Para economista comportamental, corrupção no Brasil se tornou pandemia

Folha publicará coluna de Dan Ariely quinzenalmente a partir desta quinta

Colunista Dan Ariely
O economista comportamental Dan Ariely, 50, professor da Universidade Duke, nos Estados Unidos - Divulgação
Filipe Oliveira
São Paulo

O economista comportamental Dan Ariely, 50, professor da Universidade Duke, nos Estados Unidos,  passa a assinar coluna quinzenal no site da Folha a partir desta quinta-feira (19). 

Americano de origem israelense, ele se dedica a estudar como humanos são frequentemente movidos mais pelas emoções do que pelo raciocínio lógico.

Em sua coluna, publicada desde 2012 pelo The Wall Street Journal, parte desse tópico para responder a perguntas de leitores sobre temas variados, como dicas para usar melhor o dinheiro, ter vida mais saudável e escolher relacionamentos.

Outro tema de preferência do especialista é a trapaça. No documentário The Dishonesty Project, produzido por ele e disponível no serviço de vídeos sob demanda Netflix, Ariely explica que, ao mesmo tempo que temos a tendência a sermos desonestos para obtermos melhores resultados, o impulso é limitado pelas emoções que fazem nos sentirmos embaraçados a partir de determinado nível de trapaça.

O especialista compara a corrupção a uma doença infecciosa. E, em sua opinião, o vírus se espalhou tanto pelo Brasil que o país passa por uma pandemia.

Em entrevista à Folha, Ariely diz que a tendência à desonestidade e à corrupção depende menos do que está na lei e mais do que, no dia a dia, se percebe que é certo ou errado observando comportamento dos outros.

"Se mais pessoas sonegam impostos, traem seus companheiros, passamos a perceber que não há problema em fazer esse tipo de coisa."

Seguindo a análise de Ariely, quando mais pessoas se tornam corruptas, mais os comportamentos nocivos são percebidos como normais e são assimilados por mais gente, criando um ciclo que se retroalimenta.

Ariely vê poucas alternativas para o cenário brasileiro. Segundo ele, a desonestidade na política atingiu dimensões tão grandes que é impossível pensar em uma solução lenta e gradual. "É preciso identificar o que há de errado, reconhecer que se está em um mau caminho e recomeçar quase que do zero", diz.

Apesar da situação dramática no Brasil, o economista destaca que brasileiros não são por natureza desonestos em todas as áreas.

"A desonestidade funciona em silos. Você ter comportamentos ruins em uma área não implica você ter comportamentos ruins em todas", explica.

EDUCAÇÃO

O economista diz acreditar que a educação tem papel fundamental para reduzir as trapaças. 

Porém afirma que as orientações paternas devem ser mais específicas do que o usual.

Apenas ensinar às crianças que ser honesto é o correto, apesar de parecer bom, é pouco efetivo. Uma orientação dessa não consegue abarcar todas as situações reais que a pessoa enfrentará em sua vida.

"Se quiser ter um impacto real, você precisa falar de coisas específicas. Poderia dizer, 'quando estiver na escola e for fazer uma prova, você não pode nunca, em hipótese alguma, olhar as respostas de outra criança'".

PRÊMIO

Ariely, formado em psicologia pela Universidade de Tel Aviv, possui doutorado em psicologia cognitiva e em administração. 

O interesse pelas más escolhas feitas no dia a dia surgiu após acidente em sua juventude no qual sofreu graves queimaduras, que o deixaram hospitalizado por três anos. 

Em suas palestras, boa parte delas disponível na internet, conta que, por não ter nada para fazer, observava o comportamento das enfermeiras e se questionava porque insistiam em tirar seus esparadrapos de uma vez só e com vigor, em vez de fazer isso lentamente —o que imaginava ser menos doloroso.

Após sair do hospital, passou a testar cientificamente essas e outras hipóteses sobre como a mente funciona. Comprovou que uma dor menos aguda e que dura mais é melhor do que a retirada súbita do curativo.

Em 2008, Ariely ganhou o Prêmio IgNobel, que homenageia as descobertas mais inusuais da ciência. Sua pesquisa mostrou que remédios sem efeito caros dão maior bem-estar do que quando são baratos. 

Na ocasião, Ariely escreveu em seu blog que a pesquisa ajudava a explicar a dificuldade para disseminação dos remédios genéricos. Também disse que a conquista era um sonho virando realidade.

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