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Livro reúne poemas de Paulo Mendes Campos, grande nome da crônica

Obra, reunida pela Companhia das Letras, trafega por autoironia, o sentimento de absurdo e os detalhes do cotidiano

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Reynaldo Damazio

Editor, crítico literário e tradutor, é autor de 'Movimentos Portáteis'

São Paulo

O mineiro Paulo Mendes Campos talvez seja mais conhecido por suas crônicas, reunidas nas coletâneas "O Anjo Bêbado", "Os Bares Morrem numa Quarta-feira" e "O Amor Acaba", entre outras, mas seu livro de estreia foi de poemas, "A Palavra Escrita", de 1951, quando o autor tinha 29 anos e trabalhava em jornais cariocas, como redator e cronista.

Associar o nome de Campos à crônica é mais do que justo, uma vez que ao lado dos companheiros de geração Otto Lara Resende, Helio Pellegrino e Fernando Sabino, foi um dos responsáveis por dar a esse gênero literário, erroneamente considerado "menor", um tratamento poético e filosófico, associando reflexão existencial e coloquialidade, sempre com muita graça e leveza.

O poeta, escritor e jornalista mineiro Paulo Mendes Campos - Derly Marques/Folhapress

Ainda que seu primeiro livro tenha surgido no contexto da chamada Geração de 45, marcada pelo apego excessivo às formas fixas, ao tom elevado e a uma perspectiva lírico-metafísica, os poemas de Campos estão mais próximos dos modernistas, especialmente os da segunda geração, como o seu conterrâneo Carlos Drummond de Andrade.

Os poemas de Paulo Mendes Campos, que agora ganham uma antologia completa, trafegam com desenvoltura e argúcia pela autoironia, o sentimento de absurdo sobre a realidade, a atenção para os detalhes do cotidiano, para as pequenas coisas, e a delicadeza extrema de imagens que revelam ao mesmo tempo a beleza e a fragilidade do que entendemos por estético, mesmo quando usa o soneto, a métrica ou o poema longo.

Prevalece em geral uma hesitação nas entrelinhas, na base mesmo da metáfora —"esta paixão de destruir-me à toa". Como se o autor estivesse se deixando levar pelas palavras, guiado por seu ritmo, ou seduzido por sua coreografia.

O poeta, às vezes, parece um ser esquisito, inquieto e meio desajustado por natureza, porque encara a linguagem com paixão e muitas dúvidas, ou como um ritual de passagem —"foi através da literatura que recebi a vida/ e foi em mim a poesia uma divindade necessária".

Essa divindade apontada no poema é também o disfarce do tempo e dos intervalos entre o que permanece e o efêmero. "O instante basta para compreender a vida. Senti-la é o princípio de uma eternidade."

No inventário lúdico e lúcido de experiências pessoais e históricas que acompanhamos no livro de Paulo Mendes Campos, também estão registrados alguns marcadores da melhor poesia brasileira da segunda metade do século 20, como o desconforto com o mundo pós-Guerra e com o país pós-ditadura, o diálogo com as múltiplas tradições poéticas, incluindo as vanguardas futurista e surrealista, o trânsito entre brevidade e extensão, o aforisma e a eloquência, a tradução como exercício criativo.

Em suas escolhas como tradutor, percebemos o apreço de Paulo Mendes Campos pela diversidade de vozes e estilos, embora seja visível alguma familiaridade entre os autores escolhidos.

Ele traduziu livros importantes de Pablo Neruda —"Residência na Terra" e o caudaloso "Canto Geral"— além de poetas tão diversos quanto interessantes, como Whitman, Yates, Blake, Borges, Joyce e Eliot. Num de seus poemas, sobre domingos, o autor se apropriou do verso emblemático de Emily Dickinson —"o mistério de morrer pela beleza", ou "I died for Beauty", no original.

Os poemas de Paulo Mendes Campos ajudam a entender a sutileza e o refinamento de suas crônicas, o cuidado amoroso na tessitura de cada verso ou frase, e vice-versa.

Poesia

  • Preço R$ 119,90 (512 págs.); R$ 44,90 (ebook)
  • Autoria Paulo Mendes Campos
  • Editora Companhia das Letras
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