Jack White explica sucesso dos White Stripes: 'Lugar certo e momento certo'

Guitarrista diz ter renascido durante a pandemia e lança 'Fear of the Dawn', primeiro de dois discos previstos para 2022

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São Paulo

Para Jack White, a quarentena foi uma ressurreição. "Sei que para milhões de pessoas a pandemia não afetou de maneiras boas e causou diversas dores. Esses tempestades que atingem a humanidade podem machucar muita gente. Por outro lado, podem ser benéficas para outros", diz o guitarrista a este repórter.

White lança nesta sexta-feira o disco "Fear of the Dawn", o primeiro de dois álbuns de inéditas, feitos durante a pandemia, e previstos para este ano. O segundo, "Entering Heaven Alive", sai em 22 de julho.

homem branco de cabelos azuis apoiado em balcão
O músico Jack White, ex-White Stripes, que divulga o disco 'Fear of the Dawn' - Paige Sara

São obras que marcam mudanças na carreira do artista, que despontou como vocalista e guitarrista da banda de rock White Stripes e, durante a última década, firmou uma carreira solo respeitada tanto pela arte quanto pelos métodos pouco usuais de produção e distribuição da música.

Mas, no tempo de isolamento social, algumas coisas mudaram para o artista. "Sinto que vivi um renascimento total em muitas partes da minha vida", ele diz. "Quando os tempos são difíceis, muitas vezes acabam beneficiando um artista ou dando inspiração. Dão a eles alguma dor e confusão para munir composições, e tenho certeza de que foi isso que aconteceu comigo."

Em um nível pessoal, as mudanças vão do cabelo aos hábitos alimentares. "Tudo o que consigo pensar está diferente. Doei todas as minhas roupas, cortei e pintei [de azul] o cabelo. Trabalho com pessoas diferentes. Não como mais açúcar há dois anos. Criei novas instituições —uma conta no Instagram da [gravadora] Third Man Records dedicada a móveis e um site novo de design. Não fiz nada além de renascer e renascer a cada semana durante essa parada. Foi muito inspirador, e sinto isso de uma maneira muito forte."

White, que não tinha celular até este ano, agora tem conta nas redes sociais —ainda que não uma pessoal— e deixou para trás alguns maneirismos. Até o novo álbum, ele só gravava em fita, num processo analógico que passava pela prensagem dos vinis em seu selo, o Third Man Records. Isso sem contar no rock com forte viés retrô e na proibição do uso de celulares em seus shows.

Agora, ele editou usando o Pro Tools, software bastante comum entre produtores de música, além de criar composições pela primeira vez a partir de samples —recortes— de outros artistas e loops —a repetição desses recortes.

"Usei de tudo. Computadores com Pro Tools, fita analógica, diferente gravadores de fita, entre outras coisas. Gravei coisas no microfone do computador e coisas em equipamentos dos anos 1930. Gravei o que sentia que estava certo no momento. Aprendi a editar no computador. A edição da música ‘Into the Twilight’ é tão intensa e detalhada que nunca poderia ter sido feita em fita. Ou demoraria seis meses para fazer algo assim."

Isso não significa que White agora queira fazer música moderna. O single "Taking me Back" traz as guitarras energéticas que são marca dele desde os White Stripes, enquanto a faixa-título é um rock direto e sombrio. Mas há novidades.

O rapper Q-Tip, do grupo A Tribe Called, um dos mais influentes do rap de Nova York nos anos 1990, canta em "Hi de Ho", entre barulhos dissonantes e um sample antigo do cantor de jazz Cab Calloway. É White brincando com o passado, como sempre fez, mas de um jeito bem diferente.

"É a primeira vez que sampleio uma música de outra pessoa. Foi engraçado porque quando mostrei a alguns amigos, acharam que fosse eu cantando quando, obviamente, era o Cab Calloway. Alguns até ficaram preocupados,como se eu estivesse imitando."

A música "Into the Twilight" sampleia uma faixa do grupo de jazz americano Manhattan Transfer, conhecido pelas harmonias vocais a capella.

Muitas dessas novidades na música de White vêm depois do fracasso de "Boarding House Reach", disco experimental de 2018 que foi mal recebido por público e crítica, tido como um delírio egoico e autoindulgente do guitarrista. "O que saiu no álbum era eu no estúdio, pensando, ‘vou fazer diretamente o que meu cérebro está pensando e o que ele quer ouvir no momento’."

White sabia o que estava fazendo, mas aprendeu algumas lições. "Aprendi que quando você sobe no palco, não dá para fazer qualquer coisa. Mas você também não pode trabalhar só para satisfazer outras pessoas. É um equilíbrio. São coisas bizarras para um artista pensar. É como o sonho do pintor, de pôr a própria alma na tela, depois levá-la até uma galera de arte e as pessoas compram aquilo por milhões de dólares. É a fantasia do artista que passa fome ou que vive em dificuldade."

Essa possibilidade de fazer a música que quiser foi conquistada por White com o sucesso de seu selo, que grava discos ao vivo, prensa vinis com clubes de assinatura e, de certa forma, faz o guitarrista funcionar fora da lógica da indústria. Mas a liberdade, acrescenta, cobra o seu preço.

"Você pensa se vão tocar sua música no rádio, e o que as pessoas vão pensar daquilo. ‘Devo mudar o refrão?’ Havia uma época em que os produtores eram escolhidos pelas gravadoras e te diziam o que fazer, e você não podia nem escolher o título do disco. E quer saber? Acho que tinham muita coisa a oferecer, uma equipe de pessoas talentosas que deixavam o artista só se preocupar em ser um bom cantor, compositor ou baterista. Quando você tem muita liberdade, tem que tratá-la com respeito e responsabilidade."

Enquanto lida com a liberdade, White lembra com carinho do passado, quando estourou com a baterista Meg White no White Stripes —"Seven Nation Army" se tornou um hino atemporal que hoje virou cântico de torcidas de futebol em todo o mundo.

"Estive em muitas bandas, mas por que essa?", se pergunta sobre o sucesso da canção da dupla. "É daquelas coisas que são mágicas porque não se consegue explicar. Era o lugar certo e o momento certo."

Ele usa o filme "Quanto Mais Idiota Melhor", de 1992, que alavancou "Bohemian Rhapsody", de 1975, do Queen, para explicar o sucesso do White Stripes."Aquela música tocou no rádio por anos e o que tinha de tão diferente? Era a coisa certa no momento certo. Hoje, você pode dizer que é uma das melhores já feitas, mas ninguém dizia isso quando eu estava no colegial. Era só uma música boa. O White Stripes se conectou com as pessoas —e sou grato por isso."

Fear of the Dawn

  • Quando A partir de sexta (8)
  • Onde Nas plataformas digitais
  • Autor Jack White
  • Gravadora Third Man Records
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