Ambulância: Um Dia de Crime

  • Onde Nos cinemas
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Jake Gyllenhaal , Yahya Abdul-Mateen 2º, Eiza Gonzalez
  • Direção Michael Bay

Michael Bay já abordou a sociedade americana sob diversas perspectivas ao longo de sua carreira. Um de seus grandes momentos é em "Sem Dor, Sem Ganho", obra que estuda a falência do sonho americano. Em "Ambulância: Um Dia de Crime", o diretor retorna à temática com um novo recorte, trabalhando com arquétipos quebrados em um país falido para, surpreendentemente, apontar um futuro esperançoso ao reconstruir esses arquétipos.

O filme se desenvolve a partir de uma premissa básica do gênero ação –um homem íntegro precisa de dinheiro e aceita manchar seu currículo emprestando suas habilidades para o crime. O sujeito em questão é o veterano de guerra Will Sharp, papel de Yahya Abdul-Mateen 2º, que precisa pagar uma operação para sua mulher e, por isso, embarca em um grande assalto a banco com seu irmão, Danny, vivido por Jake Gyllenhaal.

Yahya Abdul-Mateen 2º e Jake Gyllenhaal em cena do filme 'Ambulância - Um Dia de Crime', de Michael Bay
Yahya Abdul-Mateen 2º e Jake Gyllenhaal em cena do filme 'Ambulância - Um Dia de Crime', de Michael Bay - Divulgação

É claro que tudo dá errado, e a dupla logo se encontra fugindo da polícia em uma ambulância, levando como reféns a paramédica Cam, papel de Eiza Gonzalez, e um policial ferido.

Com a estrutura de perseguição apresentada, Bay desenvolve um filme que está em constante reinvenção. É estabelecido um princípio de destruição criativa, no qual grandes cenas de perseguição, com colisões e explosões, existem para limpar a narrativa e gerar espaço para novas ideias.

As grandes sequências sempre existem para, posteriormente, a trama introduzir novos personagens e núcleos, que chegam para tornar o filme mais complexo, mesmo que, moralmente, fique mais objetivo.

"Ambulância" não é um filme inovador, mas mostra um cineasta bastante consciente de sua arte –ao ponto de referenciar diretamente dois outros longas de sua carreira, "A Rocha" e "Bad Boys"– e interessado em expandir sua própria estética. Ame ou odeie, mas uma característica típica de Michael Bay é que, como poucos cineastas de blockbusters, ele sabe o que está fazendo com uma câmera.

Em "Ambulância", o cineasta não se furta de explorar novas formas de imprimir intensidade na ação. Nos dias de hoje, é muito bem-vindo assistir a um diretor que não trabalha apenas com efeitos digitais. Em vez disso, Bay procura ampliar suas possibilidades com drones, para que a ação seja, em vez de farsesca, mais palpável e o espectador possa se aproximar sempre da ação.

A proposta funciona já que a lógica de destruição para recomeço abre espaço para que os próprios personagens sejam reconstruídos. Se no começo Will e Danny estão com suas armas apontadas para a polícia, o clímax envolve um desentendimento com criminosos poderosos. Se na cena de apresentação de Cam a paramédica choca um colega por não demonstrar preocupação com uma menininha cuja vida salvou, no fim, ela parece ter incorporado totalmente o perfil de profissional da saúde que põe a vida de terceiros em primeiro lugar.

É como se Bay constatasse que, num país falido como a América (o herói de guerra que não consegue nem sequer um emprego é a representação máxima dessa falência), essas figuras arquetípicas estivessem afastadas de suas próprias mitologias. Um dia de viagem por Los Angeles com direito a muita destruição bastou para que esses personagens pusessem em crise suas escolhas e, enfim, reincorporassem os ideais que representam.

Em dado momento, Will e Danny discutem sobre o que fazer para continuar seu plano. Danny, então, diz que não há heróis nem vilões na história, porque a realidade é mais complexa do que isso. Mas, em contraste com o personagem, o que Bay parece interessado em explorar não é uma desconstrução do heroísmo ou da vilania –e sim contradizer Danny e reafirmar esses arquétipos. Segundo Bay, heróis e vilões existem, e seus ímpetos bons e maus só estão sendo afetados pela crise que o país vive.

É interessante constatar que esse resgate dos arquétipos só é possível quando a cidade está devastada. Parece ser necessário desconstruir (e destruir) totalmente um dos mais simbólicos núcleos culturais e econômicos dos Estados Unidos para que, superadas as aparências, heróis e vilões possam voltar a mostrar suas caras. E não há nada mais típico de Michael Bay do que fazer essa revelação de caráter explodindo tudo que há no caminho.

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