Régis Bonvicino adianta poemas do álbum 'Deus Devolve o Revólver'

Obra será lançada em fita cassete, mídia digital e livro no próximo ano

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Régis Bonvicino

[SOBRE O TEXTO] Os poemas nesta página fazem parte do álbum “Deus Devolve o Revólver”, composto de 24 áudios, com 16 poemas inéditos. O álbum estará disponível em formato físico, em fitas cassete acompanhadas por um libreto, e digital (via Spotify e iTunes, entre outros). O material comporá o livro “A Nova Utopia”, a ser lançado em 2020 pela editora Hedra.

Haiku

Pedra no cachimbo
Estação da Luz: porrada
Verão, sol lilás

Pedra, narguilé
Doce como mel: porrada
Verão, o sol âmbar

É o Incrível Hulk
Um avião nos pés: porrada
Janeiro, sol púrpura

Uns tragos na lata
De asas já nos pés: porrada
Março, sol turquesa

Cachimbo, cristal
Braços alados, porrada
Março, um raio fúcsia

Lata sem anel
O anu bica o olho do noia
Isqueiro na dobra

Pedra no cachimbo
Arco-íris nos pés, porrada
Dezembro, sol sépia

Canudo, Yakult
Mãos lixam o céu, porrada
Março, sol magenta

Cachimbo na roda 
Garras de tigre, porrada
Janeiro, sol jade 

Em nome de Buda,
Nada obstante uma brisa
Verão, sol sem cor

Cavalo, porrada
O tubo de pvc
Outono, sol ágata

desenho de homem desfigurado
Ilustração - Rodrigo Dário

Hic jacet lepus

Perto de uma sinagoga, enquanto 
o faxineiro varre a entrada do prédio,
um catador, velho, de barba rala,  
pega uma latrina na caçamba 

Outro catador, boné branco, 
“ulalá” grafado em azul acima da aba, 
dois dentes podres à vista, 
repete em voz alta: “o lixo é sujo”

Na banca, uma tevê: ataques na Síria
bombas na cara dos civis
Outro sucateiro, de mãe talvez zíngara,
saco plástico preto, aberto, percorre a calçada

latas vazias de Pepsi, Coca, cerveja
pede na lanchonete, no self-service, no bistrô
Na saída do shopping militantes coletam assinaturas para 
um manifesto em favor das abelhas,

ágora na hora da xepa, 
um santinho da Virgem colado no poste
um garoto negro, quase no ponto de ônibus,
um par de baseados no bolso,

é preso em flagrante, por tráfico?
leva porrada na rua, ora pro nobis
camburão, algemas
deus devolve o revólver


Régis Bonvicino é poeta, tradutor e crítico literário.

Ilustração de Rodrigo Dário, artista visual.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.