OMC dá aval para EUA imporem maior retaliação da história

Decisão da OMC sobre Airbus permitirá sanções dos EUA contra a União Europeia

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Fabricação do Airbus A321 no Alabama (EUA) - Michael Spooneybarger-13.set.2015/Reuters
Peggy Hollinger Patti Waldmeir Shawn Donan

Os Estados Unidos conquistaram o direito de impor bilhões de dólares em tarifas punitivas contra a União Europeia, depois que a Organização Mundial do Comércio (OMC) deu a vitória a Washington na primeira de duas disputas cruciais, que podem representar o fim de uma batalha de 14 anos sobre subsídios ilegais à Boeing e à Airbus.

A decisão abre caminho para o que pode ser a maior ação retaliatória da história da OMC. Também representa um risco de agravamento das tensões comerciais entre os Estados Unidos e a União Europeia sobre diversas questões, da ameaça americana de impor tarifas às importações de aço à disposição de Washington de sancionar as empresas europeias que continuem a fazer negócios no Irã, agora que Donald Trump abandonou o acordo nuclear assinado com Teerã em 2015.

A câmara de recursos da OMC manteve na terça-feira uma decisão de 2016 no sentido de que a União Europeia não havia retirado bilhões de euros em assistência ilegal à Airbus para a produção de dois aviões, o superjumbo A380 e o A350, um jato de fuselagem larga. A Comissão Europeia declarou que "agiria rapidamente" para garantir que a decisão da OMC seja cumprida.

A Boeing, que argumentou que os subsídios indevidos a esses dois aviões respondem por US$ 9 bilhões do total de US$ 22 bilhões em assistência ilegal de que ela acusou a União Europeia, recebeu positivamente a decisão, que confirma suas queixas de que os governos europeus subsidiaram durante décadas a ascensão de sua maior rival, por meio de empréstimos de baixo custo para o desenvolvimento de novos aviões.

"A decisão final de hoje envia uma mensagem clara: o desrespeito às regras e os subsídios ilegais não serão tolerados. O sucesso comercial de produtos e serviços deve ser baseado em seus méritos, e não em ações que distorçam o mercado", disse Dennis Muilenburg, presidente-executivo da Boeing.

O governo Trump classificou a decisão como uma vitória importante.

"O presidente Trump deixou claro que usará todas as ferramentas disponíveis para garantir os benefícios livres e justos do comércio internacional para os trabalhadores americanos", disse Robert Lighthizer, o represente do governo americano para assuntos de comércio internacional. "Os subsídios da União Europeia aos aviões custaram dezenas de bilhões de dólares em faturamento perdido a empresas aeroespaciais dos Estados Unidos... A menos que a União Europeia enfim tome medidas para impedir que as regras sejam violadas e os interesses americanos prejudicados, os Estados Unidos levarão adiante suas contramedidas dirigidas a produtos da União Europeia".

No entanto, a Comissão Europeia também se declarou vitoriosa, porque a OMC rejeitou 204 das 218 queixas apresentadas pelos Estados Unidos.

"Hoje, a OMC... rejeitou definitivamente a contestação americana à maior parte das medidas de apoio da União à Airbus, e concordou em que a União Europeia acatou, em sua maior parte, a decisão original sobre o caso", disse Cecilia Malmstrom, a comissária do comércio internacional da União Europeia.

"Significativamente, a maioria das queixas americanas de que essas medidas de apoio haviam prejudicado as vendas de aviões da Boeing foi descartada".

A decisão da terça-feira representa o final do primeiro estágio de uma batalha que irrompeu em 2004. O montante exato da retaliação a que os Estados Unidos terão direito será determinado em um processo separado, que pode levar meses.

A câmara de recursos da OMC também decidirá nos próximos meses se os Estados Unidos cumpriram uma ordem de 2012 para que abandonassem seus subsídios ilegais à Boeing, por meio de isenções tributárias concedidas pelo estado de Washington.

Uma decisão em favor da União Europeia - que acusa a Boeing de ter se beneficiado de mais de US$ 20 bilhões em assistência ilegal - permitiria que a União Europeia impusesse medidas punitivas contra produtos americanos, nos termos das regras da OMC.

A disputa entre a Boeing e a Airbus é uma das batalhas mais contenciosas no âmbito do sistema de comércio internacional. Ela chegou ao auge em 2010 e 2011, quando a OMC decidiu que tanto a Boeing quanto a Airbus haviam recebido bilhões em assistência ilegal.

Advogados especializados em questões de comércio e outros especialistas disseram que a decisão da terça-feira era complicada, e que é provável que o montante que os Estados Unidos poderiam aplicar em retaliação, e que terá de ser determinado por meio de um complicado processo, se veja reduzido.

Mas Chad Bown, especialista em disputas na OMC do Instituto Peterson de Economia Internacional, disse que a retaliação ainda assim deve ser a maior já autorizada pela organização, e que pode ajudar o governo Trump a aumentar a pressão sobre a União Europeia por novas concessões comerciais.

Uma maneira potencial de fazê-lo, segundo Bown, seria usar a decisão da OMC como justificativa para elevar as tarifas sobre os carros europeus importados pelos Estados Unidos, que segundo o presidente Trump pagam tarifas mais baixas que os carros americanos exportados à Europa. "O governo Trump demonstrou que gosta de usar tarifas como alavanca, e pressionar os parceiros comerciais dos Estados Unidos com isso", ele disse. "E isso pode ajudá-lo a agir assim".

Antes que possa impor tarifas, o governo americano teria de solicitar uma estimativa de danos a um painel de arbitragem da OMC. A Boeing argumentou que perdeu bilhões de dólares em vendas na Ásia, Oriente Médio e Europa como resultado do lançamento subsidiado do A350 e do A380. Decidir o nível de contramedidas aplicável pode levar meses, ou até mais de um ano, de acordo com advogados de ambas as partes envolvidos no processo.

A Boeing afirmou que tarifas em valor de bilhões poderiam ser aprovadas já no ano que vem. Mesmo assim, a Airbus insistiu em que quaisquer penalidades impostas pelos Estados Unidos provavelmente seriam modestas, já que as questões que causaram queixas sobre o A350 e o A380 são menores e já estão sendo resolvidas. A questão não era o montante total de empréstimos pelos quatro países fundadores da empresa - Alemanha, Espanha, França e Reino Unido - mas a taxa de juros cobrada, disse uma pessoa informada sobre o assunto.

Tom Enders, presidente-executivo da Airbus, disse que a Boeing enfrentaria dificuldades para convencer o painel de arbitragem de que sofreu danos significativos, por conta das questões ainda pendentes. "A despeito da retórica da Boeing, fica claro que a posição deles hoje é vigorosa e saudável; eles detêm metade do mercado, sua carteira de encomendas é imensa, e eles claramente não foram prejudicados pelos empréstimos à Airbus".
 
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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