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Filme que Mario Frias chama de pedófilo deve sair do streaming, decide governo

'Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola' está no centro de cruzada bolsonarista

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São Paulo

Os serviços de streaming devem suspender imediatamente a exibição do filme "Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola", sob pena de multa diária de R$ 50 mil caso descumpram a decisão. A determinação veio da Secretaria Nacional do Consumidor, em conjunto com o Ministério da Justiça e da Segurança Pública, e foi publicada no Diário Oficial da União desta terça-feira.

O longa que tem Fábio Porchat e Danilo Gentili no elenco está no centro de uma cruzada bolsonarista, encampada pelo secretário especial da Cultura, Mario Frias, e pelo deputado André Fernandes, que acusam o filme de pedofilia e apologia do abuso sexual infantil.

Cena de 'Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola' - Divulgação

Lançado há cinco anos nos cinemas e disponível no catálogo de diversos serviços de streaming há poucas semanas, a comédia tem uma cena em que o personagem de Porchat pede que duas crianças que o masturbem. Os garotos reagem com surpresa, negando o pedido.

"O que é isso, preconceito nessa idade? Isso é supernormal, vocês têm que abrir a cabeça de vocês", diz o personagem interpretado por Porchat, que em seguida abre a braguilha da calça e puxa a mão de um dos meninos em direção a ela.

A classificação indicativa do longa foi sancionada pelo Ministério da Justiça durante o governo Temer, em 2017, mas se enquadraria nas determinações da pasta publicadas no governo Bolsonaro. De acordo com os manuais usados pela indústria audiovisual, disponíveis no site do ministério, conteúdos em que há a indução ou atração de alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual não são recomendados para menores de 14 anos. Cenas com atos de pedofilia não são recomendadas para menores de 16 anos.

Porchat disse, por meio de sua assessoria, que não vai comentar a decisão do governo.

Nesta segunda, o ministro da Justiça, Anderson Torres, chamou o filme de asqueroso e afirmou que tomaria providências. Sua colega Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, disse que pediu à Secretaria dos Direitos da Criança e do Adolescente que tome as medidas cabíveis em relação ao longa.

Depois da polêmica, o filme entrou na lista dos mais vistos na Netflix, na 4ª posição.​

Cris Olivieri, advogada consultora para arte e cultura, reforça que a classificação indicativa do filme foi chancelada pelo Ministério da Justiça e que a alternativa, talvez, seria elevar a recomendação para 16 anos, mas não impedir o longa de ser exibido.

"Da maneira que está sendo feito, está se querendo proibir a produção [do filme]. Essa é uma cena num filme, não um ato criminoso. Eu posso até achar de mau gosto, mas não me cabe tirar o filme de circulação. Isto é uma afronta à liberdade de expressão", diz ela.

Olivieri acrescenta que a classificação é indicativa, como o nome diz, ou seja, uma indicação do Estado para as famílias, mas que a decisão de assistir ao filme ou não é individual. Ela lembra ainda que a classificação pode ser revista pela administração e que há certa subjetividade na escolha da faixa etária.

Aline Akemi, sócia do escritório Cesnik, Quintino e Salinas Advogados e autora do livro "Direito à Cultura e Terceiro Setor", afirma que a classificação indicativa é um mecanismo importante do regime democrático para evitar a censura.

"Por meio dela é possível que os responsáveis tenham conhecimento antecipado do conteúdo da obra para decidir se é adequado ou não ao consumo das crianças e adolescentes que estejam sob seu cuidado", afirma Akemi.

Akemi diz ainda entender que, para que o filme seja removido do streaming, seria necessária uma decisão judicial, não do Executivo, assim como acontece com a remoção de posts de redes sociais.

"Neste caso [do filme], o governo fez a análise [da classificação etária] em 2017. Caçar essa decisão agora pode criar um precedente muito perigoso." ​

Em outro caso recente de remoção de conteúdo de plataforma de streaming, foi uma decisão judicial que determinou que a Netflix retirasse de seu catálogo um especial do Porta dos Fundos. O episódio retratava Jesus gay (Gregorio Duvivier, colunista da Folha), que se relaciona com o jovem Orlando (Fábio Porchat), e um Deus mentiroso (Antonio Tabet) que vive um triângulo amoroso com Maria e José.

Havia ao menos sete ações na Justiça contra a Netflix, ajuizadas por lideranças de igrejas ofendidas com a paródia.

A Justiça do Rio de Janeiro acabou negando a ação, sustentando que o episódio era "um legítimo exercício da crítica, por meio de sátira". O especial segue no catálogo da plataforma de streaming.

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