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Cinema

'O Território' escuta invasores e indígenas em disputa angustiante

Filmado em viagens de Alex Pritz à Amazônia feitas de 2018 a 2021, documentário é coproduzido pelos uru-eu-wau-waus

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São Paulo

O Território

  • Quando No dom. (10), às 20h, no Espaço Itaú Augusta, em São Paulo, e no Espaço Itaú Botafogo, no Rio de Janeiro; às 21h, online no É Tudo Verdade Play
  • Preço Grátis
  • Classificação 12 anos
  • Produção Brasil/Dinamarca/EUA, 2022
  • Direção Alex Pritz
  • Link: https://www.etudoverdadeplay.com.br/film/o-territorio/

Logo no início do documentário "O Território", parte da programação do É Tudo Verdade, surgem na tela breves comentários sobre as ameaças vividas pela comunidade indígena uru-eu-wau-wau, em Rondônia. "O território é uma ilha de floresta cercada de fazendas", diz um deles.

A frase, escrita, até pode causar algum alarme, mas cinema é imagem, como bem sabe o americano Alex Pritz, que tem respeitável carreira como diretor de fotografia.

Minutos depois, o recurso visual se impõe. Bitaté, um jovem líder indígena, e Ivaneide Bandeira, conhecida como Neidinha, ativista ambiental, estão às margens de um riacho, cercado por uma floresta aparentemente densa. Eles acionam o drone, que sobe dez, 15, 20 metros. Deixamos, então, de vê-los para acompanhar os registros feitos pela pequena aeronave, e o que ela nos mostra, do alto, é espantoso. Depois de uma faixa curta de mato, aparece uma área desmatada a perder de vista.

Cena de 'O Território', filme que mostra a luta de um grupo de indígenas contra o desmatamento causado em uma área protegida da floresta amazônica
Cena de 'O Território', filme que mostra a luta de um grupo de indígenas contra o desmatamento causado em uma área protegida da floresta amazônica - Alex Pritz/Amazon Land Documentary

Filmado em sete viagens de Pritz e sua equipe à Amazônia, feitas de 2018 a 2021, e coproduzido pelos uru-eu-wau-waus, o documentário exibe uma sucessão de imagens potentes e até angustiantes.

Após afiar os dentes da corrente da motoserra, um madeireiro põe a máquina barulhenta para funcionar e rapidamente derruba uma árvore de grande porte; instantes depois, os invasores botam fogo em troncos e galhos espalhados pelo chão a fim de que aquele trecho da floresta dê logo origem a um descampado.

"O Território" também ganha força graças a uma opção incomum em filmes sobre a tensão entre indígenas e brancos na Amazônia: Pritz acompanha de perto não apenas um, mas os grupos em disputa. De um lado, estão Neidinha, Bitaté e os demais uru-eu-wau-waus, que buscam impedir que o território seja ocupado. Do outro, os invasores que se reúnem em associações, como Sérgio, e os independentes, como Martins, que agem de maneira mais impulsiva.

O público não deve esperar qualquer sinal de nobreza dos invasores, talvez futuros grileiros. Como dizia o Barão de Itararé, "de onde menos se espera, daí é que não sai nada".

Mas ouvi-los diretamente, sem intermediários, contribui para entender melhor os conflitos que se acentuaram sob o governo Bolsonaro. "O que fico revoltado é que a gente ainda é considerado bandido! São pessoas [em referência aos indígenas e àqueles que os defendem] que atrapalham o país, entendeu?", diz Martins, que, a determinada altura, queima um pedaço da floresta sem titubear.

Parece um jogo de autoengano. Embora estejam cientes de que aquela terra não pertence a eles, os invasores torcem e retorcem os argumentos para mostrar que não é bem assim. Segundo Sérgio, "nossa associação precisa brigar pela área que se diz estar dentro da área uru-eu-wua-wua".

A coragem de Neidinha, mãe da também ativista e colunista da Folha Txai Suruí, se revela mais admirável quando exposta em contraste com o ímpeto pelo "progresso" dos madeireiros —ainda merece um estudo o uso excessivamente flexível nos dias de hoje da palavra "progresso", citada diversas vezes em "O Território".

O filme só perde vigor quando tenta ganhar ares de thriller, um "docu-thriller", como dizem os americanos. Uma trilha sonora típica de cenas de ação e suspense de Hollywood acompanha as passagens em que Bitaté e outros indígenas perseguem invasores. É inevitável que, fortes num primeiro momento, as cenas se empobreçam quando ligadas a recurso tão banal.

São, de qualquer modo, problemas pontuais. A determinação de ouvir quem não costuma ser ouvido em filmes desse tipo e uma coleção de imagens de impacto fazem de "O Território" um dos destaques desta edição do É Tudo Verdade.

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