'Não se pode esperar que setor privado substitua governo', diz presidente da Nestlé

Paul Bulcke afirmou que empresas podem ajudar, mas que o poder público tem um papel a desempenhar

Paul Bulcke, presidente do conselho da Nestlé, no Fórum Econômico Mundial, no hotel Grand Hyatt, em São Paulo
Paul Bulcke, presidente do conselho da Nestlé, no Fórum Econômico Mundial, no hotel Grand Hyatt, em São Paulo - Eduardo Anizelli/Folhapress
Isabel Fleck
São Paulo

Em um debate em que nenhum dos participantes negou a necessidade de as empresas terem hoje um propósito social, além do lucro, o presidente do conselho da Nestlé, Paul Bulcke, alertou para o perigo de que isso transfira ao setor privado exigências sobre responsabilidades que são do governo.
 
“Você não pode esperar que o setor privado venha a substituir o governo. Precisamos discutir, envolvendo as várias partes da sociedade, para que cada um desempenhe o seu papel cabível”, disse Bulcke, em um painel sobre “liderar negócios com propósito” no Fórum Econômico Mundial, em São Paulo, nesta quarta-feira (14).
 
O presidente do conselho da Nestlé afirmou que as empresas podem, em temas como educação, “ajudar, induzir, discutir”. “Mas o governo tem um papel a desempenhar”, disse. “Não se deve achar que a iniciativa privada vá compensar as falhas da outra parte, porque aí você começa a ter uma dimensão bastante perigosa.”
Bulcke, no entanto, reconheceu que a sociedade acredita que o “propósito fundamental para a existência de uma empresa mudou”.
 
Gonzalo Muñoz, cofundador e CEO da TriCiclos, destacou a necessidade de o propósito —seja ambiental ou social— da empresa fazer parte de uma política interna de longo prazo. 
 
“Se não pode acontecer uma vez e não acontecer mais. Pode depender de uma pessoa que liderava um departamento da empresa naquela época”, observou. 
 
Para ele, é importante que o propósito entre “nos valores da empresa”, com prática que podem incluir a remuneração dos funcionários de acordo com o que alcançam em termos de impacto social e ambiental.
 
Karina Saade, diretora de operações para a América Latina da administradora de fundos Black Rock, defende uma política interna de longo prazo, mas que considere o “aspecto coletivo” de seu público-alvo. “Embora o propósito não mude com o tempo, a manifestação relativa ao propósito vai mudar dependendo das necessidades da sociedade que você atenda”, afirmou.
 
É o caso, por exemplo, de empresas do setor de alimentos, como a Nestlé. Segundo Bulcke, o propósito de “aprimorar a qualidade de vida das pessoas”, por exemplo, significa hoje algo muito diferente do que há alguns anos.
 
“Temos outros parâmetros de nutrição e saúde e de estilo de vida, e isso reage junto com outras coisas. Temos que estar sempre pesquisando”, disse.
 
Muñoz e a presidente da Magazine Luiza, Luiza Helena Trajano, destacaram a importância de ter também um propósito em relação aos funcionários.
 
Trajano citou ações internas de formação de funcionários, como a concessão de bolsas de estudo parciais. 
 
“Você pode ter um grande propósito, totalmente focado no seu cliente, no seu público-alvo, mas estar perdendo seu impacto interno. Já vimos isso acontecer com empresas que têm um propósito: elas se concentram no que vão entregar para os clientes, mas deixam passar o impacto sobre o empregado”, disse Muñoz.
Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.