Descrição de chapéu MPME varejo

Empresários usam pontos de venda como showroom para cliente online

Público experimenta produtos ao vivo, mas fecha a compra, paga pela internet e recebe em casa

Mulher de roupa cinza pendura roupas numa arara contra uma parede branca
Alexsandra Venancio, 34, na loja colaborativa Achadinhos, na Vila Madalena - Rafael Hupsel/Folhapress
Flávia G. Pinho
São Paulo

Era praticamente consenso entre os gurus da tecnologia: assim que o ecommerce ganhasse escala, as lojas físicas desapareceriam do mapa. Passados cerca de 20 anos desde o surgimento do comércio virtual, no entanto, a previsão ainda está longe de se confirmar.

A pesquisa Global Powers of Retailing 2018, divulgada em janeiro pela consultoria Deloitte, mostra que quase 90% das vendas em todo o mundo ainda são feitas em pontos físicos.

O que não quer dizer que os estabelecimentos comerciais tradicionais tenham se mantido atrás do balcão, como no passado. Uma transformação está em curso, e ela tem potencial para atingir tanto gigantes do varejo quanto pequenos lojistas com a mesma intensidade.

“O futuro é o varejo unificado. A loja física funciona como showroom e proporciona experiências de compra, mas os consumidores pagam por meio de um aplicativo no celular”, afirma Eduardo Terra, que é presidente da SBVC (Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo). 

Esse modelo já existe: foi adotado pela Amazon, que há dois meses abriu a loja Amazon Go em Seattle, nos Estados Unidos, e pela Alibaba, dona da rede de supermercados Hema, que funciona sem caixas registradoras desde 2015, na China.

Os casos tendem a se espalhar pelo mundo, aposta Terra. “É o início de uma trajetória que logo será viável para o pequeno lojista, porque depende de tecnologias mais simples e baratas.”

Nesse cenário, só vai sobreviver a loja física que assumir um novo papel, afirma Marcus Cordeiro, 47 anos, sócio-diretor da consultoria ba}Stockler. “O consumidor mudou. Ele já chega informado. Se foi à loja, é porque quer ter experiências com o produto e trocar ideias com o vendedor”, afirma ele. 

Homem de camisa cor de rosa segura dois copos com azeite. Atrás, uma prateleira com garrafas e parede bramca
Arnaldo Comin, em seu empório especializado em azeites Rua do Alecrim, em São Paulo - Rafael Hupsel/Folhapress

Arnaldo Comin, 46, fundador do empório especializado em azeites Rua do Alecrim, em São Paulo, comprova essa teoria. “Em 2012, abri o negócio apostando que seria 100% virtual. Desde o primeiro mês, clientes batiam à porta do escritório para conhecer os produtos.”

Comin está há dois anos instalado em uma loja no bairro de Moema, na zona sul, e promove degustações aos sábados. “Nesses dias, recebo até 80 pessoas, que passam até uma hora na loja. O valor gasto em média, de R$ 140 nos dias normais, sobe para R$ 180. E há sábados em que dobro o faturamento.”

Experiência similar é proporcionada às clientes das duas lojas paulistanas da Alexandre de Paris —a rede, especializada em acessórios de luxo para os cabelos, foi fundada na França em 1971 e está presente em 27 países. A administradora de empresas Isabel Abucham Cândido, 39, que detém os direitos de distribuição da marca no Brasil, desenvolveu uma técnica para conquistar clientes.

As vendedoras aprendem a pentear as clientes com as fivelas, presilhas e tiaras que estão à venda —as peças custam de R$ 95 a R$ 2.700. “Quanto mais a cliente experimenta, mais ela compra”, afirma a dona das lojas, cujo valor médio das compras gira em torno de R$ 450.

Os 2.000 itens do catálogo também são distribuídos para nove multimarcas de outros estados. Isabel vende, em média, 4.000 peças por mês, sendo que 75% do faturamento vem das lojas próprias —mostrando que a oferta de penteados faz a diferença.

ATENDIMENTO VIP

Na butique de luxo Carol Bassi, em São Paulo, a experiência de compra extrapola a simples comercialização dos produtos. Na loja de 580 m², um quinto da área é ocupado por um provador gigante, onde há espelhos, pufes, um bar e canto reservado para animais de estimação.

Mulher vestida de branco, de perfil, mexe no cabelo de uma mulher loira, vestida de preto, sentada
Vendedora da loja Alexandre de Paris penteia cliente, em SP - Karime Xavier/Folhapress

Um staff de 19 vendedoras, lideradas pela própria estilista Carol Bassi, 44, se encarrega do atendimento.
“Eu mesma ajudo a marcar a altura da barra, ensino como dobrar a manga do paletó ou fazer uma amarração na calça. Esse contato é o grande atrativo. A mulherada encontra as amigas aqui e passa horas na loja”, conta Carol. Suas peças custam de R$ 200 a R$ 6.000.

Fazer com que a cliente se sinta especial não é exclusividade do segmento de luxo.

Fundador da rede Depósito da Lingerie, o administrador de empresas Marcelo Dória, 37, adota o mesmo princípio nas 12 lojas que mantém na zona leste de São Paulo —onde o valor médio das compras não passa dos R$ 60.

Professor da pós-graduação em varejo da Fundação Getulio Vargas, Dória investe no treinamento como forma de aprimorar a experiência de compra das clientes. Sempre que abre uma nova loja, as vendedoras são contratadas até quatro meses antes. 

No comércio popular, afirma Dória, as lojas físicas têm futuro garantido. “Atuo em comunidades onde o ecommerce não emplaca porque nem os Correios entram. Ainda assim, ofereço às clientes a opção de comprar por WhatsApp e retirar na loja. O futuro  está no uso complementar das plataformas.”

Essa percepção levou Alexsandra Venancio, 34, dona da marca de roupas infantis Humaninhos, a expandir seu negócio do mundo online para o físico. Após um ano com o site no ar, começou a participar de feiras para expor e vender suas peças. 

“No espaço físico a pessoa pode pegar, sentir o tecido, ver a qualidade da roupa”, afirma. O valor médio das compras realizadas nas feiras era bem maior do que o do site: R$ 400 no primeiro caso e R$ 120 no segundo.

Decidiu ter um espaço físico fixo e há um mês alugou uma área em uma loja colaborativa na Vila Madalena, a Achadinhos. Paga R$ 800 por mês pelo aluguel de um nicho de 1,5 metro de largura. 

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