O Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) anulou, após suspeitas de corrupção, o julgamento de um processo que livrou o BankBoston de pagar dívida com a Receita Federal. Em valores atualizados, segundo investigadores do caso, o débito alcança R$ 750 milhões. 

A Operação Zelotes indicou que integrantes do órgão –espécie de “tribunal” que avalia questionamentos de contribuintes a débitos aplicados pelo fisco– receberam propina para favorecer a instituição financeira na apreciação do processo.

Com a medida, o Carf vai agora refazer o julgamento. O desfecho pode ser favorável ao banco ou à Receita. 

A decisão do conselho foi tomada na última quarta (21), atendendo a um pedido da Corregedoria do Ministério da Fazenda, cujas investigações apontaram indícios de fraude no processo.

Relatório do órgão embasou ação penal que acusa um ex-diretor do banco e ex-conselheiros do Carf, entre outros envolvidos, de corrupção, lavagem de dinheiro e outros crimes.

Conforme a denúncia oferecida pelo MPF (Ministério Público Federal) à Justiça, o BankBoston contratou e fez pagamentos a uma empresa de consultoria para auxiliá-lo no Carf.

O processo no conselho foi autuado em 2006 e discutia a tributação de lucros auferidos no exterior por subsidiárias do banco. 

A empresa de consultoria teria feito subcontratações para que o dinheiro chegasse a conselheiros do Carf e a um auditor da Receita Federal, responsável pela fiscalização de instituições financeiras em São Paulo.

A ação penal, em curso da 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília, diz que, mesmo sendo contratado de forma indireta para defender o BankBoston, o advogado e então conselheiro do Carf José Ricardo da Silva, um dos réus, votou a favor da empresa no julgamento.

Conforme a ação penal, ele recebeu propina para beneficiar o banco. Silva nega.  

O Carf informou que o processo foi anulado devido “à constatação de impedimento” de Silva, “que também exercia a defesa do contribuinte”. O órgão não informou os valores envolvidos no processo.

Segundo investigadores da Zelotes, o montante cobrado pela Receita foi de cerca de R$ 300 milhões na época (R$ 750 milhões, com atualização). 

“Importante ressaltar que o processo administrativo fiscal ainda será objeto de novo julgamento, por colegiado composto por julgadores não impedidos”, informou o órgão em nota. 

A operação do BankBoston no Brasil foi vendida pelo Bank of America Merrill Lynch ao Itaú Unibanco em 2006. As investigações não apontaram envolvimento de nenhum integrante do banco comprador em irregularidades. 

O Carf explicou que, caso o novo julgamento dê ganho de causa à Receita, a decisão sobre quem pagará a conta depende das condições em que o negócio foi feito, pois “o passivo tributário pode ter continuado com o BankBoston”.

Procurado, por meio de sua assessoria de imprensa, o Bank of America não se pronunciou. O Itaú informou, também por escrito, que o contrato de aquisição “não abrangeu a transferência dos processos tributários do BankBoston”.

“A condução desses processos, e suas consequências, continuaram de inteira responsabilidade do Bank of America”, acrescentou.