Disputa entre órgãos estatais sobre leniência gera insegurança jurídica
Lula Marques - 18.abr.2009/Folhapress | ||
Fachada do TCU, em Brasília |
A experiência mais recente acerca do Estado brasileiro mostra-nos uma singularidade. É que convivem no âmbito estatal vários centros de gravidade, cada qual se orientando por interesses próprios, o que contribui para o comprometimento da centralidade e unidade do poder.
Esse paradoxo encontra diferentes formas de expressão, que tendem a trazer sérias consequências para a sociedade. Uma delas está materializada hoje na disputa corporativista de vários órgãos estatais pelo protagonismo na celebração dos acordos de leniência, cada qual se orientando por premissas muitas vezes conflituosas entre si.
Com efeito, Ministério Público, Ministério da Transparência, Controladoria-Geral da União, Advocacia-Geral da União e Tribunal de Contas da União estão, pelo menos no discurso formal, buscando enfrentar o tema da moralidade administrativa.
Na medida, contudo, em que lhes falta uma diretriz comum, expressão de uma centralidade de poder, agem com enorme carência de racionalidade, retirando do acordo de leniência toda a sua potencialidade transformadora do status quo, que vem expressa nos próprios objetivos legais do instituto, isto é, permitir, a um só tempo, que as empresas que tenham cometido, por seus empregados e executivos, atos ilícitos de corrupção possam ressarcir o erário, fornecer informações e documentos que aparelhem novas investigações e implantar programas de integridade que orientem para o futuro de suas ações.
Na prática, o que se tem observado é um enorme embaraço e desestímulo à celebração dos acordos e mesmo o oferecimento de obstáculos à própria efetividade dos acordos já celebrados.
As consequências são visíveis. As investigações restam comprometidas, novas práticas, que poderiam estar orientadas por programas de integridade monitorados por órgãos responsáveis, não se implantam, e, por fim, o ressarcimento dos cofres públicos não se concretiza.
Dessa forma, a insegurança jurídica produzida francamente conspira contra a moralização que os acordos de leniência deveriam viabilizar se, antes de mais nada, fossem compreendidos como instrumentos de política de Estado.
SEBASTIÃO BOTTO DE BARROS TOJAL, advogado, negociou o acordo da UTC.
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OS GUICHÊS DA LENIÊNCIA
As opções para empresas e criminosos que aceitam colaborar com as autoridades
> MINISTÉRIO DA TRANSPARÊNCIA E CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU)
Alcance: Corrupção e fraudes em licitações públicas e contratos
Quem pode ser beneficiado: Somente empresas
O que o colaborador precisa entregar: Provas dos delitos investigados e identificação de todos os envolvidos nas irregularidades
Condições: O colaborador precisa ser o primeiro a denunciar, cessar a infração e cooperar plenamente com as investigações
Benefícios: Participar de licitações, contratar com o setor público, receber subsídios e crédito oficial, e redução de multa
Reparação: A Advocacia-Geral da União, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União podem cobrar reparação de danos aos cofres públicos
Riscos: As empresas continuam sujeitas a ações de improbidade e punição na área criminal
Quem já fez acordo: UTC
> CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA (CADE)
Alcance: Cartel e crimes contra a ordem econômica
Quem pode ser beneficiado: Empresas e pessoas físicas
O que o colaborador precisa entregar: Provas dos delitos investigados e identificação de todos os envolvidos nas irregularidades
Condições: O colaborador precisa ser o primeiro a denunciar, cessar a infração e cooperar plenamente com as investigações
Benefícios: Redução de multa e isenção de punição por crimes contra a ordem econômica, associação criminosa e fraude em licitações
Reparação: A Advocacia-Geral da União, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União podem cobrar reparação de danos aos cofres públicos, e outras vítimas do cartel podem buscar indenização
Riscos: Punição por outros crimes, como corrupção
Quem já fez acordo: Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Carioca, OAS e Setal
> BANCO CENTRAL E COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS (CVM)
Alcance: Infrações a normas do mercado financeiro e de capitais
Quem pode ser beneficiado: Pessoas físicas, bancos e empresas
O que o colaborador precisa entregar: Provas dos delitos investigados e identificação de todos os envolvidos nas irregularidades
Condições: O colaborador precisa ser o primeiro a denunciar, cessar a infração e cooperar plenamente com as investigações
Benefícios: Redução de multa e outras penalidades
Reparação: A Advocacia-Geral da União, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União podem cobrar reparação de danos aos cofres públicos, e investidores podem buscar indenização
Riscos: Punição na área criminal
Quem já fez acordo: Ninguém
> MINISTÉRIO PÚBLICO
Alcance: Corrupção, crimes financeiros e outros
Quem pode ser beneficiado: Empresas e pessoas físicas, em acordos de delação premiada
O que o colaborador precisa entregar: Provas dos delitos investigados e identificação de todos os envolvidos nas irregularidades
Condições: O colaborador precisa ser o primeiro a denunciar, cessar a infração e cooperar plenamente com as investigações
Benefícios: Participar de licitações e contratos e receber subsídios e crédito, além de redução de penas para pessoas físicas na área criminal
Reparação: A Advocacia-Geral da União, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União podem cobrar reparação de danos aos cofres públicos
Riscos: Declaração de inidoneidade pela CGU ou pelo TCU
Quem já fez acordo: Andrade Gutierrez, Braskem, Camargo Corrêa, Carioca, J&F, Odebrecht, Setal e outras
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