Reação antiglobalização pode ter raiz na xenofobia, diz diretor da OMC
Salvatore Di Nolfi - 30.mai.2016/Associated Press | ||
Diretor-geral da Organização Mundial de Comércio, Roberto Azevêdo |
O brasileiro Roberto Azevêdo, diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), está preocupado com o crescente movimento antiglobalização.
"Esse sentimento antiglobalização vem muitas vezes associado à intolerância e à xenofobia. A história mostra que se perde o controle dessas coisas com muita facilidade", disse Azevêdo, evitando referir-se diretamente a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos.
Em entrevista à Folha na semana passada, antes de a China abrir um processo contra EUA e União Europeia por não reconhecerem o país como economia de mercado, ele disse que o novo status do país asiático vai trazer muitas disputas à OMC.
Folha - A OMC projeta um crescimento do comércio global de 1,7% neste ano –o menor desde 2009. Qual é a perspectiva para 2017?
Roberto Azevêdo - Alguns indicadores recentes, como número de cargas contratadas e seguros de transporte, indicam uma melhora muito modesta.
Há vários elementos reduzindo o ritmo do comércio, mas o ponto central é um crescimento muito fraco da economia global.
Outro fator importante é a mudança do modelo de crescimento chinês, que era voltado ao comércio exterior e agora está priorizando o mercado doméstico.
O discurso antiglobalização prevaleceu em eleições importantes, como no "brexit" (saída do Reino Unido da UE) e na vitória de Donald Trump. É uma nova onda protecionista?
Não é exatamente protecionismo. Existe um sentimento antiglobalização e o comércio entra nessa onda. Mas esse sentimento é mais profundo, porque abarca fluxos migratórios e importação de cultura estrangeira.
Isso é muito preocupante, porque esse sentimento antiglobalização vem muitas vezes associado à intolerância e à xenofobia. A história mostra que se perde o controle dessas coisas com muita facilidade.
Houve uma revolta da classe média branca nos países ricos. A globalização gera desemprego?
A globalização, em si, não. Mas há uma mudança estrutural no mercado de trabalho, provocada por inovação tecnológica e produtividade.
Recepcionistas não são mais necessárias por causa da automação. As livrarias estão fechando, e as vídeo locadoras não existem mais.
Outro exemplo é o automóvel sem motorista. Quando essa tecnologia entrar no mercado para valer, haverá um enorme número de motoristas profissionais com o emprego em risco. Só nos EUA são 3,5 milhões de motoristas de caminhão.
Não tem nada a ver com globalização. Nas economias avançadas, boa parte da tecnologia é desenvolvida internamente. Impedir importação não resolve o problema.
Com a vitória de Trump, o TPP (Parceria Transpacífico) e o Nafta estão em xeque. A própria União Europeia vem sendo questionada. Os acordos comerciais perderam força?
Esses acordos são muito diferentes, mas o motivo da rejeição é mais ou menos o mesmo: a preocupação com uma integração econômica muito grande e rápida, sobretudo quando existe fluxo de pessoas.
O Reino Unido está se separando da UE sobretudo por questões migratórias, mas a agenda deles não é protecionista. É diferente de outros processos em que existe uma preocupação de desequilíbrio nas contas comerciais (relação entre EUA e países da Ásia).
Ainda é cedo para dizer qual vai ser a consequência de tudo isso, mas não dá para dizer que o plurilateralismo está inviabilizado.
Trump disse que vai taxar em 35% as importações de empresas americanas que migrarem para o exterior –uma medida que viola as regras da OMC. A entidade está pronta para punir os EUA?
Prefiro não especular sobre o que poderá ser feito. Em várias eleições já ouvi muita coisa que não foi implementada. Então prefiro ver que tipo de política comercial e de investimentos vai ser colocada em vigor para avaliar seu impacto sistêmico.
No domingo (11), expirou a cláusula que garantia aos países o direito de discriminar os produtos chineses, mas ainda há muitas dúvidas. A China é uma economia de mercado?
Há diferentes interpretações jurídicas do protocolo de entrada da China na OMC. Cada país vai decidir como interpreta o texto do protocolo e que tipo de ação precisa tomar em razão disso.
É claro que isso pode gerar muita disputa na OMC, porque é um tema muito sensível para todos os países, inclusive para a China.
Com Temer, o Brasil busca acordos bilaterais em detrimento da OMC. O que isso significa para a entidade?
É possível ir para o bilateral, plurilateral, multilateral. A opção por todos esses caminhos é válida e deve ser perseguida, porque é o que todos países fazem.
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