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Série 'Rensga Hits!' tropeça em maneirismos com melodrama

Atração, no entanto, abre portas ao retratar o sertanejo e aborda tabus com personagens carismáticos

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Uma jovem compositora abandona o noivo —que a trai— no altar, pega o carro da mãe e se manda da pequena Lucas do Rio Claro em direção a Goiânia. É assim que começa "Rensga Hits!", série do Globoplay que representa uma entrada da maior emissora do país no universo da música sertaneja, mais especificamente o do feminejo, vertente do gênero liderada por mulheres —especialmente
Marília Mendonça, em quem a protagonista é inspirada.

Conforme a primeira cena deixa claro, há um esforço da série em retratar a cultura do interior do país, que agora ganha espaço na programação da Globo através da reedição de "Pantanal". Mas é perceptível também, logo de cara, que apesar do frescor no retrato da indústria de música sertaneja, há muito do velho melodrama das novelas em "Rensga Hits!".

Essa dicotomia entre uma nova história a ser contada e os modos antigos de retratá-la estão presentes em todos os oito episódios que compõem a primeira temporada de "Rensga Hits!". A trama é guiada pela carreira de Raíssa, a cantora que ganha vida pela atriz Alice Wegmann, e pelas pessoas —produtores, empresários, cantores e compositores— que ela conhece conforme adentra o mercado do sertanejo em Goiânia,

 Rafa Kalimann e Alice Wegmann em cena da série Rensga Hits!
Rafa Kalimann e Alice Wegmann em cena da série Rensga Hits! - Globoplay

A série está cheia de histórias interessantes envolvendo a competição para se criar e lançar um hit e o tratamento da imagem pública de uma celebridade, mas essa dinâmica muitas vezes fica de lado para que os dramas familiares —estes, muito mais genéricos— floresçam na narrativa. É um jogo de forças que reflete o próprio formato de "Rensga Hits!".

A série, que ofereceu os primeiros episódios na TV aberta, mira o público assinante do serviço de streaming do canal, o Globoplay. É um formato que representa uma liberdade maior de criação —algo que se percebe na escolha bastante original do elenco e no universo retratado— ao mesmo tempo que
"Renga Hits!" abraça o apelo mais urgente da telenovela.


Há méritos inegáveis na produção. Os meandros do mercado da música sertaneja, a mais popular do país atualmente, são um tema pouco explorado no audiovisual e extremamente rico. Além disso, a série usa a ficção para abordar tabus deste universo, como a falta de cantores negros, de mulheres em posição de comando e a homossexualidade, entre outros assuntos.

A ambientação em Goiânia também leva à tela toda uma cultura que raramente é retratada neste tipo de produção. Ainda assim, a paisagem e as particularidades da cidade muitas vezes são só pano de fundo, com a maioria das cenas feitas em um bar —um espetinho com luzes neon que se adequaria mais a uma rua descolada de Pinheiros, em São Paulo, do que à capital goiana— ou nos casarões onde ficam as gravadoras.

São poucos os momentos em que a Goiânia mais profana se revela e contribui de maneira relevante com a história.

Há também inadequações com a cultura local. Uma delas é a expressão que dá nome à gravadora comandada pela personagem de Deborah Secco e também à série. Na região de Goiás, o "rensga" denota um certo tipo de surpresa, enquanto na produção do Globoplay a palavra aparece em situações que não correspondem à vida real.

Nesse sentido, os sotaques frequentemente soam forçados e artificiais, com exceção em um ou outro personagem. Não é algo que chega a derrubar o apelo de "Rensga Hits!", mas mantém mesmo no streaming a dificuldade da Globo em retratar com maior verossimilhança o Brasil para além de Rio de Janeiro e São Paulo.


Entre maneirismos e novidades, estereótipos e desconstruções, "Rensga Hits!" também está repleta de personagens carismáticos e traz uma trilha original que alavanca toda a produção. As canções funcionam tanto como hits autônomos —daqueles que grudam na cabeça do espectador— quanto no contexto da história, com letras diretas que refletem os sentimentos e o ofício dos protagonistas.

Trata-se de uma série que abre possibilidades, tanto para a Globo quanto para a própria música sertaneja, que agora se vê retratada numa produção de grande escala.

Não é à toa que a primeira temporada de "Rensga Hits!", cujos últimos episódios chegaram ao streaming nesta semana, termina indicado que a produção deve retornar para dar continuidade à trama —que pode render até mais do que só uma segunda temporada. Para o gênero musical, a produção pode representar uma entrada mais frequente no audiovisual —mesmo de maneira independente, fora da maior emissora do país.

Rensga Hits!

  • Quando Brasil, 2022
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Alice Wegmann, Deborah Secco e Jeniffer Dias
  • Criação Carolina Alckmin e Denis Nielsen
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