Descrição de chapéu inflação varejo

Antecipar pagamento é atrativo para loja

Emissores de cartão esperam reduzir custo do crédito 

Pessoas andam por rua comercial da capital gaúcha
Pessoas andam por rua comercial da capital gaúcha - Evandro Leal/Agência Freelancer.
Danielle Brant Anaïs Fernandes
São Paulo

A contrapartida para convencer comerciantes a trocar a opção mais popular pelo crediário com juros é a antecipação do pagamento do crédito aos lojistas, o que reduziria a necessidade da linha de antecipação de recebíveis.

Hoje, eles recebem em 30 dias. A ideia é reduzir para um prazo entre dois e cinco dias.

A expectativa do setor é que esse custo menor seja repassado ao consumidor sob a forma de produtos mais baratos. Mas os especialistas questionam se esse repasse, de fato, será feito.

Os lojistas vão argumentar que não estavam embutindo juros, que o preço era aquele mesmo. Não vamos ver essa redução ao consumidor, e o consumidor, se quiser parcelar, vai ter que pagar muito mais, afirma Juliana Inhasz, professora do Insper.

Livia Coelho, representante da Proteste, diz que o repasse de custo menor deve ser determinado por resolução. Se ficar em aberto, o consumidor estará à mercê do fornecedor. Ela critica o fato de os órgãos de defesa do consumidor não terem sido convidados a participar das discussões.

A adoção do crediário por lojistas também não é consenso. Roque Pellizzaro Junior, do SPC Brasil, administrado pela CNDL (Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas), diz que os comerciantes dificilmente deixarão de oferecer o parcelado sem juros só pela perspectiva de antecipação do pagamento.

O consumidor vai acabar optando pelo parcelado sem juros. Você não tem condições de fazer com que o consumidor aceite esse crediário, o benefício é muito pequeno, diz. A concorrência entre lojistas é alta. Basta que a loja ao lado continue vendendo em dez vezes sem juros para roubar minha clientela.

A CNDL se reúne nesta terça (20) com o ministro Henrique Meirelles (Fazenda) e o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, para discutir o tema e pedir para participar das discussões.

NOVA OPÇÃO

Para Ricardo Vieira, diretor da Abecs (associação das empresas de cartões de crédito), a proposta de criar um crediário é positiva, pois dá ao consumidor uma nova opção de pagamento.

Segundo ele, o próprio comerciante ajudará a explicar ao consumidor a nova modalidade de pagamento. A estimativa é que a alternativa esteja disponível no fim deste ano ou início do próximo,.

Para Juliana Inhasz, do Insper, a longo prazo, as mudanças podem melhorar a educação financeira do consumidor, mas questiona se o impacto será significativo.

Não existe parcelamento sem juros, as pessoas precisam saber disso. Mas daí a achar que elas vão tomar decisões mais conscientes a partir do novo crediário é um passo muito longo.

Ione Amorim, economista do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), diz que a nova proposta implica uma mudança de comportamento que pode levar tempo para o consumidor entender. Por muito tempo, ele foi estimulado a usar o parcelado sem juros, afirma.

Quem deve estar temeroso é o próprio mercado, porque as pessoas podem deixar de consumir, diz. 

Cartões tentam compensar novo rotativo, diz SPC

O esforço para tentar reduzir o uso do parcelamento sem juros no comércio brasileiro é uma tentativa de compensar as perdas com receita que os bancos tiveram após as mudanças no rotativo do cartão de crédito no ano passado, segundo a SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito).

Com a descontinuidade do rotativo do setor de pagamento, os bancos tentam fazer um redesenho da operação. Trata-se mais disso do que de uma melhoria para o consumidor, diz Roque Pellizzaro Junior, presidente do SPC Brasil, administrada pela CNDL (Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas).

Em abril de 2017, entraram em vigor as novas regras para o rotativo. O CMN (Conselho Monetário Nacional) proibiu os bancos de deixar os clientes no rotativo por mais de 30 dias.

O varejo se estruturou para oferecer o parcelado sem juros, e quem pagava a conta toda da inadimplência para os emissores, grosso modo, era o rotativo. A obrigação de ficar no rotativo por 30 dias fez com que o parcelado sem juros fosse repensado pelos emissores, afirma Pellizzaro Junior.

QUEDA DA SELIC

Para Cristina Helena Pinto de Mello, professora de economia do consumo da ESPM, a redução expressiva da taxa básica de juros no último ano também forçou os bancos a repensar suas estratégias e produtos.

Estamos aprendendo a viver com taxas de juros nominais mais baixas, afirma Mello.

Augusto Lins, presidente da Abipag (Associação Brasileira de Instituições de Pagamentos), também vê a mudança como forma de os bancos ampliarem suas receitas. A proposta induz o financiamento pelo consumidor a uma taxa muito maior que a da indústria de varejo, diz.

O resultado disso é que haverá um volume colossal de recursos hoje direcionados ao consumo que serão desviados para o pagamento de juros a bancos, afirma. Parece uma grande manobra para aumentar o parcelamento com juros que os bancos recebem.

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