Apesar do aumento no preço da farinha impulsionado pela alta do dólar, o pão francês não ficou mais caro nos últimos dias.
Para comerciantes ouvidos pela Folha, o mercado não está aquecido o suficiente para repassar o aumento.
"A farinha ficou mais cara, mas tiramos um pouco do lucro para continuar com os clientes", diz Aníbal Romeu, dono da padaria Cristalina, na Santa Cecília (centro de São Paulo).
A reportagem entrou em contato com 46 padarias em todas as regiões de São Paulo. Apenas quatro aumentaram o custo do pão francês no último mês, e a maioria mantém o mesmo valor há pelo menos um ano.
O produto sai por R$ 14 o quilo, em média. "Fizemos uma negociação com os moinhos para segurar o preço o máximo possível, porque não dá pra repassar", diz Luiz Antonio, gerente da Gêmel, também no centro de SP.
O preço da farinha aumentou 4,86% em abril, segundo a FGV (Fundação Getulio Vargas), e deve continuar em alta em maio devido ao dólar, que empurra para cima a cotação do trigo.
Mais da metade do trigo consumido no Brasil vem do exterior, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo).
"Nos últimos três meses vimos um aumento no trigo, em parte pela seca na Argentina e em parte pelo câmbio", diz Cláudio Zanão, presidente da Abimapi (da indústria de biscoitos, massas, bolos e pães). A expectativa é de que estes derivados de farinha encareçam, diz Zanão.
O efeito deve perdurar apenas pelos próximos meses, segundo Rubens Barbosa, presidente da Abitrigo, já que a safra brasileira deve suprir a demanda no país após o inverno.
Com a alta do dólar, o primeiro aumento de preços vem na base da cadeia produtiva, em matérias-primas industriais e alimentos.
"As principais siderúrgicas já anunciaram repasses nos preços", afirma Braz.
Assim como as padarias, porém, os demais setores do varejo estão hesitantes em repassar aumentos em um cenário de consumo fraco.
O varejo terminou o primeiro trimestre de 2018 com aumento de 0,7 % nas vendas sobre o último trimestre de 2017, mas houve avanço mensal de 0,9% em janeiro e queda de 0,2% nas vendas em fevereiro, segundo o IBGE.
"O repasse é imediato em commodities agrícolas, metálicos e combustíveis, mas nos demais produtos é mais tímido", diz André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da FGV.
No IGP-10 (Índice Geral de Preços) da FGV de maio, os componentes para manufatura subiram 1,71%, em parte devido à escalada do dólar.
O impacto também vem no aço, gasolina, gás, borracha, plásticos, celulose, fertilizantes, ferro e café.
Para uma variação de 10% no dólar, como a que houve de março até agora, a estimativa é um impacto de no máximo meio ponto percentual na inflação anual, diz Guilherme Dietze, assessor econômico da Fecomercio-SP.
"Ainda não dá para dizer se vai impactar. Temos que saber se o aumento [no câmbio] vai permanecer e, depois, saber como está o estoque de indústrias que compram esses insumos", afirma Dietze.
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