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Lady Gaga empilha hits em palco que cospe fogo na turnê de 'Chromatica'

Cantora deixou a plateia sem voz e com o corpo dolorido de tanto dançar em show em Londres nesta sexta (29)

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James Cimino
Londres

O ano de 2020 foi uma tragédia para o mundo todo, menos para a música pop. Trancafiados em casa como todo mundo, artistas tiveram tempo de produzir álbuns bem acabados que se tornaram um consolo para os intermináveis momentos de solidão durante os lockdowns ao redor do mundo. Entre esses álbuns, se destacam quatro –"After Hours", do The Weeknd, "Future Nostalgia", de Dua Lipa, "Disco", de Kylie Minogue, e "Chromatica", de Lady Gaga.

De certa forma, esses trabalhos se complementam porque são perfeitos para transformar qualquer sala de estar numa pista de dança. Só um, no entanto, tem a capacidade de incendiar um estádio lotado por 46 mil pessoas pessoas ao longo de duas horas a ponto de deixar a plateia sem voz e com o corpo dolorido de tanto dançar — "Chromatica".

Incendiar literalmente. O palco cospe fogo, e a cada vez que o faz, uma onda de calor atinge todos os rostos da histérica plateia. Dá um certo alívio imaginar que não tem Covid que resista a uma pirotecnia dessas.

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Lady Gaga se apresenta no estádio Tottenham Hotspur, em Londres, durante sua turnê 'The Chromatica Ball' - for Live Nation/Divulgação

Poder voltar a um estádio para ver uma artista do calibre de Gaga no ápice de sua carreira é um privilégio que poucas pessoas no mundo terão. A turnê tem só 20 datas agendadas pelo mundo e, até o momento, nenhuma delas inclui o Brasil.

Mas isso não significa que o público brasileiro deva perder as esperanças. "The Chromatica Ball" é um show para estádios apenas, com hits do início ao fim, e com efeitos pirotécnicos possíveis só num espaço aberto.

A ousadia não se resume às labaredas lançadas do palco. Gaga decidiu abrir o show com três de seus maiores hits logo de cara. "Bad Romance", "Just Dance" e "Poker Face" são só o prelúdio para o produto principal —"Chromatica". Divididas em quatro atos, as canções deste álbum cheio de hinos não decepcionam aqueles poucos que vieram só pelos hits de "The Fame", "The Fame Monster", "Artpop" e "Joanne".

"Replay" é um exemplo. A performance fez o estádio inteiro cantar o refrão da faixa de um álbum lançado no meio da pandemia e com pouquíssima divulgação. Nela, Gaga aparece com um figurino de PVC todo sangrento, possivelmente em referência a seu diagnóstico de fibromialgia. A condição fez com que ela cancelasse sua última turnê, que incluiria uma participação no Rock in Rio há cinco anos —sua ausência no evento originou o meme "Brazil, I’m devastated".

"Enigma", um delicioso house que figura como a 11ª faixa de "Chromatica", indiscutivelmente uma das melhores músicas do álbum e da carreira de Gaga, também arrebenta, como era de se esperar.

Outros dois destaques são "Free Woman", em que a cantora desfila pelo meio da pista num figurino de lamê dourado cantando versos como "this is the dancefloor I fought for", ou esta é a pista de dança pela qual eu lutei, até chegar a um minipalco central onde vai transformar o show de rock numa apresentação intimista ao piano, uma de suas marcas registradas.

Sai dali uma versão em menor escala de "Born This Way", um combo de lágrimas em "Shallow" e "I Always Will Remember Us This Way", ambos da trilha sonora de "Nasce uma Estrela", além de um discurso de agradecimento à resiliência dos que sobreviveram à pandemia que se mescla com perfeição aos versos de outro hit dance do último álbum, "Fun Tonight" –"this moment hijacked my plans", ou este momento sequestrou meus planos. Ela dedica a música aos que "não podem mais se divertir esta noite".

O show é encerrado com três hits recentes –"Stupid Love", "Rain on Me", que levou o Grammy de melhor gravação de 2020, e "Hold My Hand", que faz parte da trilha sonora de "Maverick".

Mas se musicalmente "The Chromatica Ball" é uma demonstração de poder de uma artista que está no comando da cena pop mundial, em termos de produção, ele não é um show inovador. A estética que abusa de elementos kitsch nos cenários, as coreografias repetidas desde a primeira turnê e os figurinos que parecem peças de cartolina de um trabalho da quinta série e mal deixam a cantora se mover em alguns momentos são um pouco decepcionantes, mas nada que diminua a euforia de estar ali em comunhão musical com milhares de pessoas.

Em termos de performance, Gaga claramente poupa o corpo. Em "Alice", ela canta deitada. As cinco pausas com interlúdios que mal ocupam o palco também deixam claro que o pop é um estilo superlativo e sobre-humano demais para a maioria dos artistas. Por isso, é impossível não comparar "The Chromatica Ball" com outro show pop que está atraindo hordas de fãs de todas as idades para Londres.

"Abba Voyage", este sim um show do futuro, que conjuga elementos reais, virtuais, passado, futuro, cinema, videogame e, claro, o "crème de la crème" do pop, proporciona uma experiência de hiper-realidade intimista em que o público vê a materialização de conceitos só possíveis no filme "Matrix" e que podem ser reproduzidos em série, usando os artistas como base, mas sem que sua presença seja necessária.

Talvez em breve as questões de saúde de Gaga a obriguem a investir nesse tipo de performance. Por enquanto, é como bem definiu um fã que assistiu ao "Abba Voyage" quando Gaga terminou de cantar "Shallow". "Tudo o que eu vejo agora vai ser comparado ao ‘Abba Voyage’. Lá, eu estava dentro do show, sem saber onde começava o mundo real e onde terminava o virtual. Mas o que a Gaga acabou de trazer para a gente aqui é vida. Não tem playback."

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