Em cartaz na praça do Sesc Avenida Paulista, "Agamenon 12H" é uma peça que dura exatas 12 horas. Sem intervalos, a montagem enfileira uma dúzia de monólogos com base no mesmo texto, "Agamenon - Voltei do Supermercado e Dei uma Surra no Meu Filho", do argentino Rodrigo García.
Sob a direção de Carlos Canhameiro, que assina a versão em português ao lado de Chico Lima, o espetáculo apresenta 12 artistas, cada um com sua própria visão cênica da obra. A montagem ganha luz no momento em que a retomada das atividades presenciais após o isolamento causado pela pandemia da Covid-19 põe em discussão temas como a falta de foco, a dependência em redes sociais e um excesso de estímulos externos.
Com a pandemia, surgiram os questionamentos sobre se o público estaria pronto para manter o foco em um único produto, como um filme ou uma peça de teatro por mais de uma hora.
O lançamento de blockbusters como "Homem-Aranha: em Volta para Casa", de 2021, e "Batman", de 2022, mostraram que sim, há essa disponibilidade, desde que seja possível checar o celular entre uma cena e outra para se manter informado do mundo exterior.
"Agamenon 12H", entretanto, não se preocupa com a atenção do público. O espetáculo abre todas as janelas para que se use e abuse de aparelhos eletrônicos. Iniciado às 10h, bastou 15 minutos do primeiro solo, estrelado por Amanda Lyra, para que os celulares começassem a despontar.
E não houve problema. Ao contrário, em dado momento, quando Janaína Leite assumiu a encenação, foi incentivado o uso dos aparelhos, já que parte do seu espetáculo era feito via WhatsApp. Curiosamente, foi quando o público decidiu manter os estímulos externos de fora.
O espetáculo narra a jornada de um homem que, ao retornar do supermercado, percebe que comprou o dobro dos produtos que precisava, além de ter levado coisas das quais não gostava. Ele então dá uma surra na mulher e no filho e os leva para jantar fora. Num fast food de beira de estrada, explica como funciona o capitalismo e as grandes potências econômicas do século 20.
Não houve quem se mantivesse atento a mais de dois espetáculos. Algumas pessoas saíram para não voltar, outras retornavam, assistiam alguns minutos e saíam de novo. Alguns amigos de intérpretes ficaram pelo tempo que duravam suas apresentações. O fato é que "Agamenon 12H" não é uma peça concebida para ser acompanhada por 12 horas ininterruptas.
O espaço também não permite. É desconfortável e fica à mercê de interferências externas, que vão do som da cidade a conversas paralelas. Foi, por exemplo, problemática a permanência de duas crianças que decidiram que atrapalhariam performance de Nilcéia Vicente. Ela não conseguiu terminar o texto no tempo proposto de uma hora.
Entretanto, assistir a apenas um ou dois solos pode ser uma experiência limitadora. É preciso assistir a um compilado para compreender que cada performance é uma proposta que pode potencializar ou enfraquecer o texto.
O fato é que "Agamenon 12H" não é um espetáculo pensado para prender a atenção incessante da plateia, nem com seu cenário multicolorido assinado por Renato Bolelli Rebouças, nem com o ótimo desenho de luz de Daniel Gonzalez. Ao contrário, é uma produção que incentiva a atenção difusa e os estímulos externos —que, sim, atrapalham a experiência, mas não comprometem a montagem.
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