Descrição de chapéu Televisão

Ana Maria Braga abre o jogo sobre o Mais Você, a mulher e o envelhecimento e política

Aos 73, apresentadora ocupa o centro das manhãs da TV Globo e vai ao ar depois do Encontro, agora sem Fátima Bernardes

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Retrato da apresentadora Ana Maria Braga, de 73 anos, do Mais Você

Retrato da apresentadora Ana Maria Braga, de 73 anos, do Mais Você Eduardo Knapp/Folhapress

São Paulo

É por volta das nove da manhã de segunda-feira quando Ana Maria Braga chega ao estúdio do Mais Você, cumprimenta sua equipe e se concentra para entrar no ar. Sentada à mesa, ela abre o programa discutindo nada menos do que estupro e gravidez.

Manifesta seu apoio a Klara Castanho e diz estar indignada com "os fofoqueiros" que "se dizem jornalistas, mas desconhecem a ética e não têm respeito com o ser humano", numa crítica a Leo Dias e Antonia Fontenelle, que levaram a atriz a revelar que tinha sido estuprada e entregado seu bebê para adoção.

Do lado de fora dos estúdios da TV Globo em São Paulo, de onde o Mais Você é apresentado desde o ano passado, quando se mudou do Rio de Janeiro, a declaração vira um dos assuntos mais comentados do Twitter.

Ana Maria, que tem uma das carreiras mais longevas da TV brasileira, somando 32 anos à frente das câmeras, já está acostumada. Seja por usar uma peruca cor-de-rosa, seja por errar o nome de um convidado, ela viraliza nas redes sociais dia sim, dia não.

Retrato da apresentadora Ana Maria Braga, do Mais Você
Retrato da apresentadora Ana Maria Braga, do Mais Você - Eduardo Knapp/Folhapress

Às vezes, no entanto, a audiência da televisão, que ela acompanha minuto a minuto por meio de seu ponto, não corresponde à da internet. O Dia do Orgulho LGBTQIA+, pauta que abriria o programa do dia seguinte, é prova disso.

Se, por um lado, a maior parte dos fãs celebrararia o apoio da apresentadora à comunidade, por outro milhares de brasileiros —ou milhões, quem sabe— desligariam a TV ou pegariam o controle remoto para mudar o canal.

"Você não faz ideia do número de brasileiros, independentemente da classe social, que não aceitam a liberdade sexual de cada um. É por isso que digo para minha produção que o Brasil não é São Paulo e Rio de Janeiro. Mas tem coisas que não dá para deixar de falar. Todo mundo quer audiência, mas preciso me posicionar diante de questões que acredito que tornam o país melhor. Não tento impor nada, mas sugiro um olhar diferente, com mais empatia."

A apresentadora, de 73 anos, passa a ocupar o centro das manhãs da Globo a partir desta segunda-feira. Com a ida de Fátima Bernardes para o The Voice, o Encontro, agora com Patrícia Poeta e Manoel Soares, vai ao ar antes do Mais Você.

Embora esteja agora mais distante do Bom Dia Brasil, Ana Maria diz que não vai se afastar do noticiário e que não há assunto proibido em seu programa, que, só com os quadros fixos, vai de esportes a economia, com a participação de Felipe Andreoli e Gil do Vigor.

A única coisa que a apresentadora diz não discutir é política. Ela não declara voto em nenhum candidato ou partido político e assim pretende atravessar estas que devem ser as eleições mais acirradas desde a redemocratização do país, com um número crescente de celebridades que pedem a cabeça de Jair Bolsonaro e a volta de Lula.

Ana Maria trabalhou como assessora de imprensa de Sylvia Maluf quando seu então marido, Paulo, foi eleito prefeito de São Paulo, no início da década de 1970. Desde que estreou na TV, em 1977, no entanto, a apresentadora se afastou da política. Uma das raras exceções foi em 1998, quando declarou voto em Fernando Henrique Cardoso numa entrevista a Marília Gabriela.

"Eu disse que votaria no FHC porque eu acreditava nele —e acredito até hoje. Mas não tiro fotos nem vou a festas com políticos. Não é medo de incomodar, porque tem muita gente que se expõe e continua fazendo sucesso, acertando ou não. É que os políticos prometem coisas que não tenho certeza se vão cumprir. Não coloco minha credibilidade em risco. Se eu falar, as pessoas acreditam, e nisso posso levar muita gente a quebrar a cara comigo."

Não que Ana Maria possa se manifestar como quiser. Da mesma maneira como atores da TV Globo não podem se posicionar em novelas, filmes ou seriados, apresentadores tampouco têm permissão para dizer em seus programas em quem vão votar. Eles até podem se posicionar, mas só em entrevistas ou eventos, como fez Gil do Vigor ao ir ao casamento de Lula. São, ainda, vetados de participar de comerciais ou qualquer outro material de campanhas políticas.

Por isso, a apresentadora se posiciona à própria moda. Ao fim do primeiro mandato de Dilma Rousseff, em 2014, ela vestiu um colar feito de tomates para satirizar o preço dos alimentos, o que voltou a fazer na gestão de Jair Bolsonaro com colares de arroz, cenoura e até de remédios, além de uma bolsa de botijão de gás. O Louro José, criado para manter as crianças que assistiam à TV Globinho vidrados no Mais Você, também se manifestava.

"O Louro sempre foi um alter ego meu para isso. Às vezes, a gente via tanta palhaçada no Bom Dia Brasil que o Louro entrava com um nariz de palhaço. A gente não dizia absolutamente nada, mas, como vínhamos depois do jornal, todo mundo entendia. É uma forma subliminar e irreverente de você dizer ‘puta que o pariu, que merda está acontecendo?’. Os colares são uma crítica independentemente do político ou do partido."

Outra preocupação que Ana Maria diz ter por sua credibilidade é com publicidade. Antes acusada pelos críticos de fazer um programa com comerciais demais, quando o extinto Note e Anote, da Record, tinha 34% de seu tempo dedicado a comerciais ante os cerca de 10% do Mais Você, a apresentadora diz que se recusa a misturar os cenários do editorial ao do comercial ou promover produtos que prometem o que ela não pode garantir que aconteça —ou, como costuma dizer, "que faça aparecer ou desaparecer, crescer ou diminuir qualquer coisa".

"Quer um exemplo?", ela pergunta a este repórter. "Sempre recebi convites de bancos para comerciais de crédito consignado. Sempre disse que faria, mas só se me deixassem dizer o que isso realmente significa. Ninguém quis. Eles não contam que descontam direto do salário, ou seja, que o cliente não tem a possibilidade de receber para depois pagar. Só este ano me deixaram dizer isso, aí eu fiz."

É o mesmo cuidado que ela diz ter com as receitas, ora reprises, ora inéditas. Diretora do Mais Você desde sua estreia, há 23 anos, Viviane de Marco conta que a cada 15 dias Ana Maria vai à cozinha, instalada num contêiner no estacionamento da TV Globo, visto que o estúdio paulistano não pode ter botijão de gás, para provar uma dezena de pratos preparados por sua equipe.

Era o que a apresentadora tinha acabado de fazer antes de receber a reportagem em seu camarim. Como numa reunião de pauta de um jornal, os culinaristas mostram suas receitas à apresentadora, que não só pode pedir mudanças como também vetar as propostas.

Seus critérios vão do sabor à beleza dos pratos, passando também pela acessibilidade dos ingredientes, isto é, se eles têm um preço que cabe no bolso da maior parte dos brasileiros e são fáceis de encontrar em qualquer região do país.

Acessibilidade, aliás, é um dos segredos do sucesso do Mais Você, na avaliação de Ana Maria. Em vez de ensinar o espectador a fazer um blini, ela diz que prefere ensinar a fazer uma panquequinha russa, uma lógica que também se aplica aos outros quadros do programa, sobretudo as entrevistas com especialistas em áreas técnicas, que são vistas diariamente por quase 12 milhões de brasileiros, segundo as estimativas da Globo a partir dos dados coletados pelo Kantar Ibope Media.

"Como faço televisão para um país com um grande número de pessoas que não tiverem a oportunidade de frequentar a escola, tomo um cuidado danado. Minha mãe é um exemplo. Ela não conseguiu fazer nem o quarto ano de grupo, [o antigo ensino fundamental], então ela mal escrevia. Quando entrevisto alguém, penso na pergunta que minha mãe faria. Isso não quer dizer que eu não saiba, mas preciso perguntar mesmo assim, porque tem milhões de brasileiros que não sabem."

Ana Maria também não tem medo de errar. Já houve tombos, receitas que não deram tão certo, papel toalha que pegou fogo, cachorro que urinou em seu ombro e Simone & Simaria que virou "Simone & Maraísa", para citar alguns exemplos.

Sem vergonha, ela, que no fim da década de 1990 entrou para o livro dos recordes como a apresentadora que ficava mais tempo no ar no mundo todo, com quase cinco horas por dia à frente das câmeras, diz que "o que dá tesão é o risco".

Este, diz, é o motivo pelo qual nunca abandonou o ao vivo nem tem planos para sair da TV Globo, com quem acaba de renovar seu contrato por mais dois anos, até 2024, embora vez ou outra os tabloides antecipem seu pedido de aposentadoria ou sua demissão.

"Eu até teria o que fazer fora da TV, porque tenho outros negócios, como plantações de café e de eucalipto, mas não seria a mesma diversão que sinto no Mais Você", diz. "Já tentaram me botar para fora da Globo uma porção de vezes com fake news. Não adianta dizer que não é verdade. Obviamente vai ter o momento que, por juízo, vou ter que parar. Sempre digo que, quando eu começar a ficar gagá, é para me avisarem. Eu sei que não sou uma menina. Não tenho mais 50 anos."

Com a mudança de horário do Mais Você, o relógio de Ana Maria vai despertar uma hora mais tarde a partir desta semana, às cinco e meia da manhã. Acordar antes de o sol raiar continua tão difícil quanto antes, mas a apresentadora diz que não se incomoda. Pelo contrário. Antes de dormir, sobre tempo —e disposição— até para, veja só, cozinhar em casa, jogar videogame com o neto e malhar três vezes por semana, o que garante a cintura fina pela qual tanto é elogiada nas redes sociais.

"Não é todo mundo que chega aos 70 com meu corpo. Não tenho estria nem celulite. Gosto de me cuidar e comer direito. Só isso aqui que complica. Mas tudo bem, senão vou virar Nossa Senhora", diz, com as mãos num cigarro e os olhos voltados para a imagem da santa no camarim. "As meninas que trabalham comigo ficam surpresas. Sirvo de exemplo para elas. Não passei na fila da bunda quando nasci, mas comecei a fazer ginástica e minha bunda cresceu, acredita?"

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.