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Mulheres afegãs fogem do país com medo do retorno do Taleban
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TRACY MCVEIGH
DO "GUARDIAN"
Uma fuga de cérebros já está ocorrendo no Afeganistão: mulheres jovens vêm deixando o país antes da retirada das forças ocidentais em 2014, o que muitos temem venha a acarretar um recuo quanto aos direitos femininos.
A falta de compromisso do governo afegão para com a igualdade e medidas que restrinjam os maus tratos a mulheres em casa e no trabalho está gerando medo real de que elas sejam relegadas a uma posição inferior na agenda política, em meio à disputa de poder que deve surgir quando as forças da Organização para o Tratado do Atlântico Norte (Otan) deixarem o país.
Kamal Kishore/Reuters | ||
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Mulheres afegãs aguardam, com seus filhos no colo, transporte em ponto de ônibus de Cabul |
O agravamento da situação de segurança para os civis --as baixas entre os afegãos comuns vêm crescendo a cada ano, desde 2007, com 3.021 mortos em 2011, e as mulheres respondem por parcela desproporcional das vítimas-- fez com que muitas mulheres e meninas abandonem a educação e a força de trabalho e fiquem em casa, de acordo com Guhramaana Kakar, que assessora o presidente Hamid Karzai sobre questões de igualdade entre os sexos.
Falando ao "Observer", Kakar afirmou que as negociações entre o governo e o Taleban e outros grupos insurgentes desconsideravam as questões femininas. Uma recente pesquisa da organização assistencial ActionAid sugere que 86% das mulheres afegãs temem o retorno de um regime ao estilo do Taleban. Uma em cinco das entrevistadas se preocupa com a educação de suas filhas, mas 72% afirmam que suas vidas são melhores hoje do que há uma década.
"As mulheres desejam que o progresso realizado nos dez últimos anos continue, mas estão sendo alijadas do processo político", diz Kakar. "Todos os afegãos, homens e mulheres, desejam um país sem tropas estrangeiras, mas acredito que a comunidade internacional deveria colocar as mulheres na agenda e garantir que sua segurança e liberdades sejam garantidas, de maneira direta e indireta".
Ela criticou a recente conferência da Otan em Chicago por ter ignorado completamente a questão. "As mulheres sofrem assédio constante no trabalho, são exploradas, e o crédito por suas realizações é dado aos homens; elas também continuam a ser alvo para os insurgentes por irem trabalhar ou à escola. Em termos de segurança, são elas que mais sofrem, e mesmo em casa estão sujeitas à violência e a abusos tacitamente sancionados pelos tribunais e pelo governo".
Musadeq Sadeq/Associated Press |
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Mulheres afegãs conversam com um vendedor no centro de Cabul, capital do Afeganistão |
Kakar tem participado das negociações de paz com o Taleban e acredita que mais mulheres deveriam ser autorizadas a ingressar no sistema político. "Temos muitas mulheres no Legislativo, mas os papéis que desempenham são menores. Temos mulheres de muita coragem, que vêm conquistando respeito e em alguns casos merecem mais confiança que os homens como negociadoras, porque são vistas como portadoras de menos bagagem política".
"Se mais mulheres fossem admitidas aos conselhos provinciais e de paz, isso serviria como forte demonstração aos insurgentes de que eles não poderão reverter dez anos de avanços na situação da mulher", acrescentou.
O nível crescente de violência contra as mulheres e a desconsideração de muitos tribunais à proteção legal que deveriam receber têm resultado em histórias horripilantes de estupro de meninas e seu posterior aprisionamento por adultério, e de ataques a professores que lecionam para meninas. Melanie Ward, diretora de assuntos públicos da ActionAid, disse que a situação de segurança representava imensa ameaça às mulheres.
"A experiência nos diz que uma intensificação dos ataques contra as mulheres serve como sinal inicial de que o Taleban está reconquistando o controle de uma região".
"A segurança para as mulheres não pode ser dissociada do quadro mais amplo de segurança no Afeganistão", disse.
FUTURO
Selay Ghaffar, presidente-executiva da ONG Humanitarian Assistance for the Women and Children of Afghanistan, diz que muitas jovens estão deixando o país. "Não veem futuro para elas no Afeganistão, e por isso as mais inteligentes procuram bolsas de estudo ou empregos no exterior. Duas escolas para meninas foram queimadas perto da capital; nos últimos dias, houve ataques com ácido contra meninas que estavam indo à escola, e acontecem cada vez mais incidentes de estupro e sequestro".
"Muitos representantes de ONGs que tentam ajudar mulheres foram mortos. Bilhões de dólares em assistência internacional foram fornecidos ao Afeganistão e terminaram nos bolsos de políticos homens, enquanto as mulheres não podem se sentir seguras em sua terra. Para aquelas que não têm como partir, é uma situação que as força a não sair de casa. Muitas mulheres estão deixando de trabalhar", afirmou.
"Nos primeiros anos depois da chegada das tropas internacionais, muitas coisas mudaram no Afeganistão", ela diz. "Houve progresso e mudança positiva nas vidas cotidianas de muitas mulheres afegãs. Infelizmente, desde 2007, as coisas mudaram dramaticamente, com avanço na insegurança e na discriminação contra as mulheres em todos os níveis. A vida se tornou mais difícil para as mulheres mas elas não querem ser confinadas à velha caixa".
"Por que todos os planos para o futuro do Afeganistão ignoram metade de sua população?", questiona Ghaffar.
Tradução de PAULO MIGLIACCI.
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