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Cinema

'Tralala' não está à altura da nobre linhagem dos musicais feitos na França

Falta ao filme dos irmãos Larrieu o que incursões de Demy e Resnais pelo gênero têm de sobra, ou seja, charme e estilo

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Tralala

  • Quando Estreia nesta quinta (4)
  • Onde Nos cinemas
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Mathieu Amalric, Josiane Balasko, Mélanie Thierry
  • Produção França, 2021
  • Direção Arnaud Larrieu Jean-Marie Larrieu

Representantes do chamado "gosto médio", os irmãos Arnaud Larrieu e Jean-Marie Larrieu estão de volta com um musical farsesco chamado "Tralala". Seus filmes são geralmente pensados para exibição no chamado circuito "de arte", para plateias que não gostam de enlatados americanos, mas aceitam de bom grado os enlatados franceses, igualmente pouco inventivos, mas certamente mais chiques.

Cena de 'Tralala'
A atriz Melánie Thierry em cena do filme 'Tralala' - Divulgação

O "gosto médio" normalmente peca pela falta de ambição e inovação formal, mesmo em filmes que falam de um hipotético fim do mundo ​—como o longa "Os Últimos Dias do Mundo", que os Larrieu dirigiram em 2009. Um cinema que pode exibir sexo e nudez frontal sem qualquer pudor, e pode até apresentar uma narrativa esquisita e imprevisível, mas sempre com um verniz formal que o torna sério, respeitável, acima de tudo palatável para as plateias sofisticadas.

Os Larrieu são diretores até interessantes, que se arriscam um mínimo possível dentro desse registro. Mas repousam confortavelmente nele até o final, resultando em filmes por vezes simpáticos, mas sempre limitados por uma forma convencional e uma ausência de estilo, eventualmente com o disfarce da esperteza narrativa.

Esse é o caso de "Tralala". A trama, mais uma vez, é interessante na largada —um músico de rua chamado Tralala, interpretado por Mathieu Amalric, vive nas ruas de Paris, sem teto nem lei, até que recebe a visita de uma jovem, interpretada por Galatéa Bellugi, que ele acredita ser a Virgem Maria. Ela o aconselha a não ser ele mesmo. E se perde na noite parisiense.

Poderia estar aí um libelo pelo imaginário em tempos de busca pelo real, uma defesa da criação de mundos no lugar da simples representação da vida como ela é. De fato, os Larrieu não apostam simplesmente nas fatias de vida de um cinema devedor do neorrealismo. Eles perseguem sempre algo de misterioso em suas tramas, algo lúdico e criativo. Perseguir, contudo, não significa alcançar.

Na verdade, é para Tralala assumir o lugar de Pat, filho desaparecido de uma mulher, vivida por Josiane Balasko, do sul da França. Ali ele descobre que a Virgem Maria é na verdade Virginie, uma adolescente sem pai. Descobre também que sua vida se encaixa com a de Pat, sendo necessário apenas alguns pequenos ajustes. Mas valeria a pena viver dentro dessa grande mentira, correndo sempre o risco de ser desmascarado?

Mathieu Amalric é também um típico representante francês do "gosto médio". Foi ator de alguns dos principais filmes dos Larrieu, com destaque para "O Amor É um Crime Perfeito", de 2013, mas não atuou no anterior, "21 Noites com Pattie", de 2015 e já uma bola fora dos diretores.

É um grande ator e qualquer filme pode se beneficiar com sua presença. Mas ele também pode representar uma armadilha, caso tome conta de tudo com seus trejeitos e seu olhar profundamente comunicativo. Em outras palavras, é um intérprete dono de uma presença que pode cansar caso não seja modulada pela direção.

Como o sem-teto Tralala, o ator desperta alguma empatia. Conforme ele precisa manter a farsa para ficar perto da suposta Virgem Maria, e depois como forma de sobrevivência financeira, Amalric acaba soando enjoativo. O filme passa a se alongar demais, restando só algumas músicas para nosso deleite, notadamente as compostas por Bertrand Belin, músico que atua como Seb, o irmão de Pat.

"Tralala" tenta se encaixar numa nobre linhagem do musical francês, influenciado pelo musical hollywoodiano do pós-guerra e representado principalmente por Jacques Demy, com o auxílio eventual de craques como Jacques Rivette, Chantal Akerman e Alain Resnais.

Mas falta a ele o que filmes como "Pele de Asno", de Demy, "Paris no Verão", de Rivette, "Anos Dourados", de Akerman, ou "Amores Parisienses", de Resnais, têm de sobra –charme e estilo. Sem essas duas qualidades, musical algum resiste.

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