Nova lista de sobretaxas da China contra EUA beneficia agronegócio do Brasil

Contraofensiva de Pequim inclui soja, milho, carne e suco de laranja, destaques da pauta brasileira

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Sacas de soja são desembarcadas no porto de Nantong, na China
Sacas de soja são desembarcadas no porto de Nantong, na China - AP
Washington

Um dia depois de os Estados Unidos terem anunciado uma extensa lista de produtos chineses a serem tarifados, a China divulgou nesta quarta (4) a sua lista de retaliação, com soja, carne, milho, suco de laranja e outros produtos americanos que pretende sobretaxar –numa escalada da guerra comercial entre as duas potências econômicas. 

A medida pode acabar beneficiando o Brasil e outros exportadores da América Latina, como a Argentina e o Paraguai.

São países com boa competitividade em produtos agrícolas, que estão entre os principais itens do rol de retaliação chinês e que podem substituir as importações americanas.

“A tendência para a América Latina é positiva”, disse à Folha Margaret Myers, diretora do programa latino-americano do Inter-American Dialogue e especialista na relação da região com a China.

Atualmente, o Brasil é o principal exportador de soja para a China. Os EUA vêm logo atrás, e vendem quase um terço de sua produção aos chineses. A soja brasileira, portanto, seria uma substituta natural do produto americano, assim como a carne.

Além desses produtos, milho, sorgo, trigo, algodão e tabaco também estão na lista das potenciais sobretaxas. No início da semana, a China ainda havia anunciado um aumento da alíquota de importação para o etanol americano, que subirá de 30% para 45%

Analistas e investidores avaliam que, embora os chineses ainda dependam das importações dos EUA para suprir a demanda interna, mesmo com as sobretaxas, a medida deve “favorecer produtores da América Latina em detrimento de norte-americanos”, conforme afirmou o banco Goldman Sachs, em comunicado a clientes.

Mas ainda não dá para comemorar: as listas anunciadas nesta semana são de negociações em andamento. Nenhuma tarifa foi aplicada, e a China nem sequer anunciou a data em que elas começariam a valer.

“Há uma cenoura na ponta da vara”, afirmou Larry Kudlow, principal assessor econômico da Casa Branca, fazendo referência às negociações com os chineses. “É parte do processo. Queremos resolver isso com o menor impacto possível.”

Mesmo que as sobretaxas sejam confirmadas, a transferência de mercado para o Brasil e outros latino-americanos não é automática, como destaca André Soares, pesquisador associado do Atlantic Council. “Nossas vantagens competitivas são limitadas”, afirma.

Soares também desconfia de uma tarifa da China sobre a soja americana, em função da grande dependência do país das importações. Para ele, o anúncio pretende apenas forçar os EUA a negociarem.
“Eu não acho que a China iria querer ficar dependente do Brasil; isso vai contra a estratégia de segurança alimentar do país”, comenta.

Nem se a China comprasse toda a soja exportada pelo Brasil no ano passado, conseguiria suprir a demanda interna. Por isso, precisa buscar o produto em uma gama de países –inclusive nos EUA, independentemente de tarifas.

GUERRA

O governo de Donald Trump tem promovido uma investida contra o poderio econômico chinês, que já qualificou como “uma ameaça ao poder, à influência e aos interesses americanos”.

A recente disputa de tarifas foi iniciada há duas semanas, depois de uma investigação do governo dos EUA apontar que os chineses se apropriaram de tecnologia americana de forma desleal, investindo em empresas no país e exigindo a transferência de conhecimento para suas companhias.

A China disse estar aberta a negociar. Mas afirmou que ninguém poderia esperar que o país “engula uma fruta amarga”. 

Nesta quarta, setores produtivos dos EUA se queixaram da guerra de tarifas, e manifestaram preocupação com os seus efeitos sobre a economia do país. 

Além de produtos agrícolas, também estão na lista de potenciais sobretaxas veículos do tipo SUV, motores, aviões e uísque –que atingem setores caros ao próprio Trump, em termos eleitorais.

A gigante Cargill, maior empresa de venda de grãos do mundo, afirmou em nota que a briga “entre as duas maiores economias do mundo pode levar a uma destrutiva guerra comercial com sérias consequências para o crescimento econômico e a criação de empregos”. 

Mas o governo americano minimizou a queda de braço.

“Não é uma Segunda Guerra Mundial”, disse o secretário americano de Comércio, Wilbur Ross, em entrevista à CNBC. “Até mesmo tiroteios se encerram com negociações.”

A Casa Branca argumenta que está concentrada em efeitos econômicos de longo prazo, a fim de recuperar a competitividade americana. Mas reiterou que está aberta a negociar.

Para Myers, isso só será possível se os chineses derem o primeiro passo. “O adulto na sala, a essa altura, é a China.”


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