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'A Morte do Demônio: A Ascensão' não resgata o humor de 'Evil Dead'

Primeiro filme da franquia que se passa na cidade faz comentário desastrado e conservador sobre maternidade

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A Morte do Demônio: A Ascenção

  • Quando Estreia nesta quinta (20) nos cinemas
  • Classificação 18 anos
  • Elenco Alyssa Sutherland, Lily Sullivan e Morgan Davies
  • Produção EUA, 2023
  • Direção Lee Cronin

Jatos de sangue, desmembramentos e uma motosserra são alguns dos elementos obrigatórios do universo de "Evil Dead" —aqui traduzido como "Uma Noite Alucinante"—, inaugurado em 1981 pelo diretor Sam Raimi. O novo "A Morte do Demônio: A Ascensão" tem todos esses elementos, mas falta a irreverência típica do cineasta, que só assina a produção executiva, junto do ator Bruce Campbell.

Muito antes de dirigir a primeira trilogia de "Homem-Aranha" e de cair no alçapão da Marvel com "Doutor Estranho no Multiverso da Loucura", Raimi era apenas um jovem cinéfilo que fazia filmes com os amigos e que, apesar dos orçamentos baixíssimos, acabou criando uma combinação ímpar de comédia pastelão e terror sangrento.

Cena do filme 'A Morte do Demônio: A Ascensão' - Divulgação

Com efeitos práticos e sequências em stop-motion, o primeiro "Uma Noite Alucinante" foi exibido no Festival de Cannes de 1982 e, graças a uma crítica elogiosa de Stephen King, teve os direitos de distribuição vendidos para a New Line Cinema. Com uma produção de apenas US$ 375 mil, faturou milhões pelo mundo e ganhou duas sequências dirigidas por Raimi.

Nos cinemas, "A Ascensão", escrito e dirigido pelo irlandês Lee Cronin, não é a primeira tentativa de revitalizar a franquia. Em 2013, a versão do diretor uruguaio Fede Álvarez, também escalado para fazer um novo "Alien", já era bem mais sisuda e pesada. O pretexto, então, para o grupo de amigos se isolar numa cabana no meio do mato era ajudar uma das personagens a superar o vício em drogas, numa abstinência forçada.

Desta vez, há sim uma breve abertura com jovens numa cabana —quem diria que o demônio seria fã de Emily Brontë?—, mas toda a ação se passa, pela primeira vez, num prédio bem no meio da cidade. Interpretada por Lily Sullivan, Beth descobre uma gravidez indesejada e vai visitar a irmã Ellie, papel de Alyssa Sutherland, em busca de ajuda.

Ellie vive com os três filhos, os adolescentes Danny e Bridget e a pequena Kassie, num prédio que será demolido. Na noite em que Beth chega, um terremoto abre um buraco na garagem que leva até o cofre subterrâneo de um antigo banco. Danny encontra o "Livro dos Mortos" coberto de crucifixos e medalhas de santos, e um velho disco de vinil que invoca o tinhoso —qual um LP da Xuxa tocado ao contrário.

O deslocamento para um cenário urbano, num prédio com o elevador quebrado e a escadaria destruída pelos tremores, é uma boa novidade para aqueles que, quando assistem um filme de terror, não conseguem se identificar com as vítimas pois jamais passariam a noite num lugar desolado. É mais assustador imaginar que o mal está presente em qualquer parte —e mais claustrofóbico limitá-lo a um espaço interno.

Com olhar intenso e o sorriso largo de uma Julia Roberts maligna, Sutherland tem feições perfeitas para encarnar um demônio sádico. Outros possuídos já não causam tanto impacto, mas há cenas aflitivas tanto de suspense, com ameaças que se aproximam em segundo plano, como de sanguinolência —uma, em especial, usa um ralador de queijo.

Infelizmente, "Ascensão" decide fazer um comentário desastrado sobre maternidade, já que a nova regra do chamado pós-horror determina que filmes de terror abordem temas sérios. Há uma cena em que o demônio encosta a cabeça na barriga de Beth e, com uma superaudição, escuta os batimentos cardíacos do feto e exclama: "Duas almas?!"

A cena lembra projetos de lei, inspirados em normas em vigor na Hungria, que obrigam gestantes, inclusive vítimas de violência sexual, a ouvir o coração do feto antes de realizar um aborto legal, com o propósito de convencer a pessoa a não levar o procedimento adiante —ideia bastante defendida pela extrema direita de vários países, inclusive o Brasil.

Como se não bastasse a falta do humor caótico que tornou "Uma Noite Alucinante" tão especial, e o uso de computação gráfica numa franquia que nasceu improvisando a partir da falta de recursos, este novo filme também pode servir como argumento conservador.

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