Descrição de chapéu Moda

Na São Paulo Fashion Week, alfaiataria é roupa para escritório ou pista de dança

Igor Dadona e Gefferson Vila Nova reinventam costura clássica, e Patricia Vieira mostra looks cintilantes na passarela

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São Paulo

Igor Dadona iniciou a quinta-feira (25) na São Paulo Fashion Week, ou SPFW, apresentando a coleção masculina "Colosso". O designer mesclou a alfaiataria clássica com o desejo por uma festa elegante. Os modelos —todos com glíter prateado no rosto e joias cintilantes da Swarovski— usaram peças que misturam a seriedade e a elegância dos escritórios com o lúdico.

Camisas brancas decoradas com bolinhas pretas e calças conviveram em harmonia na passarela com shorts, por exemplo. O vermelho exuberante de suéteres com um círculo aberto no peito, casacos de lã tweed ostentando texturas vívidas e suéteres com abotoados brilhantes também apareceram.

Desfile de Igor Dadona na São Paulo Fashion Week edição 55
Modelo desfila para Igor Dadona na São Paulo Fashion Week - Marcelo Soubhia / @agfotosite

As cores onipresentes foram preto, bege, branco, marrom, cáqui e cinza. E a vibe onipresente foi a da roupa versátil —seja no escritório ou na pista de dança, a alfaiataria permanece elegante mesmo quando assume contornos lúdicos.

Se você ainda tem alguma dúvida a respeito da alfaiataria como "o" fio condutor das tendências atuais, a estreia de Gefferson Vila Nova poderia encerrá-la facilmente. O estilista galvanizou a plateia —que contou com a presença de Sabrina Sato na fila A— com uma coleção inspirada no paisagismo de Roberto Burle Marx e a arquitetura modernista de Oscar Niemeyer.

As peças de alfaiataria seguem a linha minimalista e elegante do "quiet luxury", em que branco, preto, azul marinho, creme e off white propõem relaxamento e casualidade em meio à natureza.

Calças ou shorts e regatas estilizadas com furos de diferentes dimensões ocuparam a passarela acompanhados de chapéus de palha, sandálias Havaianas, correntes decorando bolsos e cinturas.

Falando em bolsos, eles foram onipresentes, em ambos os lados do peitoral, em camisas de manga curta e longa —e frequentemente com estampas de plantas. A textura dominante foi lisa, embora algumas peças de lã fina tenham comparecido, assim como listras e xadrez, usados ou não em sobreposições.

A fluidez, seja a dos movimentos do corpo ou a de gênero, também foi contemplada pela coleção. Ao fim do desfile, Vila Nova caminhou pela passarela sob o ruído estrondoso de aplausos de uma plateia conquistada.

Mais tarde, a coleção de Patricia Vieira —estilista especializada em couro cortado a laser e de aparência metalizada— foi incendiária, o que talvez explique a sala lotada e a disputa por lugares, mas não a entrada desorganizada.

Modelos brancas e negras, além de uma trans, uma grisalha e uma plus size, ao som de Mutantes e Rita Lee, exibiram looks que cintilaram à meia-luz da passarela e realçaram diferentes modos da beleza feminina ser expressa.

Vermelho, rosa, verde e preto ganharam vida em vestidos, saias de diferentes comprimentos, calças e conjuntos adornados com flores e plantas texturizadas no tecido. Um deslumbrante vestido dourado, rente ao corpo da modelo negra, elevou o burburinho na plateia a reações sonoras.

Destacam-se também um conjunto preto com uma calça skinny e um casaco que se sobrepõe a um top, bem como outros conjuntos, um azul e outro rosa, com saias listradas que mostraram não existir o impossível na imaginação da estilista.

Desfile de Patricia Vieira na São Paulo Fashion Week 55
Desfile de Patricia Vieira na São Paulo Fashion Week 55 - Marcelo Soubhia/ @agfotosite

Ela encerrou o desfile impressionando a plateia com um vestido de noiva com um véu longuíssimo e estilizado com botões de flores. Como se a modelo fosse sua noiva, Vieira entrou na passarela usando seu característico jaleco branco e de braços dados com a modelo. A estilista chorou ao ser aplaudida. O casamento, como se viu, foi da estilista com o desfile mais exuberante até o momento.

A passagem de Patricia Vieira pela SPFW foi também uma espécie de investigação sobre as personalidades possíveis da mulher contemporânea —mas não foi fácil deixar de lado o fato de que aquelas lindas peças também eram restos de bicho morto.

Por outro lado, depois a temperatura foi abaixo do zero com o desfile da TA Studios, marca do Rio de Janeiro fundada por Gih Caldas. A coleção "Empinando Pipas e Sonhos", pelo visto, é um bocado pessoal para a autora. "Nasci grande, mas me fizeram pequena", afirma um manifesto lido antes do desfile. "Pobre de posses, espírito e vida." As roupas remeteriam, então, a uma infância a ser repensada.

A coleção, portanto, simboliza uma projeção otimista para o futuro, mas as caras de ponto de interrogação na plateia mostram que a estilista talvez tenha embarcado sozinha nessa. Saias, calças e camisas cortadas de maneira que remete à forma geométrica de uma pipa foram ofuscadas por perucas vestidas pelos modelos —mais se pareciam aranhas com longas patas apontando em todas as direções. Muitos usaram pipas nas costas como se fossem mochilas.

Desfile da TA Studios na São Paulo Fashion Week 55
Desfile da TA Studios na São Paulo Fashion Week 55 - Ze Takahashi/ @agfotosite

Destacaram-se camisas e calças pretas decoradas com pontinhos coloridos —e, mais uma vez, a alfaiataria foi fundamental. O streetwear foi contemplado. Um modelo asiático sem camisa, exibindo o corpo musculoso e todo tatuado, chamou atenção ao andar pela passarela com uma mochila nas costas e uma calça bege de alfaiataria com um quê da linguagem urbana.

Mais tarde, o desfile do Projeto Ponto Firme a céu aberto no Copan, no centro da capital paulista, só fez aumentar a sensação de bloquinho de Carnaval da apresentação dos looks assinados por Gustavo Silvestre. Foi uma explosão de cor, brilho e formas lúdicas —e com muita pele à mostra.

O tesão acumulado durante o distanciamento social da pandemia parece de fato ter encontrado uma linguagem de expressão na moda.

O atraso de quase meia hora em nada pareceu ter ofuscado o que se viu na passarela —uma profusão de paetês e crochês multicoloridos feitos à mão. Onipresente neste desfile, uma estrutura de fios costurados à mão formava uma espécie de rede que cobria, mesmo que apenas parcialmente, o corpo deles. Os vãos entre as costuras formavam as deixas para a exposição dos corpos.

Desfile da marca Ponto Firme, durante a SPFW, no Copan - Adriano Vizoni/Folhapress

Assim, Silvestre construiu looks compostos por calças, shorts, saias e vestidos extravagantes que contrastavam com a expressão insolente no rosto dos modelos —que muitas vezes usavam óculos escuros e penteados angulosos. Homens usaram vestidos de às vezes só uma manga e mangas de peças superiores foram adornadas com uma torrente de tiras de plástico preto.

Todos os modelos calçaram sandálias Rider, alternando entre plataforma e sola baixa, alguns vestiram chapéus, muitos ostentaram acessórios em arranjos elaborados e por vezes exóticos. Brincos e piercings adornaram orelhas e um acessório inusitado, pendurado no septo dos modelos, parecia um morcego dourado cobrindo a boca deles.

Não é necessário ter um olhar sutil para perceber a afirmação política na coleção apresentada pela Ponto Firme. As formas ambíguas que permitem a fluidez de gênero e a presença de uma modelo com síndrome de Down, de corpos plus size e de diversidade racial mostram o que é uma festa colorida de verdade para o designer.

O Ponto Firme apoia, em seu esquema de produção, detentos, ex-detentos, pessoas trans em situação de vulnerabilidade, imigrantes e pessoas resgatas de situações de trabalho análogo à escravidão. Ao caminharem pela passarela, esses colaboradores de Silvestre foram tão aplaudidos quanto os modelos —que, por sua vez, se uniram em uma escadaria para um close final, assim enfeitando o cenário cinzento e bruto do centro.

No que depender da Meninos Rei, o racismo é uma história do passado e a única coisa a ser resgatada de lá é a ancestralidade africana. Assim, a etiqueta fundada pelos irmãos Junior e Céu Rocha, vindos da periferia de Salvador, envolveu o Komplexo Tempo em um universo de cores e formas extravagantes e propulsivas para celebrar legados e imaginar futuros possíveis. A reação do público não nega que o desfile foi o mais emocionante do dia.

Ele foi aberto por uma cantora dando um novo significado a um famoso verso cantado por Elza Soares, "a carne mais barata do mercado é a carne negra". "Não é mais", complementou a cantora na passarela.

Por meio da proposta da alfaiataria, blusas, vestidos, saias e calças serviram de tela para cores explosivas em formas confortáveis e fluidas. A estética fundamental foi a do afrofuturismo —quase toda a apresentação parecia ter vindo direto de um videoclipe de Grace Jones ou de uma cena de "Pantera Negra". O streetwear e a sensualidade também nortearam as criações vestidas por modelos majoritariamente negros.

Estampas de oncinha em mangas bufantes, sobretudos com mangas abertas, ombreiras angulosas e casacos com decotes amplos deixaram a plateia em polvorosa. Grafismos e geometrias em preto-e-branco, por sua vez, neutralizavam o colorido exagerado em composições sobrepostas. Um número de dança feito por uma mulher em um vestido vermelho de silhuetas generosas foi de tirar o fôlego. "Deixa a gira a girar", afirmava a música ao fundo. A mulher girou em seu eixo, balançou o vestido e a cabeleira afro enquanto sorria. Foi tão brilhante quanto os colares e brincos circulares dourados que complementavam os looks.

Cabelos crespos arranjados em ângulos ou sem nenhum enquadramento geométrico proporcionaram cenas memoráveis, enquanto peitorais e barrigas expostos afirmaram que a pele preta também é quente.

Enquanto acarajés eram preparados no vídeo exibido nos telões, uma história de pertencimento se desdobrava diante da plateia. A apresentadora Astrid Fontenelle e seu filho de 14 anos, Gabriel, caminharam juntos na passarela. Ela branca e ele negro, ambos desfilaram de mãos dadas. Outra figura da TV, o apresentador Manoel Soares, todo sorridente, foi recebido sob aplausos e assobios, assim como mãe e filho antes. A cantora Marvvila e o ator Samuel Assis são outros famosos que compareceram.

Modelos brancos, grisalhos, com vitiligo, PCD, plus-size e com síndrome de Down também tiveram presença. Para Júnior e Céu Rocha, a democracia racial é um terreiro de portas abertas. Ao fim, uma mulher negra e velha, vestida como uma mãe de santo, monopolizou os olhares e a passarela apenas para si. Trajando peças brancas, sobrepostas e ornamentadas com flores vermelhas, ela se sentou em um trono. Uma utopia africana ganhou corpo nessa cena.

A semana de moda de São Paulo segue até domingo (28), com desfiles ocupando diversos locais da capital paulista. Um dos desfiles mais esperados é o de Walério Araújo, que mostrará uma coleção em homenagem a Elke Maravilha.

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