Descrição de chapéu greve dos caminhoneiros

Paralisação causa racha no campo entre produtor de grãos e de carnes

Setor de proteína animal sofre com falta de ração e canibalismo de aves, enquanto sojicultores comemoram redução no preço do diesel

São Paulo

"Vamos levar os tratores para a beira da estrada."

"Passaram dos limites, é hora de esse movimento acabar."

As frases, contraditórias, vêm do mesmo setor: o agronegócio.

O setor está dividido. Os produtores de grãos, como soja, milho e algodão, por meio de várias associações, apoiam a paralisação dos caminhoneiros e pedem a adesão dos agricultores ao movimento.

Já o setor de carnes quer um basta nos bloqueios, devido ao caos que a greve está provocando no setor.

Grandes consumidores de diesel, na produção e na movimentação da colheita, os produtores de grãos serão beneficiados por uma redução no preço do combustível.

Já as granjas, embora também necessitem do combustível, estão sufocadas pela parada dos caminhões, que impede a chegada da ração aos locais de produção e a saída dos produtos processados pelos frigoríficos.

Enquanto o setor de grãos está na entressafra e com pouco movimento nas lavouras, o de proteínas abate diariamente 21 milhões de aves e 150 mil suínos. O país tem 1 bilhão de aves e 20 milhões de suínos no campo.

"É hora de esse movimento parar. Já mostrou a sua força, mas a vida deve continuar", afirma Pedro de Camargo Neto, do setor pecuário.

Para Ricardo Santin, da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), "eles já passaram dos limites".

Há uma renovação diária nas granjas. Enquanto uns animais saem, outros ocupam o lugar. A greve, contudo, está quebrando essa rotina, diz.

Antonio Camardelli, presidente da Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes), diz que o setor tem dependência rigorosa do ciclo de produção.

Quando o boi sai do pasto, já há uma programação de entrega da carne nas casas de varejo da Europa ou de outros países importadores. Qualquer interferência nessa escala causa uma interrupção da cadeia toda, afirma.

José Carlos Zanchetta, o maior produtor individual de carne de frango do estado de São Paulo, diz que "o momento é gravíssimo".

"A ração não chega às granjas, não há retirada dos frangos prontos para o abate, as câmaras refrigeradas estão lotadas, estamos sem combustível e os caminhões são impedidos de rodar."

Com o abate de 350 mil aves por dia, o grupo de Zanchetta tem diversos contratos de exportação. Muitos dos caminhões, refrigerados, estão bloqueados nas estradas. Após cinco dias de greve, o diesel de caminhões terminou, e a carne começa a se deteriorar.

O empresário diz que está tentando liberar a passagem de caminhões com ração e com carne nos bloqueios, mas é uma negociação difícil.

A falta de ração já provoca o canibalismo entre os animais em diversas granjas do país.

Impedido de circular com a carne, Zanchetta cita várias das grandes redes de varejo que não tiveram seus pedidos de compra de carne atendidos nos últimos dias.

A situação não é menos grave para a suinocultura. Custódio Rodrigues de Castro Júnior, diretor-executivo da Acrismat (Associação dos Criadores de Suínos de Mato Grosso), diz que a entidade está entrando com liminar para que seja liberada a passagem de ração. A suinocultura depende do milho e do farelo de soja e em algumas fazendas o número de animais atinge 200 mil cabeças.

A greve chega em um momento ruim, segundo Castro Júnior. O setor vem de uma queda de preços, devido à Carne Fraca e a eventos posteriores, além do embargo russo ao produto brasileiro.

Para Francisco Camacho, produtor rural que tem confinamento bovino, o problema de alimentação do gado vai se acentuar a partir de agora, mas o fluxo de caixa já está complicado. Os frigoríficos não estão abatendo mais, e os pecuaristas ficam sem receitas.

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