Empresário que perdeu PPP da luz diz ter sido avisado há um ano que seria preterido

'Denise Abreu já havia manifestado preferência', afirmou Walter Torre

Walter Torre, presidente da WTorre, na sede da empresa em São Paulo
Walter Torre, presidente da WTorre, na sede da empresa em São Paulo - Rafael Hupsel/Folhapress
Joana Cunha
São Paulo

Walter Torre, dono da WTorre, que integra o consórcio Walks, excluído da PPP da iluminação de São Paulo, afirma que há um ano, Denise Abreu, ex-diretora do Ilume (Departamento de Iluminação Pública da capital), já demonstrava preferência pelo consórcio FM Rodrigues/Consladel, que levou o contrato de R$ 7 bilhões em março deste ano. 

Torre diz ter participado de uma reunião em 13 de março do ano passado com o prefeito João Doria e Denise Abreu para tratar do tema. Denise perdeu o cargo na semana passada após o vazamento de áudios em que ela fala de corrupção na iluminação pública da cidade. 

Na reunião, segundo Torre, Denise disse que tinha força para tirar o Walks da disputa. “Nesse instante, percebi que a Denise era frontalmente contra o nosso consórcio e muito a favor do consórcio da FM Rodrigues. Foi a partir daí que começamos a observar todas as coisas estranhas esse tempo todo”, disse Torre à Folha

O advogado de Denise Abreu, Roberto Podval, confirma a reunião, mas diz que a fala de Denise apenas apontou que a lei anticorrupção impediria que uma empresa tida como inidônea fechasse contrato com o poder público. O consórcio Walks tem entre seus membros a Quaatro, que é dona da Alumini, empresa que entrou em recuperação judicial após envolvimento na Lava Jato. 

Procurada, a prefeitura nega as duas versões, dizendo que a ex-diretora do Ilume não participou do encontro. Por meio de nota, diz que “aceitou um pedido de reunião feito pelo empresário Walter Torre, mas condicionou o atendimento a que não tratassem da PPP da Iluminação. E assim ocorreu”.

 

Folha - A PPP virou escândalo após a divulgação dos áudios de Denise Abreu. Mas o seu consórcio sempre criticou a forma como vinha sendo conduzido o processo. Vocês tinham alguma suspeita? 

Walter Torre - Eu, Doria e Denise tivemos uma reunião em 13 de março. Naquele instante eu percebi que a Denise era frontalmente contra o nosso consórcio e muito a favor do consórcio da FM Rodrigues. Foi a partir daí que a gente começou a observar todas as coisas estranhas. Nesse dia ela disse que ela ia colocar isso [a inidoneidade da Alumini, empresa ligada à Quaatro, sócia do consórcio Walks]. Ela disse que tinha força para isso e começou a falar um monte de impropérios. Desde esse dia eu fiquei muito preocupado com a transparência e a licitude da operação. Ela ia tornar a Alumini, que nem era nossa sócia, inidônea. Ela disse que ia fazer isso.

No áudio gravado em dezembro, ela diz que é sua inimiga.
O consórcio sempre se defendeu das decisões que insistentemente o excluíam da licitação por razões absurdas. Essa situação começou a chamar atenção e parece que vem sendo confirmada após esse escândalo. Quanto ao tema pessoal, não tenho nada contra essa pessoa e, se tive algum contato ao longo da vida, foram poucos. Não compreendo a razão da animosidade.
 
Se a suspensão ocorrer, o Walks concorreria a um novo contrato? Sob quais condições? O que precisaria ser reajustado na disputa?
Se o contrato for suspenso, o consórcio Walks espera que a licitação seja retomada do momento da última ilegalidade, quando de sua exclusão, de modo que, na sequência regular do processo, seja assinado o contrato com o Consórcio Walks. É o mais lógico e menos custoso ao erário, inclusive porque um projeto dessa magnitude e uma licitação desta ordem custam muito à sociedade.
 
Em algum momento vocês pensaram em desistir? 
Não pensamos que seríamos desclassificados. Tínhamos o menor preço. Por isso, o natural seria analisar nossos documentos e seguir com a contratação. Por isso não desistimos. Fomos surpreendidos com a decisão de reclassificar a proposta do Consórcio FM Rodrigues/CLD, quando decidimos brigar.
 
O Walks foi desclassificado porque a Quaatro tem participação na Alumni. Por que colocaram a Quaatro no grupo se ela tinha essa fragilidade?

A licitação começa em 2014. Nessa época, a Alumini sequer respondia processo administrativo. A Alumini foi declarada inidônea em março de 2017, quando a licitação já estava em curso. E está discutindo a inidoneidade judicialmente.


ENTENDA
Como a maior PPP de iluminação do mundo terminou com apenas uma concorrente

Fim de 2014
Abertura de consulta pública, na gestão de Fernando Haddad (PT), atrai dezenas de interessados, como os estrangeiros GE e Philips

Fim de 2015
Após análise do edital feita pelo TCM, prefeitura altera modelagem e extingue garantia conhecida como conta vinculada

Jan.2016
Sem a conta servindo como garantia, multinacionais abandonam disputa e BNDES muda condições de financiamento. 

Fev.2016
PPP recebe apenas três ofertas, duas delas tinham ligação com as empresas que já participavam no contrato antigo: Alumini (ligada ao consórcio Walks) e FM Rodrigues (do consórcio FM Rodrigues/CLD)

Mar.2016
Começa um imbróglio entre os participantes, com questionamentos na Justiça. O terceiro consórcio, Ecobraslux, cai por estar em desacordo com o edital.

Mar.2017 
Alumini é declarada inidônea após denúncias na Lava Jato e é excluída do contrato que tinha em parceria com a FM

Out.2017
Sem conclusão da PPP, prefeitura fecha contrato emergencial com a FM Rodrigues

Jan.2018
Justiça determina que envelope com propostas sejam abertos e Walks tem oferta com melhor preço

Fev.2018
Walks é desclassificado pela prefeitura sob o argumento de que a Quaatro, dona da Alumini, era inidônea. Medida abriu caminho para a declaração da FM Rodrigues como vencedora

Mar.2018
Denise Abreu, ex-diretora do Ilume, perde cargo após vazamento de gravação em que mostra suposta preferência pela FM Rodrigues e insinua propina da empresa. PPP passa a ser investigada por suspeita de fraude

PERFIL DOS CONSÓRCIOS

Walks
Sócios: Quaatro (dona da Alumini) + WPR (subsidiária da WTorre) + KS Brasil Led

FM Rodrigues/CLD
FM Rodrigues + Consladel (já condenada no Cade por conluio em ajuste de preços em licitação em 2010 e investigada por propina à Ilume em 2011)

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