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Como 'Bum Bum Tam Tam' ajudou Anitta a chegar a topo do Spotify

Impulsionado pelo hit de MC Fioti, funk brasileiro estourou no exterior e traçou bases para carreira internacional da cantora

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Não faz tanto tempo assim, mas no segundo semestre de 2017, quando Anitta lançou o projeto "Checkmate", não se falava em outra coisa no pop nacional que não as tentativas da cantora de estabelecer uma carreira internacional —a cujo auge ela chega agora, com o seu "Envolver" encabeçando o ranking de músicas mais ouvidas do Spotify.

Cena do clipe de 'Envolver', de Anitta - Reprodução/Anitta no YouTube

"Checkmate" é da mesma época em que foi lançada "Bum Bum Tam Tam", possivelmente o maior hit brasileiro no exterior dos últimos tempos, tendo passado o 1,5 bilhão de visualizações só no YouTube, produzido e cantado pelo MC Fioti.

Àquela altura, o sucesso do funk brasileiro no exterior era uma novidade. Em 2016, no Lollapalooza Brasil, a dupla de produtores americanos Skrillex e Diplo, se apresentando como Jack Ü, chamou o funkeiro Bin Laden para o palco para cantar o hit do MC, "Tá Tranquilo, Tá Favorável". Antes, o show deles já havia contado com um remix de "Baile de Favela" —hit do MC João.

Já Anitta atirava para todos os lados com o projeto "Checkmate", que rendeu um EP com quatro músicas e quatro clipes. Em "Will I See You", uma bossa nova pop cantada em inglês, ela arriscava o que viria a concretizar em "Girl from Rio", anos depois. Em "Is That for Me", ela também canta em inglês num EDM, ou electronic dance music, genérico assinado pelo super-DJ Alesso.

Mas as outras duas músicas do projeto foram sucesso absoluto. Uma delas era "Downtown", uma parceria com J Balvin com levada de reggaeton arrastado, letras em espanhol e temperada pela sensualidade da dupla. É Anitta soando como o melhor da música latina contemporânea. A faixa foi produzida por Sky Rompiendo, nome de primeira linha no reggaeton e que recentemente trabalhou, por exemplo, em "Motomami", recém-lançado e já aclamado disco da espanhola Rosalía.

A outra música de "Checkmate" a estourar foi "Vai Malandra", um funk afiado com toques de trap que é hit no Brasil e fora dele, possivelmente o que de mais interessante Anitta fez em toda a sua carreira. A audiência de "Will I See You" e "Is That for Me" é só uma fração mínima dos números de "Downtown" e "Vai Malandra".

Não custa lembrar que 2017 também foi o ano de "Despacito", um hit de proporções globais que abriu caminho para o crescimento da música latina ou em língua espanhola que segue até hoje. O trapper porto-riquenho Bad Bunny, expoente desse movimento, é há dois anos o artista mais escutado do Spotify no mundo, por exemplo.

Todos esses processos passam pela disseminação de acesso à internet fácil e rápido através de smartphones em regiões mais pobres do mundo, como a América Latina. Isso contribuiu para um crescimento exponencial das plataformas de streaming nessas regiões e representou um aumento também nos números das produções musicais desses lugares —o que se soma ao sucesso massivo e global do k-pop, principalmente por meio do grupo sul-coreano BTS, que canta também na língua local.

Divulgado nesta terça-feira, um relatório da Federação Internacional da Indústria Fonográfica, a IFPI, consolidou o streaming como dominante na maneira de se consumir e ganhar dinheiro com música, com crescimento especial ano a ano da participação da América Latina —onde o Brasil é o mercado mais importante, seguido pelo México— nos números globais.

Em 2018, ano em que "Vai Malandra" era febre, foi a primeira vez na história em que o streaming se tornou a maior fonte de receita da indústria fonográfica. Hoje, o consumo digital corresponde a 85,6% de todo o faturamento no Brasil.

Se o estrondoso sucesso de MC Fioti, do Capão Redondo, bairro no extremo sul de São Paulo, sampleando uma flauta de Johann Sebastian Bach, soava um tanto improvável, não é o que acontece com Anitta. A cantora entende o mercado e sabe que ele estava —ou ainda está— propício para a ascensão internacional de uma estrela brasileira que dialogue com esses universos, o da chamada "música urbana", com batidas eletrônicas e em geral feitas para dançar.

E ela não é a única aproveitando o momento. Tanto Anitta quanto Ludmilla fizeram músicas com a estrela do hip-hop americano Cardi B, que tocou um trecho de um funk de Pedro Sampaio no Grammy. As duas também gravaram um funk com o histórico rapper americano Snoop Dogg, "Onda Diferente".

O funkeiro Kevin o Chris teve "Ela É do Tipo" regravada por Drake, gigante do rap no mundo todo, fora o convite memorável para cantar seus sucessos em 150 BPM, isto é, batidas por minuto, no show do rapper Post Malone no Lollapalooza Brasil de 2019.

Recentemente, Anitta voltou a cantar em inglês e a mirar o mercado americano com o single "Boys Don’t Cry". Mesmo com um grande esforço de divulgação, a música não chega perto do sucesso de "Envolver", hit da brasileira que agora bate recorde ao alcançar a primeira posição entre as músicas mais ouvidas do mundo no Spotify —e o motivo de toda esta reflexão.

Com batidas de reggaeton, cantada em espanhol e alavancada pelas dancinhas e reboladas no TikTok, a música curiosamente demorou quatro meses para alcançar os números atuais.

De certa forma, na comparação com "Girl from Rio" e "Boys Don’t Cry", "Envolver" repete e ecoa o que aconteceu há cinco anos, quando as músicas "americanizadas" de "Checkmate" comeram poeira para a "brasileira" "Vai Malandra" e a "latina" "Downtown".

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