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mostra de cinema

'Babilônia' apela para a provocação e não reflete para valer sobre cinema

Quinto longa de Damien Chazelle é drama com mais de três horas sobre transição das produções mudas para as sonoras

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Babilônia

  • Quando Estreia na quinta (19) nos cinemas
  • Classificação 18 anos
  • Elenco Margot Robbie, Brad Pitt, Tobey Maguire
  • Produção EUA, 2022
  • Direção Damien Chazelle

Em "Babilônia", Damien Chazelle vai para o tudo ou nada. Seu quinto longa é um drama com mais de três horas, que representa um dos períodos mais fascinantes do cinema americano sem uma preocupação muito criteriosa com a reconstituição desse passado. É também o esboço de uma pedagogia para entender a história do cinema em imagens de curtíssima duração.

Seu gosto pela música o levou a ensaiar um romance musical em seu primeiro longa, o independente "Guy and Madeline on a Park Bench", de 2009, a explorar a dura batalha para ser um músico melhor em "Whiplash - Em Busca da Perfeição", de 2014, e a realizar um musical com sensibilidade contemporânea —"La La Land - Cantando Estações", de 2016.

Depois do desviante "O Primeiro Homem", de 2018, uma ficção científica sisuda e sem graça, "Babilônia" volta a mostrar a indústria do entretenimento numa trama sobre a transição do cinema mudo para o sonoro, período de transformações que destruiu carreiras e glórias.

Jean Smart no papel de Elinor St. John em cena de 'Babilônia'
Jean Smart no papel de Elinor St. John em cena de 'Babilônia' - Scott Garfield/Divulgação

Chazelle repete a estrutura de "Cantando na Chuva", algo que ele explicita em certo momento do filme, com a dimensão e a acidez de "A Doce Vida", embora filtrado pelo cinismo oportunista de "A Grande Beleza" e pela loucura controlada de "O Lobo de Wall Street".

No centro da trama, três personagens buscam os holofotes, ou continuar debaixo deles. Primeiramente, o produtor mexicano Manny Torres, vivido por Diego Calva, vai galgando poder em Hollywood, entre bajulações e trocas de favores.

Logo em seguida somos apresentados à personagem de Margot Robbie, uma aspirante a atriz com o nome artístico de Nellie LaRoy. Frequentar as orgias hollywoodianas dos anos 1920 era um atalho para atrair os olhares de produtores e caça-talentos e para Nellie deu certo, ao menos por algum momento.

Por fim, conhecemos o astro vivido por Brad Pitt, conhecido como Jack Conrad. É uma figura poderosa na indústria, que tem portas abertas diante dele por onde quer que vá.

Em comum, os três personagens conhecem a decadência na carreira após o advento do som e as dificuldades de adaptação. Os anos de glória vão ficando mais distantes conforme eles se afundam de maneiras diferentes em suas crises, incluindo até certas ligações criminosas.

A aposta de Chazelle numa estética de choque é evidente já no prólogo, quando assistentes tentam levar um elefante para uma festa numa mansão em cima de uma colina. O carro que leva o paquiderme começa a descer de ré. Para conseguir fazer o carro voltar a subir, um dos assistentes tem a ideia de fazer o elefante defecar, perdendo assim parte de seu peso.

A escatologia pode ter entrado na moda com um certo tipo de comédia, notadamente as dos irmãos Peter Farrelly e Bobby Farrelly nos anos 1990, mas quando a câmera fica ensopada com o excremento do elefante só nos lembramos de "Quem Quer Ser um Milionário?", um dos vencedores do Oscar de melhor filme mais constrangedores de todos os tempos.

Conforme as carreiras de Torres e Nellie avançam, a de Jack Conrad começa a enfrentar sérios problemas. Numa cena de seu primeiro filme sonoro, temos uma imitação bem pobre de um dos momentos mais engraçados de "Cantando na Chuva", com seu personagem repetindo para a amada "I love you, I love you, I love you" da mesma forma que Gene Kelly o fazia.

Em outro momento, Nellie tem problemas para gravar o som de uma cena, e temos uma outra cópia barata de um outro momento importante do filme de 1952. Pela pobreza da encenação, essas duas cenas não servem como homenagem, nem como comédia.

O filme começa a crescer nos últimos 45 minutos, quando sentimos a valer o peso da decadência. Até lá, estamos no terreno da provocação e do mau gosto.

Numa época em que as pessoas se ofendem por qualquer coisa e não se chocam mais com nada, os cineastas parecem ter perdido o poder de chocar espectadores, realizando cenas tolas, que denotam uma índole infantil e por isso só devem —ou só deveriam— agradar adultos infantilizados.

Falamos muito da decadência do cinema. Talvez por isso essa arte tão complexa esteja recebendo uma série de homenagens em longas recentes. "Babilônia", por sua incapacidade, na maior parte do tempo, de suscitar qualquer pensamento mais profundo sobre o tema, contribui para essa decadência.

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