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Coronavírus

Adesão à aliança liberal-miliciana de Bolsonaro degringola

Moro acaba de ser defenestrado, e Covid-19 precipita descontrole da virose bolsonarista

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[RESUMO] Jornalista afirma que adesão de elites econômicas ao governo Bolsonaro, capitaneada pela agenda do Estado mínimo e de combate à corrupção, se deteriora a cada surto presidencial. Brasil está na retaguarda do planeta e continua buscando saídas no passado.

A adesão de amplos setores da elite empresarial, de economistas abduzidos pelo mercado financeiro e de parte considerável de analistas da mídia à perspectiva de que o governo de Jair Bolsonaro, “liberal na economia e conservador nos costumes”, fosse entregar alguma coisa de aproveitável para o país vai se corrompendo em ritmo de virose galopante.

Os sinais de que a aliança liberal-populista alt-right tupiniquim (que logo se revelou, na realidade, uma perigosa e insustentável aliança liberal-miliciana) iria degringolar já eram evidentes a quem quisesse ver —e antes da pandemia.

Um misto de "wishful thinking" e antiesquerdismo arraigado e patológico tentou sustentar a duras penas, até há pouco, o raciocínio enviesado de que o presidente não passaria de um ator quase folclórico e até mesmo inofensivo, uma vez que perfeitamente controlável pelas instituições.

Suas escaramuças para ofender cotidianamente os valores democráticos, a cultura e a ciência seriam bravatas toleráveis, em nome da agenda do Estado mínimo e do combate implacável à corrupção que seria implementada pelos “superministros” Moro e Paulo Guedes. O primeiro acaba de ser defenestrado. O segundo está indo para a marca do pênalti.

Restaria ainda, como última linha de defesa da racionalidade a presença militar. Eita. Que infeliz retorno este das Forças Armadas à cena politica!

O ornitorrinco bolsonarista veio a substituir o plano original de entregar o poder à direita de sempre (chamada de centro) após uma crise crise política sem precedentes, precipitada pela incompetência do PT, a farra corrupta de todos os partidos, o lavajatismo decorrente e a aventura golpista, embelezada pela fomalidade institucional, que resultou no impeachment.

Depositou-se em Michel Temer, o mordomo do establishment, e em sua ponte para o futuro (que mesmo FHC, apoiador da coisa, bem chamou de pinguela), a missão de levar o país ao reino encantado do liberalismo, como se fora ele o arauto de uma revolução americana tropical. Bananas ao vento.

Bolsonaro poderia, de fato, dar certo, no sentido errado —e considero que ainda poderá, se por isso entendermos a possibilidade de o capitão vir a ser reeleito. Não podemos jamais duvidar da incompetência da esquerda, da burrice do eleitorado e do arrivismo do mercado, com seus velhos e joviais representantes “peroba neles”.

Seria desejável, entretanto, e há condiçõs para isso, que uma articulação minimamente civilizada, que precisará unir esquerda e direita, se estruturasse em nome de um país que possa mostrar alguma vergonha na cara. Mesmo um governo atrasadão de direita com vernizes democráticos hoje parece um bálsamo.

Podemos, no entanto —e deveríamos, por favor— ser mais ambiciosos. O Brasil está na retaguarda do planeta. Continuamos querendo encontrar saídas no passado, seja ele o do liberalismo reaganista superado ou do velho esquerdismo nacional-popular.

Os tempos mudaram, mas nosso país, como Carolina, não viu. O futuro mais uma vez vai passando pela janela, diante de nossos olhos tristes, que guardam tanta dor.


Marcos Augusto Gonçalves é editor da Ilustríssima e editorialista da Folha.

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