A Volkswagen deve substituir Matthias Müller como presidente-executivo, uma decisão inesperada que sinaliza um novo capítulo na maior montadora de automóveis do planeta, depois do escândalo quanto à trapaça nos testes de emissão de poluentes por seus motores diesel.
O conselho da montadora alemã votará sobre uma reforma de seu comando executivo na sexta-feira, de acordo com duas pessoas próximas a Müller. Elas afirmaram que Herbert Diess, que comanda a divisão Volkswagen do grupo, substituiria Müller.
O grupo Volkswagen e a Porsche SE, que controla a montadora, divulgaram comunicados enigmáticos nos quais dizem estar estudando mudanças significativas, entre as quais apontar um novo presidente-executivo para a Volkswagen. A montadora afirmou que Müller "havia sinalizado sua disposição fundamental" de aceitar as mudanças.
As duas empresas se recusaram a fazer outros comentários, ainda que uma delas tenha dito que um novo comunicado da Volkswagen sobre o assunto deve ser divulgado no futuro próximo.
Arndt Ellinghorst, analista da Evercore ISI, disse que a única interpretação possível era a de que Müller estava se preparando para renunciar. A decisão surge dias depois de o Deutsche Bank, maior banco da Alemanha, substituir seu presidente-executivo, John Cryan, por Christian Sewing.
Um veterano investidor da Volkswagen disse que as mudanças na montadora teriam menos a ver com a queda de Müller do que com a ascensão de Diess.
Müller aceitou assumir o comando da Volkswagen porque sentia que era esse o seu dever, em meio aos dias mais caóticos nas oito décadas de história da companhia, depois da revelação de que ela havia alterado o software de centenas de milhares de seus carros para trapacear em testes de emissão de poluentes. O escândalo custou mais de US$ 25 bilhões à Volkswagen, nos Estados Unidos; e na Europa o litígio continua.
Müller deixou um emprego seguro como presidente-executivo da Porsche para liderar a Volkswagen em seu momento de crise. Em entrevistas anteriores, ele havia deixado claro que o papel que se via desempenhando era o de ajudar a companhia a reencontrar o equilíbrio.
O contrato dele venceria em 2020, e ele declarou explicitamente que não pretendia ficar mais tempo que isso no posto."Até quando devo trabalhar - até os 100 anos de idade?", ele disse ao Financial Times no ano passado.
Sob seu comando, a Volkswagen superou a Toyota para se tornar a maior montadora de automóveis do planeta, pelo critério de vendas. Ele vem batalhando para tornar o grupo menos complexo e mais descentralizado.
Outra direção
No ano passado, Müller tomou a importante decisão de investir 34 bilhões de euros em tecnologias para carros elétricos e autoguiados, usando o escândalo do diesel como catalisador para mudanças maiores.
As duas pessoas próximas a Müller afirmaram que ele não será demitido. Disseram que ele implementou a estratégia que pretendia e que agora estava disposto a sair. Mas outra pessoa disse que alguns membros do conselho da Volkswagen queriam mudança.
Diess é o único candidato sério à sucessão de Müller. Antigo executivo da BMW, onde se tornou conhecido pelas enérgicas medidas de corte de custos, ele assumiu o comando da Volkswagen, uma das diversas marcas do grupo - entre as quais Porsche e Audi - na metade de 2015.
De lá para cá, Diess vem agindo agressivamente para elevar a margem de lucros da divisão e prepará-la para a transição rumo aos carros elétricos, sem irritar os poderosos sindicatos da empresa.
Nos primeiros meses de Diess à frente da marca, um executivo da Volkswagen disse que os dias dele pareciam contados, porque estava brigando com os sindicatos. "Mudar a estrutura de custos em Wolfsburg [a sede da Volkswagen] é como caminhar pelas ruas de Bogotá em busca de traficantes de drogas sem estar armado", disse essa pessoa. "É suicídio".
Um importante executivo da montadora alemã descreveu o trabalho de dirigir a marca Volkswagen como "o papel de liderança mais difícil". Ele acrescentou que Diess havia "conseguido cumprir sua missão, ao agir de modo direto e inflexível".
"O prestígio de Diess na empresa, no conselho, nos sindicatos, é realmente alto", disse o veterano investidor da Volkswagen. "Ele não é descontrolado, ele não se descuida, ele é muito ponderado, ainda que não seja muito habilidoso nos relacionamentos interpessoais. Conquistou a todos".
Os investidores receberam a notícia positivamente, e as ações da Volkswagen fecharam com alta de mais de 4%.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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